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Obama veio ao Porto pedir às empresas para mostrarem custos das alterações climáticas

O ex-presidente dos EUA aproveitou a vinda a Portugal para atacar as políticas ambientais e de imigração de Trump, reclamando que o país vai voltar a "alinhar-se com a ciência" e que "não há muros suficientes para impedir pessoas desesperadas" de passar a fronteira.

Obama veio a Portugal dar a cara pelo "The Porto Protocol", uma iniciativa do grupo que detém a marca de vinho do Porto Taylor's e que é liderado por Adrian Bridge. DR
06 de Julho de 2018 às 17:38
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Barack Obama reconhece a dificuldade da tarefa, mas acredita que "ainda é possível juntar os países numa agenda comum" em torno das alterações climáticas. A começar pelos EUA, que há um ano resolveram abandonar o Acordo de Paris por decisão de Donald Trump, a quem o ex-líder americano não poupou referências críticas nesta passagem pelo Porto.

 

À "má notícia de que o sucessor não concorda" com estas posições, Obama contrapôs duas positivas para equilibrar esta balança na política ambiental. A primeira é que "apenas os EUA saíram" do Acordo firmado em 2015, acreditando que esta administração americana vai acabar por "alinhar outra vez com a ciência no futuro". "Mantendo-se a arquitectura de apoio dos outros países, estou certo que os EUA vão envolver-se novamente", completou.

 

Outra boa notícia que assinalou nos 56 minutos em que pisou o palco do Coliseu - que esta sexta-feira, 6 de Julho, recebeu a Climate Change Leadership Porto Summit 2018 - é "tantas empresas começarem a aperceber-se que [a protecção do ambiente] é boa para os seus resultados e para criação de empregos, notando que "este interesse comercial" é relevante para prosseguir o combate às alterações climáticas.

 

Com rigorosas medidas de segurança na Invicta e perante mais de dois mil convidados, sobretudo altos quadros empresariais, o primeiro político de ascendência africana a ocupar a Casa Branca, entre 2009 e 2017, lembrou que este tema "afecta os negócios agora ou no futuro, afecta as economias em todo o mundo". Reclamou que os impactos têm de começar a ser medidos de forma mais eficaz e estes custos "monetizados", pedindo aos empresários para se juntarem nesta luta e começarem a "exercer influência política para que os governos ataquem este problema".

 

"É importante para as empresas publicitarem os impactos das alterações climáticas. Para o público em geral é difícil explicar, em termos abstractos, que não é bom para o planeta estar mais quente num dia como hoje. É preciso colocar números nas perdas e nos custos de adaptação, por exemplo. Esses dados existem, mas não são conhecidos. É preciso dizer que isto vai afectar a competitividade económica e trazer perdas de milhões e milhões", resumiu. 

 

É preciso colocar números nas perdas e nos custos de adaptação. É preciso dizer que isto vai afectar a competitividade económica e trazer perdas de milhões e milhões. Barack Obama, ex-presidente dos EUA

 

Já questionado por Juan Verde – foi assessor durante a sua Presidência e é actualmente o presidente da Advanced Leadership Foundation – sobre a ligação entre as alterações climáticas e as migrações, Barack Obama falou numa ligação que está "bem documentada", seja na Síria, na África Subsariana ou nos países da América Central que estão a pressionar os EUA do ponto de vista da imigração. Notando que todas estas questões ambientais "podem aumentar os conflitos".

 

"O interesse do meu país está em encontrar maneiras de ajudar os países de onde as pessoas estão a emigrar, para melhorar a vários níveis as condições nesses países. Não há paredes suficientes para impedir pessoas desesperadas [de passar a fronteira]. Mais cedo ou mais tarde elas vão tentar a sua hipótese", concretizou Obama, em referência ao polémico muro que Donald Trump prometeu construir na fronteira com o México.

Poder… "de baixo para cima"

 

Impulsionador das energias verdes durante o seu mandato e activista reforçado das alterações climáticas desde que abandonou o poder, sobretudo em conferências deste género em que cobra meio milhão de euros para falar, Obama disse nesta cimeira organizada pelo grupo vitícola e turístico The Fladgate Partnetship que "já temos a maior parte das respostas, o problema é que, para implementar estas soluções, temos de enfrentar instituições que são humanas".

 

"O que significa que temos de encontrar maneiras de educar a opinião pública sobre quais são as melhores respostas e por que é bom para as suas vidas que elas sejam adoptadas. Para também elas pressionarem os poderes públicos", sublinhou, insistindo que, mais do que naquilo que vêem na televisão ou lêem na Internet, "as pessoas confiam na família e nos amigos" e "ficam mais conscientes sobre as alterações climáticas se o tema for discutido a um nível comunitário".

  

Mais de 3 mil pessoas foram ao Coliseu ouvir o antigo presidente dos Estados Unidos
Mais de 3 mil pessoas foram ao Coliseu ouvir o antigo presidente dos Estados Unidos

É uma espécie de retorno ao movimento popular de empoderamento das bases e dos grupos locais ("grassroots"), que esteve na génese da sua primeira e histórica eleição em 2008, advogando que "os problemas têm de ser resolvidos também de baixo para cima". Porque dessa forma, continuou, "as pessoas concordam que uma mudança é necessária".

 

"Por isso não nos podemos concentrar apenas nos especialistas. A resposta não é rejeitar soluções técnicas ou científicas. Não. Mas tem de passar por essa confiança construída de baixo para cima para que mais pessoas queiram fazer o que está correcto", sintetizou o ex-presidente americano, colocando a bitola nas "pessoas da idade das [suas] filhas, que são mais conscientes ambientalmente, mais tolerantes às diferenças e que têm um forte instinto de trabalhar em conjunto".

 

O problema, concluiu, é que não são os jovens que estão no poder, por isso é necessário envolvê-los. "Fui eleito por causa de uns jovens na casa dos 20 anos que trabalharam para mim. Não foi um grande segredo: confiámos neles e demos-lhe poder. Eles ficaram entusiasmados, dissemos-lhe que podem mudar o mundo".

A conspiração científica, a Fox News e o negócio dos media

Barack Obama fez questão de distinguir entre os que não se entusiasmam pelo tema das alterações climáticas usando argumentos relacionados com a pobreza – "posso não concordar com essa opinião, mas ela assenta numa realidade observável" –, daqueles que apenas "acham que os cientistas estão todos errados e que isto é tudo uma conspiração da comunidade científica". "Aí não há espaço para compromisso ou para o debate", lamentou o conferencista, numa nova aparente alusão às reservas já evidenciadas por Trump. Outro dos problemas elencados por Obama – e "parte da razão por que há tanta polarização nos EUA" – é a "realidade muito diferente" relatada por diferentes órgãos de Comunicação Social, dando o exemplo antagónico da Fox News e do The New York Times. "Solução para isto? Não tenho uma boa resposta. A propaganda democratizou-se e é um grande desafio. Uma solução terá de ser os media tradicionais serem mais criativos e perceberem o papel que têm, além de serem só negócios. São protectores da nossa democracia e têm de encontrar formas de financiar esse jornalismo que ajuda a proteger a verdade", rematou.

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