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11 de Julho de 2008 às 14:00

Sem apito

Tal como há umas semanas, quando me congratulei com o aparente exercício de aplicação de justiça pelo Conselho Disciplinar da Liga, ao que eu julguei ter sido contraponto do sentido geral de abandalhamento do futebol português, começo por estabelecer uma declaração de interesse: Sou portuense e portista.

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Tal como há umas semanas, quando me congratulei com o aparente exercício de aplicação de justiça pelo Conselho Disciplinar da Liga, ao que eu julguei ter sido contraponto do sentido geral de abandalhamento do futebol português, começo por estabelecer uma declaração de interesse: Sou portuense e portista. (Ah! Também sou ingénuo e defensor da boa-fé kantiana, o que torna tudo mais massudo para os meus estóicos leitores).

Vem isto a propósito da reunião do Conselho de Justiça da FPF, de sexta-feira passada, a qual teve coisas boas e coisas más. A coisa má consistiu no vaudeville em que uma situação, presumivelmente séria, se transformou; a coisa boa é que provavelmente o desprestígio a que chegou o futebol nacional e seus órgãos bateu no fundo.

Toda a gente sabia, mesmo eu, que percebo pouco de futebol, que por essas bandas tudo se move por interesses, apadrinhamentos e influências. Sem com isso querer afirmar que há uns piores que outros, fiquei aturdido quando, aqui há uns anos, Luis Filipe Vieira declarou que estava mais interessado em obter lugares-chave na estrutura do futebol que boas aquisições para a equipa no relvado. Até temi que o Centro de Estágios do Seixal tivesse classes de direito desportivo e escola de directores associativos, em vez de campos de treino.

A esta luz, muita coisa se pode explicar, mas, como me recuso a cair na insinuação sem factos suficientemente sólidos, não vou avançar com suspeições, embora esse seja provavelmente o único produto abundante, e sem IVA, que existe no Portugal do presente.

Agora, no que me sinto suficientemente seguro para opinar com argumentos demolidores é sobre o caso Porto - Estrela da Amadora, o famoso caso da "fruta", que, aliás, também estava em apreciação na momentosa reunião de sexta-feira entre os artistas do CJFPF. E isso porque vi os documentos judiciais decisórios e os excertos cruciais de 2 pareceres de prestigiados professores de Direito, para além de ter lido transcrições das escutas que apareceram nos jornais e seguido a feérica conferência de imprensa de Ricardo Costa, numa nova forma de anúncio de decisões jurídicas, tipo Las Vegas. Comentários, mesmo pertinentes, deixei-os de lado, mas socorri-me de factos públicos e notórios.

Argumentando, pois, em termos breves:

– As "provas" contra Pinto da Costa (PC) consistem numa gravação de escuta telefónica e no depoimento de Carolina Salgado(CS) que, quanto a essa gravação, "descodificou" a palavra "fruta", a qual, segundo ela, significaria "prostitutas ". É tudo.

– Essa gravação é a única que, em sete meses de devassa, inclui o dito "código".

– As escutas telefónicas apenas são juridicamente válidas para casos de crime com pena superior a 3 anos, o que não é o caso da tentativa de corrupção. Acresce que este meio probatório tem que surgir como apoio a algo já existente que necessite de confirmação, não podendo elas, sem mais nada prévio, dar origem a um caso, nem servir, então, como prova.

– Se tão perigosa possibilidade inquisitória é admissível, ela apenas tem suporte para a hipótese de extrema gravidade penal. Aqui não cabe o delito desportivo para jurisdição desta qualidade, coisa comparativamente de somenos, como não podia deixar de ser.

– Mas vamos pensar como se isso fosse possível, com o apoio de algo mais, no caso o depoimento de CS. É credível?

– Já nem se fala da presumível motivação vingativa (sendo algo do foro psicológico, teria sempre de ser presumido); nem dos desmentidos quanto ao livro, até pela pessoa que o escreveu; nem do imbróglio no caso Ricardo Bexiga, com destruição de câmaras que nunca existiram; nem de quem fez "desabrochar" a obra literária e um curioso filme; nem como para o MP se é credível num caso mas não noutro, este auto-incriminatório.

– Nada disto interessa, pois, conforme ficou provado em audiência de julgamento, a senhora não poderia ter ouvido o telefonema por, ao dia e hora, estar noutro lugar (cabeleireiro e almoço com o pai). O juiz do processo, aliás, mandou tirar certidão das declarações de CS para efeitos de processo crime por falsas declarações.

– Entretanto, o processo contra PC já havia sido arquivado anteriormente e foi reaberto por ordem de M. J. Morgado, a qual decidiu, agora, mandar o MP recorrer da decisão do juiz de instrução criminal.

Como, hoje em dia, em futebol não se pergunta o fundamento de uma decisão mas QUEM decidiu, compreende-se como os magistrados se tenham afastado da chamada "justiça desportiva". Por isso, gostei de saber que o juiz que mandou PC em paz é do Sporting. (Só por curiosidade, gostaria de conhecer o clube predilecto de M. J. Morgado - não faço ideia, mas, como as coisas estão, a transparência era bem vinda).

Com várias dezenas de anos de carreira jurídica, e tendo assistido à progressiva degradação da Justiça em Portugal, nunca deixei , porém, de assistir a um exercício isento e imparcial. Todos os defeitos, mas não a falta de isenção.

Ora, a "Justiça" do Futebol caiu no pântano em que está o resto. Como isto vai, é preciso desfazer tudo e começar de novo e já nem é por rigor, mas por simples e elementar Vergonha.

Com excepção de um homem-bomba na Liga e na FPF, qualquer coisa serve.

APOSTILA – Por ter a mesma opinião, visto parecer-me exacta, muito me agradou a afirmação do conceituado e isento jornalista desportivo, David Borges, que sustentou na TV ser um grave dano para o futebol nacional um eventual afastamento do FCP da Champions.

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