Taiwan é uma espinha encravada na garganta da China. A região do Indo-Pacífico vai ser o próximo foco de tensão?
As tensões sobre Taiwan estão a intensificar-se e, com elas, a perspetiva de um conflito direto entre os EUA e a China que poderia trazer consigo choques económicos globais e uma potencial escalada nuclear. Os entendimentos políticos que preservaram a paz durante décadas estão a fragilizar-se, sob a pressão da concorrência EUA-China, de uma China mais forte e assertiva e do reforço de uma identidade taiwanesa que se vê separada do continente. Uma invasão chinesa de Taiwan em breve é improvável, mas o risco de conflito está presente. A sua gestão exige o restabelecimento de níveis básicos de confiança e o reforço dos entendimentos políticos de longa data. Washington deve garantir a Pequim que não procura manter Taiwan permanentemente separado do continente, esclarecendo a sua fidelidade à política de "uma só China". Taipé deve garantir a Pequim que não procura a independência formal. Pequim deve garantir aos EUA e a Taiwan, que não decidiu fazer uma unificação com Taiwan através da força militar. A trajetória atual é perigosa, mas não é inevitável que as tensões levem à guerra. O abrandamento da escalada exigirá, no entanto, um esforço renovado de todos para reforçar o quadro de entendimentos que possibilita o equilíbrio. Em particular, os EUA e a China devem tomar uma série de medidas geradoras de confiança. Por sua vez, a China deve restringir algumas de suas atividades militares no estreito – abrandando o tom de ameaça latente. Quanto a Taiwan, a eleição presidencial em janeiro de 2024 representa uma janela de oportunidade para retomar o diálogo entre os dois lados do estreito. O caminho é mais claro no caso de uma vitória do partido no poder que já tem um entendimento em vigor com Pequim. No caso de uma vitória da oposição, será necessário para os dois lados identificar uma formulação política mutuamente aceitável, incluindo a ideia de que os assuntos do estreito devem ser conduzidos de acordo com a constituição da República da China, que contém uma noção de "uma só China". Recentemente, à margem da Cimeira da APEC (cimeira de cooperação Económica Ásia-Pacifico) em S. Francisco, Xi e Biden encontraram-se. Um ano após a Cimeira em Bali as relações entre os dois países não pararam de se deteriorar. O objetivo em São Francisco parece ter sido conseguido, restabelecendo a possibilidade de um contacto direto entre os dois e recuperando confiança. Na agenda, além das preocupações económicas, comerciais e, espera-se, do clima, estavam certamente a Ucrânia, o Médio Oriente e sem dúvida Taiwan. Este foi um encontro crucial para permitir uma normalização e um reaproximar diplomático entre os dois países.
Como vai evoluir este mundo multipolar?
A multipolaridade envolve uma dinâmica permanente em busca de novos equilíbrios que no fundo nunca são atingidos. Estamos em rota para uma nova ordem internacional, mas é cedo para a definir e francamente será difícil influenciar a sua formulação. Da globalização passamos a um mundo fragmentado, mas em que todas as interdependências se mantêm. Isto é, precisamos e dependemos uns dos outros. Nunca é demais repetir que os grandes desafios da segurança – a nossa e a das gerações futuras – dependem de soluções globais, têm de ser encarados em conjunto, buscando respostas equilibradas que promovam a igualdade, a justiça, a tolerância e a paz. Boas notícias vieram agora da COP28 no Dubai, que mostram ser possível fazer progressos importantes quanto às alterações climáticas. Mas vemos como o objetivo da Paz se distanciou com os múltiplos conflitos armados – e apenas menciono a Ucrânia e o Médio Oriente. Vemos como as desigualdades grassam, negando a tantos o mais básico de uma vida humana digna, com saúde e educação. Como os recursos estão desigualmente distribuídos e são desperdiçados. Como a energia, a água, os alimentos, não são vistos como um bem comum. Como a segurança falha pondo em risco vidas humanas inocentes. Como as migrações são tratadas como um perigo real, como a xenofobia, o nacionalismo e o racismo deformam perigosamente a nossa forma de viver. Como a igualdade, sem a qual não há liberdade, é um objetivo que nos ilude. A voz deve ser dada à juventude, à solidariedade entre gerações e às mulheres, para que o retrato do mundo possa ser melhor avaliado e as soluções sejam duradouras e sustentáveis, com uma perspetiva de futuro largo e esperança. A capacidade de tolerância e diálogo existe em cada ser humano – assistimos a isso recentemente na Jornada Mundial da Juventude em Portugal –, o diálogo entre religiões é também cada vez mais importante num mundo em que as tecnologias e a ciência podem ser postas ao serviço daquilo que nos divide e destrói. Este é um retrato real, incompleto e certamente desorganizado, que temos de contrariar porque a responsabilidade de um futuro melhor encontra-se nas nossas mãos.