Opinião
A verdade sobre Angola
Há uma Angola que cresce desalmadamente, o país que hoje mais cresce no mundo. A Angola que estabilizou o câmbio, que controlou a inflação e que recuperou o Orçamento que antes financiava a guerra.
É a Angola civilizada, que está a receber portugueses, políticos e empresários, de braços abertos. Há uma Angola que reluz, um país que nos chama e nos convoca para novas oportunidades.
Se Angola enriquece, porque não haveremos nós de enriquecer com os angolanos? Se até o nosso primeiro-ministro lá se sente em casa, que razão impede empresas e empresários de chegar, ver e vencer?!
Tudo parece fácil, tudo parece demasiado fácil nesta caravana de alegria. Como se Angola fosse perfeita, como se a mesma Angola que sempre conhecemos tivesse subitamente desaparecido.
Não desapareceu. Não desapareceu, infelizmente, a Angola que enriquece a elite e exclui um exército de pobres e miseráveis do progresso e da riqueza.
Não desapareceu a Angola da negociata e do esquema, embora Sócrates, empresários e banqueiros se deslumbrem com os negócios. Ou a promessa deles. Tal como existe ainda a Angola que compra e não paga, promete e não cumpre.
Angola é uma inevitabilidade estratégica para Portugal. Tal como o Brasil. Mas não deixou, subitamente, de ser aquilo que sempre foi. E de que todos deixaram convenientemente de falar.
Ainda há pouco, e à boca fechada, empresários nacionais confessavam que era impossível internacionalizar para Angola sem corrupção. Deixou de ser assim? Terá Luanda promovido uma «operação mãos limpas» que ninguém viu?
Alguém foi preso? Ou a suposta moralização da administração angolana não passa de uma farsa que preserva os corruptos mais sofisticados e persegue o pequeno funcionário público, o burocrata imprudente que pratica a extorsão à luz do dia?
O que nos faz, então, viajar a Angola e sentirmo-nos em casa? A camaradagem, a afinidade, a cumplicidade que leva portugueses a celebrar, como celebrámos, o apuramento da selecção angolana no Mundial de futebol.
Sócrates e a sua grande comitiva foram, afinal, encontrar algo de novo em Angola? Sim: a paz, a pujança da economia... e chineses. Que ocuparam o lugar. Ganharam a administração pública, as obras públicas, financiam 60% da dívida externa e consomem um quarto do petróleo angolano.
Esta invasão chinesa remete-nos para o papel que realmente está reservado aos portugueses. É algum, obviamente. E em alguns sectores, como é lógico. Aqueles que China, EUA e até Brasil e Espanha decidirem que não querem.
Vamos continuar a gostar de Mantorras como um chinês jamais irá gostar. E nenhum outro primeiro-ministro se sentirá tão à vontade como o nosso. Mas a verdade sobre Angola, aquela que realmente vale e nos diz respeito, não é aquela que obviamente esta cimeira vai revelar.
No dia em que a nossa comitiva se despedir, aos abraços aos dirigentes locais, vão os angolanos ficar na pista do aeroporto a receber os visitantes seguintes. «Eram os nossos irmãos portugueses, vamos tratar agora nós dos negócios a sério».