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Raul Vaz raulvaz@negocios.pt 12 de Julho de 2017 às 00:01

O assomo de Costa

E o que mais irá acontecer? Depois de Pedrógão, Tancos, demissões, só pode ser o diabo. Não é, ainda não há notícias da sua chegada. E assim germina a perplexidade na direita que se sente injustiçada (o que seria isto com Santana Lopes?) e numa extrema-esquerda que lambe a ferida da vingança (começa a ser vexatório o custo do ódio à direita).

António Costa está aflito, mas está para roer. E hoje, já hoje no debate do estado da nação se vai ver do que é feita a pele do politicão. Não é qualquer um que aceita a demissão de dois dos seus mais fiéis cúmplices – perdendo qualidade, lealdade, tranquilidade. Não havia saída? Talvez, mas esse também é um traço distintivo.

Quando Pedro Passos Coelho renegou a demissão irrevogável de Paulo Portas – e o tempo é sempre o termo certo de uma comparação real –, o ciclo mudou. O chefe afirmou-se, o projecto ganhou consistência (Maria Luís Albuquerque cresceu) e desenhou o futuro. Também por isso ganharam eleições.

Bem comparado, António Costa está nesse momento de afirmação, paradoxalmente marcado pela saída consumada de tropas fiéis. Com uma vantagem: os resultados económicos surpreendem os mais cépticos, a oposição mergulhou na divergência interna, a extrema-esquerda que alimenta o Governo está domesticada. O paradoxo, por definição, veio no imprevisto que, também por excesso de confiança, pode ser irrevogável.

Pedrógão aconteceria sempre. A reacção deveria ser claramente diferente, para melhor. Hoje, lembram-se os mortos e contam-se os dias da ministra, numa ironia que choca e atinge a credibilidade do chefe do Governo. Tancos nunca deveria ter acontecido, mas como foi não se sabe. E porque não há reacção capaz ao desconhecido, construiu-se um fosso na hierarquia das forças armadas que exige um novo responsável político. O processo é delicado e está a ser devidamente acautelado. As viagens ao futebol eram apenas dispensáveis.

António Costa enfrenta hoje o estado de uma nação em ferida. Por tudo o que aconteceu nas últimas semanas e pela reminiscência dos últimos anos. Num sopro social que entranha um sentimento de insegurança e que se estranha quando tudo parecia ter regressado a um registo de crescente normalidade. Não chega aceitar o erro e mostrar humildade para vencer este desafio. É preciso desafiar os adversários com a pergunta que todos percebem: qual é a alternativa aos resultados económicos e sociais?

Foi assim que Passos Coelho e Paulo Portas conseguiram ganhar, quando o PS estava ainda marcado pela chaga do pedido de resgate. Costa tem uma vantagem: está em condições de desafiar todos os adversários, a direita assumida e a esquerda envergonhada. E ainda tem outro atributo: sobra manha para não entregar o ouro ao bandido.

António Costa, o artista do impossível, tropeçou na capa quando a ilusão que vendia se foi tornando verdade. Tem de erguer-se rapidamente, recentrar a discussão e manter o diabo à distância.

Será capaz? 

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