Opinião
Uma Escola de Gestão em Portugal
A menos que mudem as regras, que deviam ter começado por um novo ECDU antes de pensar em Bolonha, todos os projectos de universidades empresa ou universidades empreendedoras (que tanto aprecio) são mera poesia quando confrontados com o individualismo que,
Uma Escola é, numa Universidade, uma ilha composta por ilhas. Ou melhor, um arquipélago. Sempre com pouca integração entre ilhas e sempre muito pouco integrável com outros arquipélagos e/ou Escolas/Faculdades. E pensar, neste processo, que Gestão leva vantagem, devido à natureza das coisas e à obrigação teórica que emerge do entendimento e estudo destes fenómenos, é pura ilusão. Não se engane, pois, o leitor quando tenta percepcionar grandes equipas, grandes unicidades, grandes empatias para um jogo comum ao nível académico. Nada disso. O que faz o arquipélago são agendas individuais e os vários arquipélagos serão tanto melhores quanto melhores forem as ilhas. Dito de outra forma: quanto melhores forem as individualidades da Escola, da Universidade ou da Faculdade melhor ela será.
Pense-se num Real Madrid cheio de estrelas mas sem que seja, necessariamente, uma equipa de futebol. Pois o Real pode não jogar à bola, ganhar campeonatos ou conquistar troféus. O que faz é vender, como bonecos, os seus jogadores ou estrelas individualmente e assim criar um outro projecto comercial que, feliz ou infelizmente, não passa pelo futebol. Mas anda nas bocas do mundo como sendo o grande Real Madrid.
Numa Escola ou numa Universidade em Portugal é mais ou menos a mesma coisa - há honrosas e raras excepções. As melhores Escolas, para o mercado, são as que têm as melhores pessoas sem que isso possa ser, necessariamente, verdade. Não há grande jogo de equipa. Ou melhor, haverá o jogo de equipa que o oportunismo e a agenda de cada qual deixar que haja. Portanto, pensar muito em equipas e pensar muito em grandes projectos universitários - e investigação à séria - no contexto da universidade portuguesa é mais ou menos ridículo. Ridículo porque tudo assenta em bases individuais. E é esse, em meu entender, um dos principais problemas que subjaz ao atraso, cada vez mais aprofundado, das universidades portuguesas.
Na base disto mesmo está, então, a forma como se pensa e remunera a carreira académica, onde o mercado é ainda um termo relativamente proibido. Tudo, numa universidade portuguesa, aponta para o individualismo, a agenda de cada qual e a necessidade que tem - imposta por lei - de jogar sozinho. Toda a carreira de um professor é sempre mais valorizada pelas tarefas individuais: teses orientadas individualmente, papers publicados individualmente, comunicações individuais, livros individuais, leccionação individual, até a gestão e as funções desempenhadas em cargos individuais valem mais.
Ora se a carreira académica individualiza as pessoas mais ainda individualiza áreas e arquipélagos que nada têm a ver uns com outros. Se numa empresa há sempre a normal fricção entre legitimidades e paradigmas diferenciados, que contribuem para a criação de silos de poder e áreas funcionais diversas e tantas vezes não integráveis, nas Universidades, as Escolas, as Faculdades e mesmo os Departamentos têm, a somar às legitimidades próprias das áreas, as legitimidades próprias de cada qual. De cada um dos indivíduos que lá está. Um departamento, ele próprio, não tem senão fronteiras - tantas fronteiras e tantas lógicas diferenciadas quantas os indivíduos que dele fazem parte. Tem-se, assim, um fenómeno de balcanização em todas as frentes, em todas as linhas e a todos os níveis, assegurado por todos e cada um dos indivíduos que fazem parte destas instituições.
Por isso mesmo, projectos de Escola, de Universidade ou de Faculdade em Portugal, tal como entendidos pelo que o mercado pensa ser cada uma destas entidades, só podem, com o regime legal em vigor (Estatuto da Carreira Docente Universitária - ECDU) e a forma de pagamento aos docentes ser puras ilusões. As pessoas unem-se porque os interesses próprios, das suas agendas próprias, assim o determinam. Mas raramente saberão interpretar e muito menos levar à prática o significado de equipa, de dádiva, de construção de qualquer coisas para um bem comum.
Com isto quero apenas dizer que há apenas um único projecto válido para uma Universidade, para um Escola, para uma Faculdade em Portugal e que é tão simples quanto ter, ir buscar, recrutar os melhores intérpretes individuais. Se se conseguirem as pessoas mais emblemáticas em cada área consegue-se carisma, presença, angariação de projectos, estudantes, publicações, credibilidade, reputação, entre tantas outras coisas. Não de âmbito internacional mas, pelo menos, que dê para aguentar a mediania nacional. E, a menos que mudem as regras, que deviam ter começado por um novo ECDU antes de pensar em Bolonha, todos os projectos de universidades empresa ou universidades empreendedoras (que tanto aprecio) são mera poesia quando confrontados com o individualismo que, queira-se ou não, até é imposto e apadrinhado por lei.