Opinião
Serviço público de transportes - Que estratégia para a sua reestruturação? (I)
O novo modelo tarifário agora apresentado em nada contribui para a melhoria deste serviço público, antes pelo contrário, irá contribuir para a sua continuada degradação.
O problema dos transportes públicos de passageiros na área Metropolitana de Lisboa não é o sistema tarifário, o principal problema é o de saber os motivos ou as causas porque mais de 50 mil passageiros, em média por dia, deixaram de utilizar o transporte público 2001 e 2004!
O novo modelo tarifário agora apresentado, porque se fundamenta no aumento no preço do títulos, em nada contribui para a melhoria deste serviço público, antes, pelo contrário, irá contribuir para a sua continuada degradação, com incidência na redução das receitas geradas pelo sistema.
Em 2001 utilizaram o serviço público de transporte de passageiros na Área Metropolitana de Lisboa cerca de 455,6 milhões de passageiros e em 2004 menos de 440 milhões de passageiros, perderam-se mais de 15 milhões de passageiros neste período, isto é, mais de 50 mil passageiros, em média e por dia, deixaram de utilizar os serviços públicos de transporte de passageiros entre 2001 e 2004 e passaram na sua quase totalidade a utilizar o transporte individual.
De acordo com os dados do Ministério das Obras Públicas o deficit operacional das empresas públicas de transportes em 2004 atingiu 175 milhões de euros, um agravamento de cerca de 32,6% em relação a 2001, sendo que para o triénio 2002/2004 o deficit operacional destas empresas acumulado, atingiu cerca de 514 milhões de euros, ou seja, um agravamento de mais de 100 milhões de euros nos deficits operacionais em relação ao triénio 1999/2001.
É sabido, que o passivo financeiro total nos transportes públicos (das seis empresas e sete unidades de negócio envolvidas (Metropolitano de Lisboa, Carris, CP Lisboa, CP Porto, Metro do Porto, Transtejo / Soflusa e STCP) atingiu 4,620 milhões de euros) uma percentagem equivalente a 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), verificando- se aumento de 34% face a 2003 ( terá quase duplicado em relação a 2001!!) Só o Metropolitano de Lisboa apresenta este ano um resultado líquido negativo que atingiu -170 milhões de euros (contra -168 em 2003), sendo que o seu passivo acumulado totaliza três mil milhões de euros, sendo que nesta empresa se constata um aumento de custos «per capita» com pessoal entre 2001 e 2003 que ultrapassa os 33,3%! Todas as empresas apresentaram elevados prejuízos no seu exercício, sendo de destacar a Transtejo / Soflusa que passou de uma situação de equilíbrio económico-financeiro e previsão de resultados positivos em 2001, para resultados negativos de mais de 26 milhões de euros em 2004, atingindo os prejuízos acumulados entre 2002 e 2004 mais de 60 milhões de euros e o endividamento actual deverá situar-se em cerca de 80 milhões de euros!
A inexistência de um pensamento estratégico para o serviço público de transporte de passageiros, a completa desarticulação entre as redes regionais e urbanas e as redes de transportes colectivos, potenciaram um aumento da repartição modal favorável ao transporte individual, agravando os problemas de congestionamento, em particular na travessia entre as duas margens do Tejo, acrescendo-se a insuficiência de investimentos nos transportes públicos de passageiros, que conduziu a uma estratégia defensiva dos operadores privados, provocando uma degradação profunda na oferta de transportes colectivos, quando comparado com as necessidades da população, bem assim como a completa desarticulação diferenciada (interfaces, horários, tarifários etc) dos sistemas de transporte público, que contribuiu para o agravamento com a insuficiência / ausência de critérios claros na definição de serviço público e dos objectivos que deveriam ser fixados às empresas, a que se junta a desastrosa gestão dos meios e recursos destas empresas durante este período, (2002-2004) pelo governo do PSD / CDS.
Por isso não resolve os graves problemas dos serviços públicos de transporte o modelo de tarifário agora proposto pelo Governo PSD / CDS, que assenta única e exclusivamente num aumento do tarifário, não permitindo a avaliação de vantagens deste sistema comparativamente ao sistema actual, sendo irresponsável e não resolve o problema das empresas, nem das pessoas, nem é socialmente mais justo. Esta proposta de modelo tarifário, introduz uma completa irracionalidade e injustiça, com os aumentos muito significativos de preço, que conduziria a um sistema profundamente distorcido, em que alguns dos utentes teriam que pagar um preço por quilómetro 50% superior ao preço médio, em benefício dos utilizadores dos meios rodoviários suburbanos e urbanos. Sendo assim, este novo modelo viria, a ser aplicado, a agravar substancialmente o preço daqueles que mais precisam de utilizar o serviço público de transporte de passageiros (caminho de ferro, metropolitano e fluvial). O estudo reflecte apenas a avaliação dos impactos nos clientes numa óptica financeira, não se «percebendo qualitativamente» as vantagens e maior flexibilidade na utilização de uma nova bilhética sem contacto, omitindo-se que a operacionalidade só é eficaz e eficiente quando serve os interesses dos utilizadores / clientes.
Em termos económicos no quadro do actual sistema tarifário, torna-se necessário, antes de mais, a sua regularização / actualização em termos de repartição das respectivas receitas dos passes multimodais, de acordo com o estudo realizado em 2001 e que deveria ter entrado em vigor em Julho de 2002, sendo que criação de novos títulos de transporte no âmbito de uma profunda alteração na política tarifária, que sem dúvida é uma das componentes que tem forçosamente que ser reestruturada, terá que ter em consideração uma política integrada de planeamento estratégico dos transportes, visando em primeiro lugar, a satisfação das necessidades reais de deslocação dos cidadãos de forma dignificante, ou seja, com tempos de percurso e custos razoáveis e condições de segurança, comodidade e conforto, sendo inadmissível, como é apresentada esta proposta de tarifário, que para além da sua completa inadequação é uma fonte de ineficiência e de descontrolo e de elevados decréscimos de receitas para quase todas as empresas.