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30 de Outubro de 2009 às 12:04

Esperanças renovadas para a energia renovável

Há uma década, as energias renováveis eram vistas como uma consequência indesejada dos combustíveis fósseis, mas a recente criação da Agência Internacional da Energia Renovável (IRENA) indica que os governos de todo o mundo estão a levar a sério as...

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Há uma década, as energias renováveis eram vistas como uma consequência indesejada dos combustíveis fósseis, mas a recente criação da Agência Internacional da Energia Renovável (IRENA) indica que os governos de todo o mundo estão a levar a sério as "renováveis". Com os crescentes receios em torno das alterações climáticas e da volatilidade dos preços do petróleo e de outros combustíveis fósseis, as renováveis estão por fim a tornar-se numa proposta viável.

A IRENA terá a sua sede nos Emirados Árabes Unidos, na cidade de Masdar (em Abu Dhabi), que é a primeira cidade do mundo sem dióxido de carbono e que será construída no deserto até 2011. A agência manterá também dois braços vitais na Europa: um centro de inovação e tecnologia em Bona e um escritório em Viena para as alianças estratégicas com outras agências, especialmente com as Nações Unidas.

Em 2008, foram investidos perto de 155 mil milhões de dólares em empresas de energia renovável e projectos um pouco por todo o mundo, excluindo os projectos hidroeléctricos em larga escala, segundo um recente relatório do Programa do Ambiente da ONU. A uma escala global, o sector das energias renováveis criou 2,3 milhões de empregos nos últimos anos. Só na Alemanha, o crescimento deste sector gerou 250.000 novos empregos verdes em menos de 10 anos.

As grandes empresas estão a aplicar milhares de milhões de dólares para estudarem as oportunidades que as renováveis podem trazer. Existem sérios planos de converter o calor e a luz solar do deserto do Saara na maior fonte energética da Europa, fornecendo energia a 500 milhões de pessoas. Algumas projecções dizem que custará até 60 mil milhões de dólares começar a fornecer a Europa, dentro de 10 anos, com energia eléctrica do Saara. Com apoios públicos, os progressos poderiam ser muito mais rápidos. Os custos são enormes, mas a actual crise económica e financeira ensinou-nos a não ter medo de números na ordem dos 10 dígitos.

Os custos da energia renovável acabarão por descer, a par com a inovação tecnológica e a produção em série. O Parlamento Europeu homologou recentemente uma lei de apoio aos investidores que ajudam o Velho Continente a alcançar a sua meta de obtenção de 20% da sua electricidade a partir de energias renováveis até 2020.

Na qualidade de uma nova plataforma global para as renováveis, a IRENA prestará aconselhamento normativo e ajudará à criação de capacidade e transferência de tecnologias, o que contribuirá para que as nações mais pobres possam ter acesso a energia limpa - um passo muito importante para que milhões de pessoas saiam de uma situação de pobreza. Ainda assim, os cépticos poderão perguntar: temos mesmo de acrescentar mais uma sigla à sopa de letras da burocracia global? A minha resposta é sim. Esta nova agência tem já um imenso potencial.

Em primeiro lugar, a IRENA será muito eficaz para desenvolver medidas de acção e propagar a tecnologia, em parte porque os países que desempenharam um papel fundamental na sua criação - Dinamarca, Alemanha e Espanha - têm credenciais impecáveis em matéria de política "verde". A Dinamarca é pioneira na energia eólica comercial e produz metade da capacidade dos parques eólicos de todo o mundo. E em breve irá preparar o terreno para um mundo pós-Quioto.

A Alemanha lidera no sector das tecnologias limpas, focalizando-se na energia solar. Em 2020, pretende que 47% da sua electricidade provenha das renováveis. Espanha esteve entre os primeiros países a introduzir um plano energético nacional de promoção das fontes de energia renovável e de redução das emissões de gás com efeito de estufa. Gostaria de acrescentar também aqui a Áustria, um centro energético internacional já comprovado e líder na produção e nas tecnologias de energia renovável.

Em segundo lugar, os numeros membros desta nova agência - 136 Estados - estão bastante interessados em beneficiar das oportunidades que a energia renovável irá criar para o crescimento, postos de trabalho, além de que contribuirão para atender aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, delineados pela ONU. Estes países reconhecem o potencial das energias renováveis, especialmente no que diz respeito a novas soluções - sem ligação à energia eléctrica - em zonas rurais.

Em terceiro lugar, a IRENA estará sediada num país em desenvolvimento, o que representa um voto de confiança na qualidade, conhecimentos técnicos a nível institucional e dinamismo existentes no mundo em desenvolvimento. Além disso, o facto de estar sediada em Abu Dhabi constitui uma mensagem inequívoca de que promover as emergias renováveis não é ser "anti-petróleo". Os combustíveis fósseis permanecerão entre nós ainda durante algum tempo e deveríamos continuar a procurar continuamente formas mais limpas de os utilizar.

Ao mesmo tempo, temos de encarar os factos: os combustíveis fósseis não vão durar para sempre e algumas reservas poderão escassear em breve. Assim sendo, devemos preparar-nos para o inevitável e desenvolver políticas, tecnologias e infra-estruturas institucionais relevantes o mais rapidamente possível.

A IRENA pode não ser uma componente do sistema das Nações Unidas, mas deve ser considerada como parte da família desde o início. Uma lição que aprendemos com a crise económica e com o debate sobre as alterações climáticas, com vista à cimeira de Copenhaga que se realiza em Dezembro, é que só trabalhando em conjunto é que conseguiremos operar verdadeiras mudanças.

De certa forma, a mudança chegou. A IRENA é uma prova sólida de que o nosso mundo está disposto a distanciar-se de um passado demasiado sobrecarregado com emissões de dióxido de carbono e a alimentar um futuro limpo e próspero do qual possam desfrutar em igual medida os países em desenvolvimento e os países desenvolvidos.


Kandeh K. Yumkella é director-geral da Organização para o Desenvolvimento Industrial, das Nações Unidas.

© Project Syndicate, 2009.
www.project-syndicate.org
Tradução: Carla Pedro

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