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Chegou o dia da mais singular eleição presidencial francesa

É este domingo que o eleitorado gaulês é chamado a votar na primeira volta das eleições presidenciais, numa corrida cujo resultado é imprevisível e em que pela primeira vez há quatro candidatos com possibilidades de passar ao segundo turno.

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Provavelmente França nunca viveu umas eleições presidenciais tão singulares. Numa campanha marcada por várias reviravoltas, a dois dias da primeira volta das eleições, os franceses estão mergulhados num clima de incerteza, não só quanto ao resultado final, mas também em relação ao futuro do país e da própria Europa.

Desde logo, François Hollande é o primeiro chefe de Estado em funções, desde a proclamação da V República, a não se recandidatar. A tal facto não é seguramente alheia a historicamente elevada impopularidade do ainda presidente gaulês. Também incomum é não haver nenhum candidato que reclame para si o legado do presidente cessante, o que é ainda mais curioso tendo em conta que dois ex-ministros de Hollande, que pouco têm em comum (Benoît Hamon e Emmanuel Macron), concorrem nestas presidenciais.

Nestas eleições, as sondagens mostram que há quatro candidatos com possibilidade de chegar à segunda volta, um fenómeno raro. Ainda mais raro quando se vê o candidato de um dos dois principais partidos, o socialista Hamon, com insólitas intenções de voto, abaixo dos 10%, e sem hipótese de chegar à Presidência.

Na linha da frente das sondagens para o acto eleitoral deste domingo surgem o liberal Emmanuel Macron e a xenófoba Marine Le Pen. Mas a uma distância que cabe na margem de erro da maioria das sondagens estão o ultra-conservador François Fillon e o socialista radical Jean-Luc Mélenchon, com intenções de voto entre 19% e 20%.

Decomposição do centro

Fazendo fé nos estudos de opinião, o cenário mais provável (mas não muito) é que no segundo turno, marcado para 7 de Maio, os eleitores sejam chamados a escolher entre a abertura pró-europeia de Macron e o fechamento soberanista de Le Pen. Ou seja, pela primeira vez, poderá não haver nenhum candidato vindo dos partidos tradicionais de centro na segunda volta.

Este cenário resulta do "período de decomposição dos partidos do ‘centrão’", refere ao Negócios Paul Taylor, colunista do site Politico, radicado em Paris. Ainda assim, este antigo correspondente da Reuters em França não declara já a irrelevância eleitoral de socialistas e conservadores, considerando que será o resultado das eleições a definir uma "eventual recomposição" do espectro político gaulês. Já a politóloga Marina Costa Lobo atribui relevância ao facto de esta ser uma "eleição em que é escolhida uma pessoa, pelo que muito centrada em torno da identidade dos candidatos", para justificar a menor relevância partidária.

No entanto, esta investigadora do Instituto de Ciências Sociais admite que existe uma "erosão dos partidos tradicionais decorrente da percepção de declínio que existe em França há várias décadas". Porque à "sensação de falhanço acresce uma sensação de insegurança que leva ao abandono dos partidos tradicionais da V República", conclui Costa Lobo.

Seja como for, Paul Taylor não acredita no fim da contraposição esquerda-direita como central na política francesa. Não só é ainda essa a principal distinção entre classes, como os soberanistas de esquerda (Mélenchon) e de direita (Le Pen) rapidamente se desentenderiam se tentassem governar, sustenta Paul Taylor.

O europeísmo sobrevive

Os temas marcantes da campanha eleitoral foram inevitavelmente o crescimento económico anémico, o desemprego estacionado nos 10%, a imigração e as questões securitárias num país que viu morrer mais de 200 pessoas em atentados terroristas desde 2015. Os inesperados casos judiciais – a constituição de Fillon como arguido num caso de criação de empregos fictícios para a mulher e filhos e, com menor dimensão, o alegado uso ilegal de financiamento de eurodeputados da Frente Nacional também marcaram a campanha.

Tal como em qualquer outro país europeu, a Europa foi um tema incontornável. O jornalista Paul Taylor acredita que a aceitação da pertença europeia "ainda é um pré-requisito para qualquer líder francês", o que o leva a excluir uma vitória de Le Pen e a antecipar como vencedor um "entusiasta europeu" como Macron ou mesmo um "relutante europeu" como Fillon. Mas com um terço de indecisos e com tão amplo leque de escolhas parece ser ainda cedo para previsões.


Citações dos cinco principais candidatos: 

O nacionalismo é guerra. Eu sei isso. Venho de uma região que está cheia de cemitérios.  Emmanuel Macron
Vamos conseguir viver muito mais tempo como franceses com bairros inteiros a serem tomados por estrangeiros? Uma sociedade multicultural é uma sociedade multi-conflituosa. Marine Le Pen
A Europa dos nossos sonhos morreu. Ou mudamos a UE ou desistimos dela (...) Os tratados europeus estão a destruir a Europa.  Jean-Luc Mélenchon
A imigração tem de ser regulada porque temos uma situação económica, social e de habitação que não nos permite receber todas as pessoas que querem vir para aqui. François fillon
Os instigadores, os porta-vozes e os teorizadores que fizeram tanto mal à esquerda (...) terão abrigo daqui para a frente com Emmanuel Macron. Benoît Hamon
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