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03 de Outubro de 2002 às 16:07

OE 2003: Cortes sem custos

A despesa pública ganhou vida própria e cresce sem a intervenção humana. Este Orçamento de Estado confirma a contradição de termos: não há orçamento que resista a este Estado.

Sérgio Figueiredo, Jornal de Negócios

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A despesa pública ganhou vida própria e cresce sem a intervenção humana. Este Orçamento de Estado confirma a contradição de termos: não há orçamento que resista a este Estado.

Sérgio Figueiredo, Jornal de Negócios

A tesoura estava afiada, a mão de Bruxelas susteve o golpe profundo que se temia, mas a política orçamental do próximo ano está longe de ser expansionista. É sobretudo do sector privado, e não do Estado, que a tão aguardada recuperação da actividade económica irá depender em 2003.

Os grande números deste Orçamento de Estado revelam uma austeridade «soft», têm o mérito de repor equilíbrios perdidos e dizem-nos que a ministra Manuela Ferreira Leite já não tem de cometer uma espécie de «harakiri» financeiro para eliminar o défice público.

A austeridade é «soft» porque o OE/2003 acomoda obviamente o facto de a Comissão Europeia ter adiado por dois anos, para 2006, o objectivo de orçamentos equilibrados na zona euro.

Os equilíbrios são repostos, porque o Estado reconquista a capacidade de gerar um saldo corrente positivo. Isto significa que a cobrança de impostos será suficiente, e ainda vai sobrar (807 milhões de euros), para cobrir as suas actividades quotidianas: pagar salários aos funcionários, pensões aos reformados, os juros da dívida ou adquirir bens de consumo.

Além disso, o défice global do Sector Público Administrativo (3.371 milhões de euros) volta a ser bastante inferior ao défice de capital (4.124 milhões de euros), o que reabilita a chamada «regra de ouro» das finanças públicas.

Por fim, a despesa corrente primária - indicador mais apropriado para avaliar o impacto das medidas discriminatórias do Governo, uma vez que exclui o pagamento de juros - regressa a um ritmo de crescimento mais aceitável (com uma taxa de 5%), que compara com os 8,5% deste ano.

Puro acto de voluntarismo. O Estado continua no estado em que já nos habituámos a conhecer.

Funcionários a mais, cuja massa salarial cresce 414 milhões de euros, aos quais ainda se devem adicionar os 200 milhões colocados na dotação provisional do Ministério das Finanças para a actualização das tabelas da função pública. Empresas deficitárias, que obrigam a um esforço adicional de 171,5 milhões de euros em subsídios.

Leis da República que introduzem rigidez estrutural nas transferências para outros subsectores, nomeadamente para a segurança social, as autarquias locais e as regiões autónomas, e que registam um aumento de 200 milhões de euros.

Tudo somado, os gastos correntes do Estado sobem mais de 1.200 milhões de euros - apesar da contenção forçada, apesar a terapia de choque que representa o corte de 10% nas dotações orçamentais de praticamente todos os ministérios, apesar de o próprio secretário de Estado do Orçamento reconhecer que será muito difícil conter a despesa dentro dos limites fixados.

Se conseguir, será ainda assim o efeito notável: a despesa corrente «apenas» aumenta 3,8%, quando este ano vai progredir à taxa de 9%. Fraco consolo. É como se um obeso, com mais de 150 quilos e com problemas cardiovasculares, se vangloriasse com a expectativa, não de emagrecer no próximo ano, mas de engordar menos que nos anos anteriores.

Por Sérgio Figueiredo, Jornal de Negócios

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