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Dois congressos

O que ocorreu no congresso do CDS tem curiosas semelhanças com o desfecho do congresso do PSD. E, em ambos, o aventureirismo populista foi, se não definitivamente removido, pelo menos imediatamente afastado.

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O conclave do CDS suprimiu o PP do acrónimo composto e, ao mesmo tempo, aplicou uma nova derrota a Paulo Portas, elegendo José Ribeiro e Castro e remetendo Telmo Correia para os fojos. No do PSD, que deu a vitória a Marques Mendes, infligindo uma derrota a Luís Filipe Meneses, também a abreviatura PPD deixou de se ouvir, enquanto Santana Lopes, guru do autarca de Gaia, era rapidamente apagado da pauta.

Há um significado político nos resultados de ambas as assembleias. Reconheceu-se que tanto Santana quanto Portas haviam exorbitado os caracteres originais dos respectivos partidos. Isto, por um lado. Por outro, os delegados chegaram à amarga conclusão de que, nos dois líderes, evolava algo de infantil, com manifesto agravo do próprio projecto da Direita, mesmo nas suas subtis transformações.

A estratégia de Paulo Portas, descritiva e exótica, comportava uma pura ambição de poder. Não creio que o objectivo dele tenha sido a dissolução do PSD, para a criação de um grande partido (de estilo poujadista). Falta-lhe densidade ideológica, sobra-lhe a esquizofrenia do mando. Além do que o PSD não corresponde, na sua génese, a um inventário de solicitações. E muitos daqueles que se reclamam da herança de Sá Carneiro nunca o leram, jamais foram a transmissão de uma certa atitude, não possuem nenhuma relação filosófica, intelectual, política com ele. José Pacheco Pereira tem esclarecido os imbróglios deliberadamente tecidos por esses antropólogos da política.

Pedro Santana Lopes é a euforia comunicacional que pouco sabe e muito diz. Desconhece a tradicional distinção entre o próximo e o longínquo, e presumiu estar integrado numa pluralidade em movimento. A Imprensa possui largas culpas da ascensão do ídolo. Raras vezes o questionou, servindo-se da profundidade exigida pelo sentido pedagógico da sua missão. Deixou-o ir até certo ponto. Depois, desancou-o, utilizando a mesma futilidade adjectiva com que o mimara. A seguir, foram os «amigos» que o enxotaram, abjurando das razões de solidariedade tantas vezes apregoadas para justificar certos postos, funções, sinecuras e estipêndios por ele generosamente atribuídos.

Há, neste assunto, algo de obsceno. Talvez ele tenha, finalmente, percebido que não dispõe de muitos amigos, mas sim de instantes de amizade - desde que esteja no poder. E os ajustes de contas, as omissões, os afastamentos aí estão, agora que ele apenas «anda por aí». Mas é estranho não ter previsto as consequências desse novo paradigma das relações humanas. Porque, há anos, cunhou uma frase implacável e definitiva: «Em política não há gratidão».

Os caminhos transversais pelos quais o PSD e o CDS vão percorrer as suas particulares solicitudes ideológicas não significa que deixem de ser o que são. Quer dizer que procuram voltar ao que eram, o que quer que, rigorosa e realmente, tenham sido. Claro que ambos os partidos formam uma comunidade de excepções. Porém, nunca excluíram uma certa reciprocidade de desígnio. Aqui, há mesmo igualdade na diferença.

O impulso natural das coisas implica a constância de se compreender as mutações da História. E os partidos tradicionais, à Direita e à Esquerda, parecem ancilosados num mal-entendido, promovido pelos seus programas e pelas suas acções, invariáveis há trinta e um anos - melhor: pela ausência de propostas, correlativas com as urgências do tempo. Ou, para me servir de uma definição sartreana: correspondentes às contingências e às necessidades da época na qual vivemos.


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