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12 de Novembro de 2009 às 11:52

Não à política do renminbi fraco

Ao longo das últimas semanas, a depreciação do dólar face ao euro e ao iene chamou a atenção de todo o planeta. Numa situação normal, o enfraquecimento do dólar seria bem acolhido, uma vez que ajudaria os Estados Unidos a combaterem um...

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Ao longo das últimas semanas, a depreciação do dólar face ao euro e ao iene chamou a atenção de todo o planeta. Numa situação normal, o enfraquecimento do dólar seria bem acolhido, uma vez que ajudaria os Estados Unidos a combaterem um défice comercial insustentável. No entanto, num mundo onde a China mantém a sua divisa vinculada ao dólar com uma paridade subavaliada, a desvalorização da nota verde pode provocar sérios danos à economia global e constituir um obstáculo suplementar para pôr fim à recessão mundial.

Há muito tempo que se revelava necessário proceder a um realinhamento do dólar. A sua sobrevalorização começou com a crise do peso mexicano em 1994 e foi oficialmente consagrada com a política do "dólar forte" adoptada após a crise financeira do Leste Asiático em 1997. Essa política favoreceu, a curto prazo, o consumo nos Estados Unidos, o que explica a razão de ser tão popular entre os políticos norte-americanos. Contudo, infligiu danos substanciais à economia dos EUA no longo prazo e contribuiu para a actual crise.

A sobrevalorização do dólar levou a economia norte-americana a gastar muito mais dinheiro nas importações, à deslocalização de postos de trabalho e a um desvio de investimento para países com moedas subvalorizadas. Na actual era da globalização, marcada por redes de produção flexíveis e móveis, as taxas de câmbio afectam mais do que as exportações e as importações. E têm também impacto sobre a localização da produção e do investimento.

A China tem sido uma das principais beneficiárias da política norte-americana de dólar forte, ao qual vinculou a sua própria política de "renminbi fraco". Consequentemente, o excedente comercial da China face aos EUA aumentou de 83 mil milhões de dólares em 2001 para 258 mil milhões em 2007, mesmo antes da recessão. Desde o início deste ano, o excedente da China corresponde a 75% do défice comercial total dos Estados Unidos, excluindo o petróleo. O renminbi subvalorizado também converteu a China numa importante receptora de Investimento Directo Estrangeiro (IDE), a ponto de ocupar o primeiro posto mundial em 2002 - um feito impressionante para um país em desenvolvimento.

A magnitude dos recentes défices comerciais dos EUA sempre foi insustentável e, consequentemente, o dólar perdeu terreno face ao iene, ao euro, ao real e aos dólares australiano e canadiano. No entanto, a China mantém a sua política de moeda subvalorizada, pelo que o renminbi teve uma baixa valorização face ao dólar. Quando conjugado com o rápido crescimento da China em termos de capacidade industrial, este padrão anuncia uma nova ronda de desequilíbrios globais.

A política cambial da China leva a um confronto mundial com o resto do mundo. Ao manter uma moeda subvalorizada, a China está a impedir que os EUA reduzam o seu défice comercial bilateral. Além disso, o problema não é só da América. Esta política cambial da China confere-lhe vantagem competitiva face a outros países, o que lhe permite deslocalizar as exportações desses países para os Estados Unidos.

Pior ainda, outros países cujas moedas se apreciaram face ao renminbi podem esperar uma invasão de importações chinesas. A política cambial chinesa significa que a depreciação do dólar, em vez de melhorar a balança comercial e estancar a perda de empresas e investimento, pode inadvertidamente fazer alastrar estes problemas para o resto do mundo. Com efeito, a China está a fomentar novos desequilíbrios numa altura em que os países se debatem com a queda da procura, derivada da crise financeira.

O dólar é como um elemento do cubo de Rubik nas taxas de câmbio. A China, ao preservar a sua política de divisa subvalorizada, a apreciação do dólar pode agravar as forças deflacionistas em todo o mundo. No entanto, uma combinação de factores políticos levou a que os estrategos políticos de outros países se negassem a enfrentar a China.

Por parte dos Estados Unidos, uma mentalidade de Guerra Fria que ainda persiste, conjugada com a presunção de superioridade económica norte-americana, significa que as questões económicas são tidas ainda como muito acessórias face às preocupações de carácter geopolítico. Isso explica o negligenciar das relações económicas EUA-China, uma desatenção que é agora perigosa para os Estados Unidos, atendendo à sua situação económica mais frágil.

No que diz respeito ao resto do mundo, muitos indivíduos apontam facilmente o dedo aos EUA, muitas vezes por ressentimento perante a sua suposta arrogância. Além disso, existe uma velha mentalidade entre os países do Sul de que não podem estar de costas viradas para o Norte e que devem mostrar solidariedade entre si no que diz respeito a esse relacionamento.

Por último, é possível que todos os países tenham dado provas de alguma miopia, ao imaginarem que com o seu silêncio conseguiriam favores comerciais da China. Mas esse silêncio simplesmente permite à China explorar a comunidade de nações.

A economia mundial tem pago um alto preço pela cumplicidade e silêncio sobre as políticas económicas dos últimos 15 anos, que culminaram na mais profunda e mais perigosa recessão desde a década de 30. E pagará ainda mais se os estrategos políticas continuarem a demonstrar uma atitude passiva perante a destrutiva política cambial chinesa.

Thomas I. Palley é membro da New America Foundation.

© Project Syndicate, 2009.
www.project-syndicate.org
Tradução: Carla Pedro

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