Opinião
É preciso é escutar o país
Com arquejante curiosidade tenho seguido as sombrias notícias sobre escutas em Belém. Segundo o circunspecto "Público", os grampos teriam sido colocados por assessores de Sócrates nos locais do palácio por onde andam os assessores de Cavaco.
Com arquejante curiosidade tenho seguido as sombrias notícias sobre escutas em Belém. Segundo o circunspecto "Público", os grampos teriam sido colocados por assessores de Sócrates nos locais do palácio por onde andam os assessores de Cavaco.
Não lhes gabo, a nenhum deles, o gosto e a indiscrição. Conheço alguns, de ambos os lados. Não estão muito hipotecados à inteligência e a cabeça de três ou quatro chega, mesmo, a riscar o diamante.
Que raio de conversas suscitariam a bisbilhotice alheia, dando por certo que a notícia possui foros de verdade, do que duvido. No entanto, acaso o assunto for facto e não pequena especulação, a Presidência terá de tomar decisões drásticas. Ordenar à PJ, à PSP, à GNR, ao SIS, ao SEF uma profícua e muito esmerada investigação, a fim de se obter conclusões. A pátria vital está suspensa. Nos cantos e recantos do palácio, nos desvãos, sob os tapetes, incrustados nos candeeiros, nas espessas dobras dos pesados reposteiros, nos mansos gabinetes, no salão onde Cavaco escreve, no sofá onde costuma dormir a sesta; nas paredes, nos tectos, nos telhados, tudo, milimetricamente, terá de ser submetido a especial varejo.
Se for descoberto o mais escasso fio, o mais pequenino botão, quem os lá colocou terá de ser punido com a gravidade que o crime exige e justifica. E se ocorrer o contrário? Se a notícia não é notícia (com perdão da palavra) e se for uma qualquer tranquibérnia urdida por espírito maligno, então, lei em cima do autor. O dr. Cavaco não pode, em nome da verdade (tão apregoada pelo partido a que pertence) passar ao lado do assunto, como cão por vinha vindimada, que se nos desculpe a analogia. Que fazer? Despedir o eng.º Sócrates, em caso de culpabilidade dos seus desastrados e levianos assessores? E que tem o eng.º Sócrates a ver com as eventuais leviandades dos seus assessores?
Responsabilizar, somente, os prevaricadores, atirá-los para a masmorra, e escarmentá-los publicamente? E se se der a inversa? Como punir os delinquentes? Este penoso problema está repleto de pontos de interrogação.
Até à hora a que escrevo, nada de novo foi acrescentado à grave informação inicial. Ouvi e vi, nas rádios e nas televisões, um chorudo grupo de comentadores, discreteando sobre. É um divertimento estimulante escutar esta gente. Habitualmente estão completamente impreparados e dizem disparates dos mais risíveis. Nos intervalos do habitualmente, são autênticos imbecis, que nada sabem, que nada arriscam, que não espevitam a interesse de quem os atende. Há dias, um director de jornal dizia-me: "Estes tipos são tão maus que você nem acredita. Não sabem nem curam de saber."
Enquanto andamos nesta montanha russa de folclore de estação, os dois putativos candidatos a primeiro-ministro dizem, um dos outro (ou uma do outro) o que Mafoma não disse do toucinho. O nível geral do discurso político quase desceu à altura da sarjeta. Não se sabe o que a dr.ª Manuela deseja para o País, apesar dos patéticos esforços do Pacheco Pereira. E, pior!, quando ela fala o tolejo é pungente. Lá vem o pobre Pacheco (como Eduardo Prado Coelho o chamava) tentar que façamos outras interpretações. Estas cenas atingem os termos da ópera-bufa, com um contra-regra que nos quer sujeitar a uma realidade inexistente. Se eu estivesse propenso a dar o meu voto à líder do PSD, bastava ouvi-la uma só vez para fugir espavorido. Nada tenho de pessoal contra a senhora. Em boa verdade, também nada tenho, politicamente, contra ela. Porque a não conheço e porque ela, politicamente, é nada.
Manuela Ferreira Leite é um dos mais graves sintomas da pandemia de mediocridade que, desde há anos, se instalou e alastrou pelo País. Teve, e tem, como modelo o dr. Cavaco, cuja nefasta presença, em dez anos como primeiro-ministro, ainda não foi seriamente analisada. Um jornalismo acrítico e uma legião de estipendiados construíram um território de equívocos, de mentiras e de fraudes que transformaram o banal homem de Boliqueime num génio imaculado. A banalidade do senhor é constantemente provada. Banalidade e carência de subtileza. Esperemos que, neste caso das "escutas", ele se não imiscua. É manifesto que se trata de uma "borbulha" eleitoral, criticável, evidentemente, pela sua natureza escabrosa, mas que se vai tornando comum nestes períodos. Mais grave é quando a honra de pessoas e de instituições é atingida. E tudo se passa sem nenhum esclarecimento e com a mais perfeita impunidade.
Não sei, ninguém sabe, como é que e quando é que a política regressará ao seu significado clássico. Não com esta gentalha. Ninguém parece interessado, nem sequer capaz, de reflectir no problema. Ninguém, quero dizer: a dúzia e meia de pessoas sérias e competentes, que ainda existem, apesar de, às vezes, enxovalhadas pela infâmia.
Que esperamos e que nos espera? Não auguro nada de bom para Portugal. Basta olhar em volta, andar pelo País, viajar pelo interior, falar com as pessoas, ouvi-las sobretudo, para rapidamente compreendermos que há uma tarefa hercúlea a realizar. Mas, depois, surge o desalento, o desânimo, o desencanto. Sempre e para sempre?
b.bastos@netcabo.pt
Não lhes gabo, a nenhum deles, o gosto e a indiscrição. Conheço alguns, de ambos os lados. Não estão muito hipotecados à inteligência e a cabeça de três ou quatro chega, mesmo, a riscar o diamante.
Se for descoberto o mais escasso fio, o mais pequenino botão, quem os lá colocou terá de ser punido com a gravidade que o crime exige e justifica. E se ocorrer o contrário? Se a notícia não é notícia (com perdão da palavra) e se for uma qualquer tranquibérnia urdida por espírito maligno, então, lei em cima do autor. O dr. Cavaco não pode, em nome da verdade (tão apregoada pelo partido a que pertence) passar ao lado do assunto, como cão por vinha vindimada, que se nos desculpe a analogia. Que fazer? Despedir o eng.º Sócrates, em caso de culpabilidade dos seus desastrados e levianos assessores? E que tem o eng.º Sócrates a ver com as eventuais leviandades dos seus assessores?
Responsabilizar, somente, os prevaricadores, atirá-los para a masmorra, e escarmentá-los publicamente? E se se der a inversa? Como punir os delinquentes? Este penoso problema está repleto de pontos de interrogação.
Até à hora a que escrevo, nada de novo foi acrescentado à grave informação inicial. Ouvi e vi, nas rádios e nas televisões, um chorudo grupo de comentadores, discreteando sobre. É um divertimento estimulante escutar esta gente. Habitualmente estão completamente impreparados e dizem disparates dos mais risíveis. Nos intervalos do habitualmente, são autênticos imbecis, que nada sabem, que nada arriscam, que não espevitam a interesse de quem os atende. Há dias, um director de jornal dizia-me: "Estes tipos são tão maus que você nem acredita. Não sabem nem curam de saber."
Enquanto andamos nesta montanha russa de folclore de estação, os dois putativos candidatos a primeiro-ministro dizem, um dos outro (ou uma do outro) o que Mafoma não disse do toucinho. O nível geral do discurso político quase desceu à altura da sarjeta. Não se sabe o que a dr.ª Manuela deseja para o País, apesar dos patéticos esforços do Pacheco Pereira. E, pior!, quando ela fala o tolejo é pungente. Lá vem o pobre Pacheco (como Eduardo Prado Coelho o chamava) tentar que façamos outras interpretações. Estas cenas atingem os termos da ópera-bufa, com um contra-regra que nos quer sujeitar a uma realidade inexistente. Se eu estivesse propenso a dar o meu voto à líder do PSD, bastava ouvi-la uma só vez para fugir espavorido. Nada tenho de pessoal contra a senhora. Em boa verdade, também nada tenho, politicamente, contra ela. Porque a não conheço e porque ela, politicamente, é nada.
Manuela Ferreira Leite é um dos mais graves sintomas da pandemia de mediocridade que, desde há anos, se instalou e alastrou pelo País. Teve, e tem, como modelo o dr. Cavaco, cuja nefasta presença, em dez anos como primeiro-ministro, ainda não foi seriamente analisada. Um jornalismo acrítico e uma legião de estipendiados construíram um território de equívocos, de mentiras e de fraudes que transformaram o banal homem de Boliqueime num génio imaculado. A banalidade do senhor é constantemente provada. Banalidade e carência de subtileza. Esperemos que, neste caso das "escutas", ele se não imiscua. É manifesto que se trata de uma "borbulha" eleitoral, criticável, evidentemente, pela sua natureza escabrosa, mas que se vai tornando comum nestes períodos. Mais grave é quando a honra de pessoas e de instituições é atingida. E tudo se passa sem nenhum esclarecimento e com a mais perfeita impunidade.
Não sei, ninguém sabe, como é que e quando é que a política regressará ao seu significado clássico. Não com esta gentalha. Ninguém parece interessado, nem sequer capaz, de reflectir no problema. Ninguém, quero dizer: a dúzia e meia de pessoas sérias e competentes, que ainda existem, apesar de, às vezes, enxovalhadas pela infâmia.
Que esperamos e que nos espera? Não auguro nada de bom para Portugal. Basta olhar em volta, andar pelo País, viajar pelo interior, falar com as pessoas, ouvi-las sobretudo, para rapidamente compreendermos que há uma tarefa hercúlea a realizar. Mas, depois, surge o desalento, o desânimo, o desencanto. Sempre e para sempre?
b.bastos@netcabo.pt
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