Opinião
O Multilinguismo ou a Torre de Babel europeia
Existem, actualmente, na União Europeia 27 Estados membros e 23 línguas oficiais, as mais recentes das quais são o búlgaro e o romeno, dos países do último alargamento, mas também o gaélico que conseguiu o respectivo reconhecimento neste nível, o que impl
Existem, actualmente, na União Europeia 27 Estados membros e 23 línguas oficiais, as mais recentes das quais são o búlgaro e o romeno, dos países do último alargamento, mas também o gaélico que conseguiu o respectivo reconhecimento neste nível, o que implica, designadamente, a tradução de milhares de páginas de documentos, mas também a interpretação simultânea nas reuniões comunitárias.
É verdade que um dos grandes receios dos cidadãos europeus é a perda de identidade de que a língua é a expressão máxima, mesmo a nossa pátria. Também sabemos que a língua é, ainda que dentro de um único país, um símbolo de diferenciação regional, como acontece em Espanha, ou mesmo de guerras intestinas, como na Bélgica entre valões e flamengos, por causa da qual já têm caído governos.
Muitas outras querelas existem neste domínio, se contarmos com a existência de mais outras 60 línguas regionais minoritárias, sem contar com dezenas de línguas originárias de toda a parte do mundo e que são faladas pelas comunidades imigrantes na Europa.
Pode dizer-se que seria mais confortável avançar com uma única língua neste processo de integração europeia, de que a respectiva comunicação é um vector essencial. Uma língua única oficial, como acontece nos Estados Unidos da América, facilitaria a compreensão e tornaria menos penoso e, sobretudo oneroso, o processo de tradução à qual estão afectos pelo menos um quarto dos funcionários das instituições comunitárias.
Porém, em termos políticos, a União Europeia optou, na senda da sua divisa unidos na diversidade, pela utilização das línguas escolhidas pelos próprios governos nacionais dos seus cidadãos, em vez de uma única língua ou de algumas da sua própria escolha e que muitas pessoas certamente não poderiam compreender.
Assim, e a título de exemplo, o Jornal Oficial da União Europeia é publicado diariamente em mais de 23 línguas, um caso único no mundo editorial e o Serviço das Publicações publica igualmente uma série de outros títulos, tanto em papel como em formato electrónico, sobre as actividades e as políticas da União Europeia.
A política de multilinguismo como instrumento de governo é única no mundo, a ponto de estar afecto, enquanto pelouro autónomo, ao comissário romeno Leonard Orban que, como se percebe, tem a tarefa difícil de demonstrar as vantagens da aprendizagem de outras línguas, designadamente no domínio dos negócios.
Assim, numa amostragem de 2.000 empresas exportadoras, 11% referiram que perderam contratos devido ao não domínio de outras línguas, pelo que se pode concluir que o multilinguismo favorece a competitividade e a empregabilidade, sendo um factor de enriquecimento cultural e de melhor comunicação entre os povos europeus e as instituições comunitárias.
Porém, na prática, nem sempre as questões se passam de forma tão fácil e prosaica. Nos bastidores da própria União Europeia há uma luta surda pelo domínio do inglês, potenciado pelo uso da Internet, e pelo facto de este se estar, cada vez mais, a perfilar como a língua dos negócios a nível mundial.
Por seu turno, os alemães, mas sobretudo os franceses, lutam desesperadamente para não perder a supremacia de quem chegou há mais tempo ao espaço comunitário. É que, cada vez mais a francofilia perde terreno e apenas continua acantonada, qual aldeia de Astérix que ainda resiste, enquanto língua de trabalho no Tribunal de Justiça, onde as deliberações dos juízes são secretas e à porta fechada e não se compadecem com qualquer tipo de tradução simultânea ou outra.
A realidade mostra, contudo, sobretudo após os dois últimos alargamentos, que o inglês ganha terreno, e se começa, tendencialmente a impor quase como língua única, a ponto da página electrónica do comissário do pelouro, e sobretudo os seus discursos, estarem fundamentalmente em inglês.
Como refere um sábio provérbio árabe, devemos aprender uma língua se quisermos evitar a guerra.