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Estratégia em recessão

As empresas portuguesas intuíam já que os próximos anos iam ser muito difíceis em termos económicos. Mas as previsões de crescimento do Banco de Portugal para 2009 e 2010 vieram dar uma dimensão concreta a essa intuição.

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Em termos médios e para as empresas uma recessão significa que vão fazer face a uma procura mais baixa, mas onde também as margens de lucro tenderão a ser mais baixas. Este padrão médio mascara porém situações de enorme heterogeneidade. Haverá sectores, empresas e segmentos de mercado que observarão crescimento na sua procura e terão melhorias nas margens. Como haverá também muitas empresas, mais do que o habitual, que sofrerão grandes reduções na procura e margens de comercialização.

Como lidam as empresas com esta situação? A abordagem mais comum é o reconhecimento de que os anos de recessão são diferentes dos demais, e que por isso as regras de actuação que no passado recente produziam resultados aceitáveis deixam de ser necessariamente válidas. Os líderes empresariais incluem na sua reflexão estratégica o cenário do desaparecimento da sua empresa, mesmo que o não reconheçam formalmente. De uma forma ou de outra as empresas ficam mais disponíveis para a mudança. Essa disponibilidade é tanto maior quando mais próxima dos sinais de mercado estiver a empresa. Quem depende de vendas para o Estado, ou dos seus apoios, recebe os sinais de mercado muito mais tarde do que quem tem de lidar com a volatilidade da procura de agentes económicos privados.

As respostas das empresas podem ser agrupadas em três grandes grupos. O primeiro é capturado pela expressão inglesa "cash is king" (o dinheiro é rei). Nesta abordagem as empresas cortam custos ao máximo e sentam-se em cima de todo o dinheiro que consigam acumular. A ideia chave por trás desta abordagem é o reconhecimento de que muitas empresas vão enfrentar dificuldades com as consequentes desvalorizações de activos e reduções de preços. Nestas circunstâncias quem tiver acesso fácil a dinheiro vivo vai conseguir muitos e bons negócios em condições muito atractivas que não existem em abundância durante os períodos normais de expansão económica.

Numa primeira frase, se houver muitas empresas a seguir esta abordagem, há até um abrandamento económico mais acentuado resultante do adiamento de decisões que envolvam custos adicionais, mas quando passa o ponto mais baixo do ciclo a recuperação da actividade pode também ser muito rápida.

Acresce que esta abordagem só é viável para quem tem dinheiro, e acredita que, no essencial, a sua empresa vai resistir incólume à recessão.

O segundo grupo de respostas pode ser descrito pela frase "a quota de mercado é a rainha". Nesta perspectiva as empresas fazem tudo para manter quota de mercado. No fundo, acreditam que os seus concorrentes vão estar em dificuldades, e por isso farão tudo para manter quota mercado. O sucesso será dos mais resistentes. Isso ocorre através de reduções agressivas de preços e margens, e também através de investimentos selectivos em comunicação, que de repente ficam em geral bastante mais baratos. Assim, as empresas acreditam que se foram rápidas a fazer as coisas, serão as sobreviventes dos seus sectores de actividade. Quando a poeira assentar olha-se à volta e quem estiver de pé fará parte do novo ciclo económico. As empresa que lutam pela manutenção da quota de mercado acreditam piamente que serão parte daquelas que ficarão de pé, num mundo que não mudará muito entre o antes e o após recessão.

O terceiro grupo de respostas pode ser visto como "o rei está moribundo, viva o príncipe herdeiro." Aqui as empresas acreditam que os seus sectores serão profundamente afectados pela recessão em curso. Que a configuração do seu sector mudará radicalmente. Que o sucesso ocorrerá em novos segmentos de mercado. E que até ao final da recessão haverá muita consolidação com fusões, falências e aquisições, mas acima de tudo profunda alteração na estrutura de mercado, em particular do lado da oferta. Nestas empresas a chave é pensar no que ocorre a seguir à recessão, sem esquecer que o príncipe herdeiro só conseguirá ser rei se sobreviver à doença do monarca actual.

Tipicamente, estas empresas alteram profundamente a alocação de recursos internos durante a recessão, focando-se menos nos sucessos imediatos de mercado e centrando a sua acção na construção do seu negócio pós-recessão. Claro que este exercício tem elevado risco já que se torna muito mais difícil e incerto fazer previsões nas alturas de maior turbulência. Mas estas empresas aproveitam as crises para repensar o seu portefólio de produtos e serviços e reconfigurar a sua oferta. As empresas mais admiradas vêm normalmente deste último grupo já que surpreendem tudo e todos pela saúde que exibem na saída da recessão, embora as suas acções sejam normalmente mal compreendidas pelos analistas e concorrentes, pelo menos inicialmente.

Há dois outros grupos que não têm tanto interesse pedagógico: os que disparam em todas as direcções e os que ficam paralisados pelo medo pedinchando ajuda em cada esquina. No espaço mediático, porém, estes dois grupos podem ter uma exposição superior à sua importância.

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