Opinião
Que Fisco nos espera?
Uma amigo que vive e trabalha na Suíça contou-me há dias que recebera um telefonema de um funcionário do Fisco helvético a interrogá-lo sobre se ele possuía algum automóvel. Estupefacto, o meu amigo admitiu ser proprietário de um carro e indagou a razão d
Uma razão bem simples, afinal: a empresa onde trabalhava tinha sido vendida a um grupo financeiro austríaco e as autoridades fiscais, numa acção de rotina e controlo da operação, tinham apurado que ele recebia um subsídio para gasolina, mas da sua declaração de IRS não constava a existência de qualquer veículo, isto por lapso dos serviços que tinham preenchido a declaração.
Chegados a este ponto da história, dei comigo, naturalmente, a temer pela sorte do meu amigo. Imaginei-o ameaçado com as mais duras penalizações, quiçá com a cadeia, pagando com língua-de-palmo o lapso de terceiros. Quase senti um assomo de raiva, só de pensar no ar arrogante e feliz que certamente o funcionário estaria a fazer no momento em que comunicava a descoberta de tão terrível crime, gozando antecipadamente o previsível estado de aflição do "apanhado".
Um homem não é de ferro e só quem nunca enfrentou o maquiavelismo da máquina fiscal portuguesa ou a incompetência e a prepotência da generalidade dos serviços públicos pode ficar indiferente perante a sorte de alguém que se deixe enredar num qualquer processo litigante dirimido com tal gente. São horas e horas perdidas em conversas sem tino, quilos e quilos de papelada sem nexo, tudo para deleite de burocratas ignorantes que exercem os seus pequenos poderes com uma brutalidade desmedida (as honrosas excepções, que as há, apenas confirmam a regra).
Felizmente para o meu amigo, ele trabalha na Suíça e o tal zeloso funcionário do Fisco helvético apenas pretendia alertá-lo para a falta detectada na declaração, recomendando-lhe que não se esquecesse de corrigir o erro no próximo ano.
Esta história tem tanto de verdadeira como de inacreditável para o cidadão português que se vê cercado por um Estado cada vez mais guloso e asfixiante. Um Estado sem sentido ético nem bom senso na aplicação das cargas fiscais e na forma como trata os contribuintes, quase dando a sensação que anseia pelo êxodo de toda a população para a Suíça ou para outras paragens mais civilizadas.
Nem vale a pena falar da distância que nos separa da Confederação Helvética em termos cívicos, educacionais e culturais. Mas apetece perguntar, no entanto, onde param os responsáveis pela total falta de resultados com os gastos brutais de fundos comunitários em Educação feitos ao longo dos últimos 20 anos. E valerá certamente a pena exigir aos nossos governantes que parem para pensar, que estudem as boas práticas já inventadas e testadas noutras latitudes, e que avancem rumo ao futuro no respeito pelos contribuintes, afinal quem paga toda a monstruosa, burocrática e despesista máquina estatal.
Ninguém põe em causa que é preciso detectar e punir os infractores, aqueles que fazem tábua rasa do Direito e da Moral. Mas é também fundamental que o Estado queira e saiba cooperar com a sociedade responsável, aquela que de forma exemplar, quase diria patriótica, cumpre religiosamente as suas obrigações e tenta empurrar o País para a frente.
A verdade é que o cidadão comum sente-se revoltado por não vislumbrar o sentido da tão propalada Justiça Fiscal, por sentir que o Estado gasta demais, que temos "tachos" a mais, egos a mais, que a Política Fiscal tem uma visão contabilística de curto prazo, que se está nas tintas para o desenvolvimento mais justo e equilibrado da sociedade, indiferente ao facto de serem sempre os mesmos a pagar e a pagar cada vez mais.
Por isso, tantos clamam que já é tempo de darmos a volta a isto. De criarmos um País assente em valores humanos e em condutas éticas, pondo fim a um Portugal dominado por um estado geral de batota e crispação.