Opinião
O guarda-chuva de Paris
Umas bengaladas no Facebook resolvem-se com um desprendimento de autoridade. António Costa sabe que a ética republicana (ou um primeiro sinal de quebra dessa regra) demitiria o ministro. João Soares foi-se em 24 horas. Agora fia mais fino. É o poder do primeiro-ministro que está, pela primeira vez, em causa.
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E está para além de um governo de um homem só. É pior e mais complicado. O Governo é Costa e Marcelo, Marcelo e Costa. Sendo que esta articulação aparentemente virtuosa em função da experiência vivida – o país descomprimiu, saiu do cutelo dos mercados, cresce mais do que previsto, o emprego alumia – não encontrou espessura para vencer o imprevisto.
E, assim, no afecto das selfies e no guarda-chuva de Paris (teremos sempre Paris) o diabo morreu de morto para vir de forma vil e cobarde. Um fogo que matou como nunca, um roubo sem perfil do ladrão. Quer dizer que Marcelo e Costa foram enganados por uma ilusão que construíram? Não, de todo. Um e outro fizeram o que deveriam fazer para redimir o país de um sentimento de perda.
Até o país perder. Perder a confiança naquilo que, quando se perde, conta mais do que o dinheiro no bolso: a segurança. De repente, o Governo da magia, da geringonça que fazia voar as vacas, do Ronaldo perfilhado pelo austero alemão, foi-se num suspiro, ou melhor, num grito. E, ao contrário das bengaladas inofensivas, o primeiro-ministro escorregou num caminho justificativo. Os portugueses começaram a entranhar a estranheza: afinal, a geringonça não funciona. Ou melhor, só funciona quando as vacas voam. Ou seja, nunca assim foi.
O que vai acontecer é fácil de prever. Com a margem de erro que oferece algum perímetro de segurança, Marcelo procurará equilibrar a sua posição. Nos seus abraços cúmplices ao povo e ao Governo, o Presidente não hesitará um segundo na escolha: não porá em causa a sua relação de afecto com os portugueses, a verdadeira base programática e emocional da sua Presidência. Com mais ou menos assertividade, não poderá continuar ao lado de Costa no grupo dos que têm de dar respostas ao povo; estará do lado do povo que exige respostas do Governo.
Isto não mata mas mói. Muito. As notícias sobre a morte política de António Costa são manifestamente exageradas, por mais análises estapafúrdias que os jornais espanhóis possam fazer. Mas o jogo mudou. Cabe a Costa ter a inteligência táctica para o perceber.
E, assim, no afecto das selfies e no guarda-chuva de Paris (teremos sempre Paris) o diabo morreu de morto para vir de forma vil e cobarde. Um fogo que matou como nunca, um roubo sem perfil do ladrão. Quer dizer que Marcelo e Costa foram enganados por uma ilusão que construíram? Não, de todo. Um e outro fizeram o que deveriam fazer para redimir o país de um sentimento de perda.
O que vai acontecer é fácil de prever. Com a margem de erro que oferece algum perímetro de segurança, Marcelo procurará equilibrar a sua posição. Nos seus abraços cúmplices ao povo e ao Governo, o Presidente não hesitará um segundo na escolha: não porá em causa a sua relação de afecto com os portugueses, a verdadeira base programática e emocional da sua Presidência. Com mais ou menos assertividade, não poderá continuar ao lado de Costa no grupo dos que têm de dar respostas ao povo; estará do lado do povo que exige respostas do Governo.
Isto não mata mas mói. Muito. As notícias sobre a morte política de António Costa são manifestamente exageradas, por mais análises estapafúrdias que os jornais espanhóis possam fazer. Mas o jogo mudou. Cabe a Costa ter a inteligência táctica para o perceber.
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