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05 de Junho de 2002 às 18:13

«Em busca da organização perfeita»

A estrutura organizacional deve ser fonte de satisfação de clientes internos e externos, pela qualidade de trabalho, espírito de corpo e estabilidade das equipas e parcerias de negócio que estimula.

Pedro B. da Camara, Professor Universitário

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Numa altura em que, entre nós, a reestruturação do Estado, das empresas e das organizações está na ordem do dia, intensifica-se a procura do modelo organizacional ideal.

Com efeito, as organizações tayloristas, herdadas da Era Industrial, já não dão resposta às exigências dos mercados, cada vez mais volúveis e dos consumidores, mais informados, mais sofisticados e habituados a 100% de satisfação, imediatamente.

A este estado de coisas se deverá atribuir a insatisfação generalizada com os serviços públicos, altamente burocratizados, lentos, sem qualquer tipo de orientação para os clientes ( a que preferem chamar «utentes») e com custos de operação totalmente desproporcionados aos serviços que prestam.

A generalidade das empresas tem ainda uma forte impressão digital do taylorismo e assenta em estruturas fortemente autoritárias e hierarquizadas, pesadas, com cargos de contornos bem delimitados e conteúdo essencialmente rotineiro, cujos titulares têm escassa autonomia e poder de decisão e não são minimamente envolvidos no processo de definição estratégica da empresa e, frequentemente, até o desconhecem.

O que aqui vai dito das empresas é aplicável, «mutatis mutandis», às organizações, sejam elas associações culturais, económicas ou sindicais, em que os dirigentes se eternizam nos seus cargos e, não raro, os usam em proveito próprio e a massa associativa tem fraco grau de mobilização e participação.

Não admira, pois, que perante um panorama tão desolador, em que as raras excepções só acentuam o cinzentismo do resto, haja uma aspiração generalizada de reforma, de inovação, que dê um novo fôlego á nossa economia.

E que perfil deverá ter a organização perfeita?

Há uma meia dúzia de anos atrás, esteve muito em voga uma visão determinista, que argumentava que os modelos organizacionais oriundos da primeira metade do Séc. XX evoluiriam inelutavelmente para organizações em rede, flexíveis, informais, quase sem diferenciação hierárquica, em que equipas de comando e de projecto, de geometria variável, se articulavam com o propósito de encontrar, com rapidez, soluções que satisfizessem ou ultrapassassem mesmo as expectativas dos clientes.

Foi expoente máximo dessa escola o Prof. Savage, da Universidade da Califórnia, que propôs o modelo de evolução que aqui se reproduz e que tem tanto de aliciante, como de utópico.

Hoje, começa a ser evidente que não é possível fazer funcionar em rede empresas e organizações de grandes dimensões, com significativas diferenças de competências nos vários segmentos da sua população e que desenvolvem a sua actividade em áreas da «Velha Economia» (indústria estática, por exemplo).

O que não significa que os modelos organizacionais tradicionais não sejam reformáveis.

A indústria japonesa, por exemplo, ensinou-nos que é possível substituir a linha de montagem fordista por equipas polivalentes, responsáveis por produzir unidades acabadas, com redução de custos e aumento de qualidade.

Neste momento, o enfoque está não tanto no modelo de organização a criar – admitindo-se que vários modelos podem coexistir numa economia moderna – mas antes nos atributos que a organização ideal deve ter.

E não surpreenderá que boa parte desses atributos tenham a ver com a forma como elas vão estruturar e gerir os meus activos humanos, que são universalmente reconhecidos como a única fonte de vantagem competitiva sustentável das empresas.

Um pré-requisito é que o tipo de organização escolhido deverá ser o que apoia, de forma mais eficaz, o desenvolvimento do negócio da empresa.

Não deve, pois, ser ditado por modas de gestão, mas, muito pragmaticamente, pela realidade subjacente e terá que ter em conta o futuro crescimento do negócio e a avaliação dos constrangimentos que poderá ocasionar a essa evolução.

A estrutura organizacional deve, essencialmente, ser fonte de satisfação de clientes internos e externos, pela qualidade de trabalho que gera, pelo espírito de corpo e estabilidade das equipas que consegue e pelo tipo de parcerias de negócio que estimula e origina.

Por outro lado, deve ser um instrumento flexível e adaptável às mudanças da envolvente exterior, o que implica uma força de trabalho que conheça e interiorize os objectivos estratégicos da empresa, que tenha autonomia para tomar as decisões necessárias no âmbito da função que ocupa e que tenha capacidade de mudar no momento certo.

Na época que vivemos, a descontinuidade da mudança e o ritmo a que se processa exigem não só adaptabilidade, como rapidez no aproveitamento das oportunidades de negócio.

O modelo organizacional deve, ainda, capitalizar nos pontos fortes da empresa e minorar as suas vulnerabilidades.

Todos estes atributos giram à volta das pessoas nas organizações – como alinhar, mobilizar a fazer agir o capital humano de que a empresa dispõe.

E, neste campo, existem recursos surpreendentes que as organizações, em muitos casos, são incapazes de aproveitar.

A empresa ganhadora do futuro será aquela que, de forma mais eficaz, conseguir capturar e aplicar o capital intelectual de que dispõe, a sua criatividade e inovação e a sua identificação com o projecto de negócio.

Sendo inquietante para alguns, a verdade é que a chave do sucesso está, cada vez mais, nas pessoas.


Pedro B. da Camara


Professor Universitário e Consultor

Comentários para autor e editor para pca_consultores@oninet.pt

Artigo publicado no Jornal de Negócios – suplemento Negócios & Estratégia

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