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Constitucional diz ao Governo que não pode tirar "ilações" do seu acórdão

O pedido de aclaração do Governo sobre as implicações práticas do chumbo dos cortes salariais foi "indeferido", pelo que nenhuma "outra ilação" pode ser retirada, refere o gabinete do presidente do Tribunal Constitucional.

18 de Junho de 2014 às 20:02
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Num curto comunicado enviado às redacções, o Tribunal Constitucional refere que o pedido de aclaração do Governo sobre as implicações práticas, designadamente as decorrentes do chumbo dos cortes salariais que estavam em vigor desde Janeiro, foi "indeferido", pelo que nenhuma "outra ilação" pode ser retirada do acórdão divulgado esta manhã pelo Palácio de Ratton.

 

"Em face de afirmações públicas quanto às implicações da decisão do Tribunal Constitucional sobre o pedido de aclaração do Acórdão n.º 413/2014 [que chumbou, em 30 de Maio, três normas do Orçamento do Estado, entre as quais os cortes salariais em vigor no sector público], o Tribunal lembra que tal pedido foi indeferido, pelo que desta decisão não pode ser retirada qualquer outra ilação", lê-se no comunicado enviado pelo gabinete do presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro.

 

O comunicado surge depois de o ministro-adjunto Miguel Poiares Maduro ter afirmado que, ao aceitar responder ao pedido de aclaração do Governo e ao reafirmar que o seu acórdão "produz todo e qualquer efeito a partir de 31 de Maio", o TC está a indicar ao Governo que tem de aceitar situações diferenciadas entre funcionários do sector público. Ou seja, quem já recebeu, por exemplo, o subsídio de férias com cortes, como foi o caso nalgumas empresas públicas, não tem direito a ser compensado face à grelha de cortes do tempo do Governo Sócrates que o Executivo quer agora repor, considera o ministro-adjunto Miguel Poiares Maduro.

 

"O TC admitiu o pedido de aclaração e reafirmou que todo e qualquer efeito só se produz a partir de 31 de Maio, mesmo que isso tenha um impacto diferenciado", afirmou o responsável governamental ao fim da manhã, numa primeira reacção à decisão desta quarta-feira dos juízes do Palácio Ratton. 

 

"O tribunal torna claro que [o acórdão] só se aplica realmente a partir de 31 de Maio e quanto àqueles que receberam já subsídios de férias com cortes, não há qualquer alteração a fazer".

Questionado sobre a possibilidade de o Governo repor uma situação de equidade por via legislativa, Poiares Maduro frisou que "é o tribunal que determina a data de produção de efeitos" das suas decisões e que a clarificação feita a esse propósito é "útil".

 

Também Luís Montenegro, líder da bancada parlamentar social-democrata, confirmou essa leitura, considerando que tratamentos "diferenciados" ou mesmo "desiguais" entre funcionários públicos serão "decorrências da decisão do Tribunal Constitucional".

 

Embora tenha aceite o pedido de aclaração do Governo, o TC não respondeu individualmente a cada uma das quatro dúvidas suscitadas por as considerar de "ordem prática" encaixáveis nas competências exclusivas do Executivo. Clarificou, contudo, que o seu acórdão de 30 de Maio, em que concluiu pela inconstitucionalidade de três medidas do Orçamento do Estado de 2014, entre as quais os cortes salariais no sector público, produz efeitos a partir de 31 de Maio.

  

"O Tribunal optou por limitar efeitos por referência à data da decisão de inconstitucionalidade

Não cabe ao Tribunal Constitucional esclarecer outros órgãos de soberania sobre os termos em que estes devem exercer as suas competências no plano administrativo ou legislativo
 
Tribunal Constitucional

e, portanto, à própria data da prolação do acórdão. Datando o acórdão de 30 de maio de 2014, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade produzem-se a partir do dia imediato, por aplicação de um princípio geral de direito - que se entendeu não ser necessário explicitar –segundo o qual no cômputo do termo não se conta o dia em que ocorre o evento a partir do qual ele deve iniciar-se".

 

"A decisão relativa à limitação de efeitos não oferece, por isso, quaisquer dúvidas, quer quanto ao conteúdo decisório da limitação (ex nunc), quer quanto à sua extensão temporal (a partir da data da decisão)".

 

As dúvidas suscitadas pelo Governo, alegam, são de "ordem prática" e "não cabe ao Tribunal Constitucional esclarecer outros órgãos de soberania sobre os termos em que estes devem exercer as suas competências no plano administrativo ou legislativo", pelo que se "desatende o pedido" de aclaração. "Os esclarecimentos que o requerente pretende obter não derivam, por isso, de qualquer obscuridade ou ambiguidade que o acórdão contenha quanto à limitação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, mas relacionam-se com aspectos de ordem prática que respeitam já ao cumprimento do julgado e extravasam o âmbito da actividade jurisdicional do Tribunal".

 

"O Tribunal Constitucional, enquanto órgão jurisdicional de fiscalização da constitucionalidade, não pode intervir no âmbito da competência administrativa do Governo. Assim como não pode criar inovatoriamente parâmetros normativos de regulação da vida colectiva que invadam a esfera do legislador ordinário e exorbitem a função de administração de justiça em matéria de natureza jurídico-constitucional. E esse princípio é aplicável tanto em relação a uma decisão de inconstitucionalidade como em relação a uma decisão de limitação de efeitos", argumentam ainda os juízes, segundo os quais não tem cabimento neste caso a invocação do princípio da cooperação institucional.

 

 

As dúvidas do Governo

Para "prevenir conflitos interpretativos", o Governo enviou quatro pedidos de esclarecimento ao Tribunal Constitucional:

 

1-      Se, em face à inconstitucionalidade dos cortes nos salários, teria de repor a parte do subsídio de Natal que já foi paga em regime de duodécimos;

2-      Se, relativamente ao subsídio de férias, a data relevante para decidir o seu montante é aquela na qual se constituiu o respectivo direito (1 de Janeiro de cada ano) ou aquela em que se processa o respectivo pagamento;

3-      Se, tendo em conta que há certos trabalhadores do sector público, por exemplo em empresas públicas, que já receberam o subsídio de férias, a restrição de efeitos não resultará em situações de desigualdade;

4-      Se, tendo em conta que o mês de Maio é um mês de 31 dias e que o Tribunal decidiu que a decisão deveria reportar os seus efeitos à data da sua prolação (30 de Maio), o Tribunal pretendia referir-se ao último dia do mês, de forma que os seus efeitos só verdadeiramente abrangerão o mês de Junho, ou se pretendia antes abranger nos efeitos da sua decisão também o dia remanescente do mês de Maio.

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