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02 de Junho de 2005 às 13:59

Prozac e Ferro

Fomos brindados, na semana que passou, com um conjunto de medidas que têm como objectivo recuperar a nossa deprimida economia. Maioritariamente, aumentos de impostos, cujos efeitos de curto-prazo suscitam muita controvérsia.

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Numa altura em que o País necessita de investimento e de desenvolvimento, mais este sinal de «recessão» pode, se não acompanhado de outro tipo de medidas, causar uma situação ainda pior, para o «rating» do País, do que aquela que aconteceria se o déficit não diminuísse as tais «décimas» que se espera.

Aparentemente, quase todos os políticos andam preocupados com os temas macroeconómicos, quando aquilo que deveria ser o nosso foco de atenção é a microeconomia, ou seja o mercado e o comportamento das organizações que nele operam. Portugal tem, claramente e por todos reconhecido, um problema de produtividade e, mais do que isso, de competitividade. Portugal produz pouco, mal e na linha de bens e serviços pouco valorizados. Começando pelos serviços públicos, que os sucessivos governos têm procurado mudar, sem sucesso, e acabando nas organizações privadas, o tecido microeconómico do País está doente: anemia motivada por deficiências no subsistema de pilotagem. Infelizmente, para este mal, ainda não nos foi indicada a cura.

Considerando Portugal um doente com depressão profunda, para além da anemia, aquilo que os vários governos têm proposto, como terapêutica, têm sido sessões de psicoterapia (podem resultar mas os efeitos demoram). O problema é que os portugueses estão cansados de esperar e, nem de propósito, os psicanalistas não tem sido muito bons. Talvez fosse bom começarmo-nos a tratar com um bom psiquiatra para a depressão, que normalmente acelera a recuperação com uma boa dose de prozac e com um bom especialista em medicina interna que nos receite ferro para a anemia. O Prozac e o ferro que o País precisa é de um bom dinamizador do investimento privado, a par com a qualificação intensiva dos recursos humanos.

Já há muitos anos que se fala da questão da competitividade. Não querendo ser injusto por desconhecimento, penso que a primeira pessoa que levantou este tema de uma forma sistemática foi o então ministro da Indústria, Eng. Mira Amaral. Se bem me recordo, foi por essa altura que se encomendou o famoso estudo Porter que, à boa maneira portuguesa, de pouco serviu para determinar as intervenções dos sucessivos governos sobre essas matérias.

Também, há muito que se fala na importância da educação (que até foi paixão para alguns) quando sabemos que ainda falta muito para que o nosso sistema educativo funcione com qualidade.

Claro está, que há ilhas de excepção: há boas escolas, públicas e privadas e há boas organizações, públicas e privadas. E quando se procura saber o que está por detrás desses sucessos, normalmente deparamos com lideres fortes, visionários e com capacidade de realização. Em suma, subsistemas de pilotagem eficazes. E essa eficácia vai para além da pessoa do próprio líder; normalmente são pessoas que se rodeiam de outras pessoas igualmente competentes.

A par destas medidas que a todos custam (mas, em especial a quem menos dinheiro tem) é fundamental que o governo actue rápida e incisivamente, ao nível microeconómico. Recuperando, ou não, o estudo Porter, é fundamental que se elejam os sectores que mais podem contribuir para o aumento da competitividade e se criem incentivos para que os privados a eles se dediquem. É, fundamental, também, que existam incentivos para a contratação de pessoas altamente qualificadas em tecnologia e/ou gestão para que se consiga aproveitar completamente o potencial de alguns excepcionais empresários portugueses, junto de quem alguma dessas duas vertentes possa existir em menor grau. Finalmente, é fundamental que se promova, de forma activa, o empreendorismo. Portugal é um país onde as pessoas são muito avessas ao risco; talvez valha a pena criar alguns mecanismos que o incentivem. Se isto for o Prozac, o ferro será o investimento no ensino. Talvez seja bom, de uma vez por todas, deixar as pessoas escolherem onde querem estudar, a todos os níveis (cheque ensino, por exemplo), a par com legislação que obrigue e facilite o investimento em investigação e desenvolvimento.

Finalmente, e como já defendi em inúmeros artigos anteriores, era excelente que, desta vez, o Governo, conseguisse por a Administração Pública a funcionar devidamente. A Administração Pública deveria ser o exemplo do tipo de organizações que se pretende que o País tenha: eficientes e eficazes. Se para isso for necessário mandar pessoas para casa, haja a coragem de o fazer. Custa menos ao país um funcionário público em casa, do que a desempenhar mal a sua função. É importante que se encare a variável número de funcionáros como um custo afundado. Reestruturem-se os serviços, com base na utilidade para o cidadão e não tendo como preocupação o interesse próprio dos funcionários e das corporações.

E, antes de terminar, uma sugestão aos nossos governantes: peçam a colaboração a quem tem experiência, com comprovado sucesso na dinamização de organizações. Existem um conjunto de excelentes empresários e gestores, (não os seus representantes, uma vez que muitas vezes esses fazem mais «política» do que gestão de sucesso, nem forçosamente os mais mediáticos, que perdem muito tempo com a gestão da imagem) que estou certo gostariam imenso de colaborar com os órgãos de governo responsáveis pelas áreas que abordei. Com todo o respeito que os políticos e os académicos me merecem, não se perde nada em ouvir quem sabe, na realidade, fazer acontecer o sucesso.

Este é o momento em que devemos, a todo o custo, trabalhar par o bem do País, sob pena de termos de vir a justificar, aos nossos filhos, a incapacidade de toda uma geração de portugueses.

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