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Governo quer alterações à lei para inverter "quebra" da contratação colectiva

Alterações às regras da caducidade, ao banco de horas e às portarias de extensão são "linhas de acção" que serão debatidas em concertação social, em Outubro. Discussão vai ter por base um novo "livro verde" das relações laborais, que o Governo está agora a preparar.

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O Governo quer avançar ainda este ano com a discussão das alterações à contratação colectiva, que passam, em parte, por alterações à lei: o banco de horas, as regras de caducidade das convenções colectivas e a política de emissão de portarias de extensão estão entre as "linhas de acção" identificadas pelo ministro do Trabalho, que quer levar a questão a concertação social em Outubro. 

"É indiscutível que estamos perante um quadro de quebra substancial da dinâmica da contratação colectiva. Não há nenhuma forma de fugir a este tipo de avaliação", afirmou Vieira da Silva, esta quarta-feira, durante a conferência de apresentação do primeiro relatório anual sobre contratação colectiva elaborado pelo Centro de Relações Laborais, uma entidade tripartida presidida por João Proença, antigo líder da UGT. 

Neste quadro, serão necessários "dois instrumentos": por um lado, "a dimensão normativa dos poderes públicos", ou seja, alterações à lei, e por outro, "a capacidade de criar condições favoráveis à parte dos actores" desses processos de negociação, afirmou o ministro.

cotacao Este quadro está em contraciclo com a realidade. Os instrumentos de negociação fragilizam-se quando eles seriam mais necessários.
Vieira da Silva Ministro do Trabalho


O ministério do Trabalho quer apresentar em Setembro uma primeira versão da actualização do chamado Livro Verde das Relações Laborais, que fará o diagnóstico sobre a situação do mercado de trabalho e que sirvirá de base à discussão destes temas em concertação social, em Outubro.

Ao longo da conferência o ministro não revelou em detalhe em que sentido irão as alterações legais. Mas as orientações foram reveladas de forma mais concreta num documento entregue em Fevereiro pelo ministério do Trabalho ao Parlamento, a propósito do Orçamento do Estado.

Entre as prioridades para 2016 previstas nesse documento está a "revisão do enquadramento de elementos sobre o banco de horas individual, as regras e prazos de sobre vigência e caducidade das convenções colectivas e os critérios e prazos para a emissão de portarias de extensão".

Estas "não são propostas", mas serão "linhas de acção", respondeu Vieira da Silva, à margem da conferência, quando questionado pelos jornalistas sobre se é isto que pretende fazer.

O Programa de Governo prevê a "dinamização" da contratação colectiva e a eliminação de possibilidade de instituir o banco de horas por negociação individual, deixando-a dependente dos processos de contratação colectiva.



Só um quarto vêem regras actualizadas 
e os salários só mexem passado três anos e meio

Nos últimos anos, a publicação de novas convenções ou de revisões das mesmas sofreu uma expressiva quebra, que a ligeira recuperação verificada em 2015 não anula. Os dados que têm vindo a ser divulgados periodicamente revelam que se as convenções publicadas só no ano de 2008 abrangiam 1,8 milhões de trabalhadores, em 2013 esse número caiu para cerca de 247 mil pessoas. Em 2015, foram 490 mil.

Apesar da paralisação nas novas negociações ("o fluxo") a contratação colectiva não diz propriamente respeito a uma pequena minoria de trabalhadores: em 2014 os acordos em vigor (o "stock") ainda abrangiam cerca de dois milhões de pessoas, a esmagadora maioria dos trabalhadores por contra de outrem, de acordo com os quadros de pessoal citados no relatório, tal como o Negócios noticiou esta quarta-feira.

"A cobertura não desceu drasticamente", mas "há uma percentagem relevante de convenções que não são renovadas", sintetizou esta quarta-feira Pedro Furtado Martins, um dos autores do relatório.

Foi sobretudo este último ponto que quis destacar o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, chamando a atenção para dois outros fenómenos: a forte redução da percentagem de convenções que são actualizadas e a demora na actualização de tabelas salariais, que chega agora aos três anos e meio.

"Antes da crise da negociação colectiva que se desencadeou em 2011 a relação entre trabalhadores cobertos por novos instrumentos, num ano, e do stock era da ordem dos 60%. Ou seja, cada ano dos trabalhadores do stock viam renovado instrumentos de regulamentação colectiva". Ora, no último ano, "esse valor caiu para cerca de um quarto". "É uma mudança que mostra a "desvalorização" da contratação colectiva, disse.

"A negociação colectiva passou de períodos em que se renovavam as cláusulas salariais, que eram pouco superiores a um ano, em média, para períodos que passaram para 43 meses", destacou o ministro. "43 meses!", sublinhou. Os dados mostram que nos últimos anos as actualizações têm estagnado, com valores que por vezes não compensam a inflação passada.

Caducaram 41 convenções. É muito ou pouco?
Entre 2005 e 2015, caduram 41 convenções colectivasO relatório elaborado pelo Centro de Relações Laborais explica que depois das alterações legislativas de 2003, que veio admitir a possibilidade de renúncia, e até 2005, houve sete processos de caducidade, já que a maioria dos processos foi indeferido, porque as convenções referiam que iriam vigorar até serem substituídas. Em 2009, ano em que entram em vigor as novas regras que permitiram a caducidade mesmo nestes casos, em determinadas condições, foram aprovados 15 processos, mas depois disso o número tornou-se mais baixo e irregular.

É muito ou pouco? Em resposta a esta pergunta Pedro Furtado Martins respondeu que em causa estão, em média, "quatro avisos de caducidade por ano". "Se são muitos, se são poucos, se eram os que eram esperados quando o instituto foi criado em 2003? Em termos de direito comparado não lhe sei dizer". O estudo refere que em mais de 650 convenções em vigor.

O ministro Vieira da Silva também quis comentar a questão. "Uma análise de tipo estatístico é uma análise pobre e absolutamente inoperante para estudar os efeitos da caducidade", defendeu, sublinhando que há efeitos indirectos nos processos de negociação colectiva.

"Se fizéssemos a leitura simples de ver como é que evoluiu o número de trabalhadores cobertos por instrumentos de regulamentação colectiva chegaríamos à conclusão que a caducidade parece não ter tido grande influência. Se olharmos para a natureza da negociação se calhar chegamos a conclusões diferentes", acrescentou Vieira da Silva.


Notícia actualizada com mais informação às 16:39

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