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A relação custo benefício das energias renováveis não reúne consensos

É sempre difícil conseguir uma posição consensual, e a área da energia não é excepção. Apesar do sinal positivo dado na globalidade ao plano do Governo de José Sócrates para a área da Energia, ambientalistas e especialistas na área de eficiência energética reconhecem que há falhas e lacunas, questionando também a prazo o custo que a aposta nas energias renováveis vai ter e se reflectirá na factura a pagar por todos os utilizadores.

26 de Abril de 2010 às 12:33
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É sempre difícil conseguir uma posição consensual, e a área da energia não é excepção. Apesar do sinal positivo dado na globalidade ao plano do Governo de José Sócrates para a área da Energia, ambientalistas e especialistas na área de eficiência energética reconhecem que há falhas e lacunas, questionando também a prazo o custo que a aposta nas energias renováveis vai ter e se reflectirá na factura a pagar por todos os utilizadores.

O aval mais claro para a estratégia definida até 2020 vem da Associação de Energias Renováveis (AREN), que já mostrou a sua disposição para ajudar na concretização dos objectivos definidos pelo governo. António Sá da Costa, presidente da associação, defende que "as medidas que estão definidas no que respeita às energias renováveis vão a médio e a longo prazo não só garantir uma maior independência de Portugal, mas também ajudar a economia portuguesa a ficar de fora das flutuações, cada vez mais frequentes, dos preços dos combustíveis fósseis, garantindo ao mesmo tempo custos inferiores".

A associação que representa o sector tem vindo a defender a racionalidade económica do investimento e o impacto positivo que pode ter na economia e na sociedade.

A aposta nas energias renováveis é também considerada bem-vinda por Francisco Ferreira, vice-presidente da Quercus, que alinha a posição da associação em relação ao Estratégia Nacional de Energia (ENE2020), mas frisa que é dada maior prioridade às renováveis do que à eficiência energética, uma falha importante. Para a associação as prioridades do Governo não estão correctamente ordenadas nesta área, sendo que em primeiro lugar deveria estar a redução de consumo e a eficiência energética, seguida das energias renováveis e, por fim, a mobilidade sustentável.

A Quercus defende que é prioritário um investimento forte na redução do consumo de energia e na eficiência energética, que não deve ser deixada para segundo plano, como acredita que aconteceu até aqui. "Mantendo a tendência actual de crescimento do consumo energético, não vai ser possível cumprir o objectivo de redução anual do mesmo em 1% até 2016", lembra. Outra das lacunas apontadas no programa é a referência a veículos eléctricos em vez da mobilidade sustentável.

João Santana, professor catedrático do Instituto Superior Técnico e ex-administrador na ERSE, a Entidade Reguladora do Sector Energético, aponta alguns problemas à explosão da energia eólica e solar, com as fotovoltaicas, sobretudo devido aos preços elevados que se pagam por Megawatt (MW) produzido. Pelos dados revelados, o custo da energia eléctrica na pool ibérica é de 30 euros por MW, enquanto às eólicas o Governo paga 90 euros, e às fotovoltaicas entre 300 e 500 euros. "Estes preços pagos pelas renováveis criam um sobrecusto que é pago por todos os utilizadores", explica João Santana. No caso da produção eólica os novos produtores vão ter preços mais baixos, a rondar os 70 euros, em resultado do concurso efectuado pelo actual governo.

Ainda assim, este especialista na área da energia reconhece que têm sido feitas conquistas para reduzir a dependência energética do país, e que o caminho tem de passar obrigatoriamente pelas fontes renováveis, embora aconselhe a revisão dos valores a pagar, com uma redução gradual ao longo do tempo.

Miguel Gil Mata, vogal da Comissão Executiva da Cogen Portugal, lembra que, de um ponto de vista do consumo, a realidade da indústria é manifestamente diferente das realidades ao nível dos serviços ou do consumo particular residencial. "Tipicamente, o consumidor industrial é mais disciplinado e sofisticado nas suas análises e atitudes, sem que isso decorra necessariamente de consumos energéticos muito avultados". Por isso mesmo, poderá aqui haver menos potencial de redução, ao contrário dos sectores de serviços e residencial. Esta avaliação está de acordo com os dados do Eurostat para Portugal, que apontam o sector de serviços como o menos eficiente em termos do consumo de energia.

Potenciais a explorar

O investimento em redes inteligentes e em sistemas que propiciam a produção de energia para o sistema eléctrico nacional, como a cogeração na indústria e a microgeração do lado dos privados - sejam particulares ou empresas - são áreas que podem ajudar a aumentar a eficiência energética. Sobretudo no incentivo à instalação de colectores solares para aquecimento de águas sanitárias nas casas, uma boa medida para a eficiência já que este representa entre 20 a 30% da factura energética, em electricidade ou gás das famílias.

A introdução de incentivos deve porém ser feita de forma cautelosa e a maior transparência, dado que em alguns casos os investimentos são relativamente elevados para as famílias e tem de ser garantida alguma previsibilidade do retorno num horizonte temporal bem definido.

Do lado das fontes mais tradicionais de energias renováveis há ainda também potencial a desenvolver. A energia do vento, explorada pelas eólicas, é consensualmente a mais interessante em termos de produção de electricidade com fontes renováveis, até porque é a que em termos económicos apresenta preços mais competitivos. Mas Miguel Gil Mata lembra que há que considerar as desvantagens que decorrem do seu carácter intermitente, que pode encontrar limitações na estabilidade do sistema eléctrico. A estas Francisco Ferreira junta ainda os conflitos com a preservação ambiental de algumas áreas sensíveis, que começa a ser um obstáculo à instalação dos geradores.

O sol e o potencial de aquecimento de águas e geração de energia eléctrica com a tecnologia fotovoltaica, tem potencial reconhecido, mas exige um investimento financeiro elevado e uma grande ocupação para gerar fluxos energéticos significativos, estando igualmente dependente das condições climatéricas e não garantindo a estabilidade de produção desejada. A produção de energia a partir das ondas e o potencial do mar não têm ainda tecnologia massificada que justifique o investimento elevado, mas decorrem testes-piloto, que abrem boas perspectivas, embora a prazo.

Afastada, na opinião dos especialistas contactados pelo Negócios, está a opção pelo nuclear, uma energia não renovável baseada num recurso também ele escasso - como o petróleo e o carvão - e que obriga a um "investimento insuportável". António Sá da Costa explica que "Mesmo que se decida construir uma central nuclear em Portugal, na melhor das hipóteses só depois de 2022 é ela que gerará electricidade. Ora até lá não podemos ficar parados, pelo que as renováveis são a única hipótese de satisfazermos os compromissos que assumimos".

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