Opinião
Externalidades globais na exportação de ensino superior
Os principais acontecimentos, como as eleições nos EUA, conflitos no Médio Oriente e na Ucrânia, bem como a desaceleração económica chinesa, representam desafios e incertezas, tanto para a captação de novos estudantes como para a sustentabilidade de programas académicos, de formação de executivos e para as parcerias internacionais.
A conjuntura global atual tem um impacto significativo no ensino superior, especialmente para instituições europeias que procuram atrair alunos externos e expandir as suas operações internacionais. Os principais acontecimentos, como as eleições nos EUA, conflitos no Médio Oriente e na Ucrânia, bem como a desaceleração económica chinesa, representam desafios e incertezas, tanto para a captação de novos estudantes como para a sustentabilidade de programas académicos, de formação de executivos e para as parcerias internacionais. Vamos por partes:
1) Impacto das eleições americanas no ensino superior
As eleições nos Estados Unidos têm implicações globais, especialmente para o ensino superior, devido à relevância das universidades americanas. Alterações nas políticas de imigração e vistos de estudantes são comuns após mudança de Governo nos EUA. Nos últimos anos, as restrições impostas dificultaram o acesso de alunos internacionais ao país, levando muitos a considerar alternativas, entre elas, instituições europeias. As eleições de 2024 prometem continuar essa tendência, dado que ambos os partidos, democrata ou republicano, demonstraram cautela com o fluxo migratório. Se a política de vistos se tornar mais rígida, é provável que o Reino Unido, a França, a Alemanha e os Países Baixos, e porque não Portugal, atraiam mais estudantes que tradicionalmente teriam optado pelos Estados Unidos. Esse cenário beneficia instituições europeias, mas pode também aumentar a concorrência intraeuropa e intrapaíses, pressionando as instituições a inovar em programas e ofertas de valor realmente acrescentado. Bom para o lado do mercado, que nos obrigará a inovar para crescer.
2) A Guerra no Médio Oriente e seu impacto no ensino superior
O recente agravamento dos conflitos no Médio Oriente, especialmente no que toca à questão israelo-palestiniana, traz muitíssima instabilidade que afeta o fluxo de estudantes provenientes de toda uma grande região. Muitos estudantes do Médio Oriente, particularmente do Golfo Pérsico, historicamente procuram educação no exterior, buscando estabilidade, qualidade e prestígio – e a formação de executivos é aqui uma das principais que estão a ser afetadas. Assim, a incerteza crescente no Médio Oriente pode desencorajar novas inscrições, pois as famílias dos estudantes enfrentam dificuldades financeiras e logísticas para sustentar a educação no exterior. Vistos, concessão de vistos e receios sobre o que “virão fazer” alimentam as cabeças dos decisores.
As opções online, diminuindo custos e necessidades de deslocação, poderão ser uma parte da resposta. Além disso, a criação de programas de intercâmbio e parcerias com universidades da região pode fortalecer laços e apoiar estudantes que procuram uma formação europeia, mas que estão impedidos de viajar. Este aspeto revela uma oportunidade única para a nossa diplomacia (educacional) para alimentar o cluster as escolas de gestão em Portugal (e não só).
3) A Guerra Rússia-Ucrânia no ensino superior
O conflito entre a Rússia e a Ucrânia teve implicações imediatas para estudantes de ambas as nações. Na Europa, várias universidades suspenderam parcerias com instituições russas e passaram a receber refugiados ucranianos, em alguns casos oferecendo bolsas e programas específicos para apoiar estudantes deslocados. Este apoio humanitário não só fortalece os laços com a Ucrânia, como também melhora a reputação das universidades europeias, sendo encaradas como instituições acolhedoras e comprometidas com os direitos humanos. Por outro lado, estudantes russos enfrentam maior dificuldade para ingressar em programas europeus devido às sanções e ao isolamento económico do país, diminuindo o fluxo de inscrições dessa região.
Embora a guerra tenha limitado o mercado russo, as universidades europeias ganham credibilidade ao apoiar estudantes ucranianos, um aspeto que pode ser visto como positivo a longo prazo. Como não há bela sem senão, monetizam menos a sua oferta.
4) A economia chinesa em crise e o impacto no ensino superior
A desaceleração económica chinesa e o elevado desemprego juvenil à saída da universidade – e os mais experientes que não querem largar os seus trabalhos arriscando um ano de estudos no exterior – afetam profundamente a procura de programas externos. As famílias chinesas, sempre muito motivadas a investir na educação internacional dos seus filhos, enfrentam agora uma nova realidade económica, onde o custo e as externalidades de estudar fora se tornam barreiras consideráveis. Esta mudança conduz a uma diminuição significativa na procura por programas de ensino superior europeu entre os estudantes chineses, tradicionalmente uma das principais fontes de financiamento e diversificação das universidades europeias.
Apesar dos desafios, o atual cenário geopolítico e económico abre oportunidades para as instituições de ensino superior europeias. Porém, abre-as de forma assimétrica. Não me queixo disso mesmo. Porquê de forma assimétrica? Porque o aproveitamento das oportunidades cai, tendencialmente, para o lado das universidades com mais recursos. Bom para elas. E, seguramente, mérito das mesmas.
A segurança e a estabilidade da velha Europa pode, aqui, fazer diferenças. O “cluster” português idem, na medida em que tem conseguido posicionar 5 escolas em “rankings” internacionais de forma consecutiva, ganhando enorme “awareness”.
A digitalização e a flexibilidade no ensino, aceleradas pela pandemia, permitem que as instituições europeias alcancem, também, estudantes em regiões afetadas por conflitos e crises económicas, oferecendo soluções de ensino híbrido ou completamente online.
Por fim, esta conjuntura pode incentivar a diversificação dos alunos internacionais, reduzindo a dependência de países como a China e a Rússia, enquanto promove a atração de estudantes de outras regiões em crescimento, como África e América Latina. Este reequilíbrio de mercados de ensino superior pode ser vantajoso para a resiliência e sustentabilidade das instituições europeias a médio/longo prazo. E para Portugal também.
Para já, para já, os americanos estão a votar. E daí sairão algumas ilações para os próximos capítulos.