Opinião
As estratégias menores que nos assolam
Se os responsáveis políticos se enganarem em relação ao que é essencial para o país, a nossa posição relativa perante os outros vai caracterizar-se por um cada vez maior atraso.
O nível futebolístico dos países parece estar na razão inversa do seu desenvolvimento económico e social. A final do Euro 2004 deu-se entre Portugal e a Grécia, precisamente os dois países mais atrasados da União Europeia dos antigos 15 membros. Aliás, Portugal tem, desde há dois anos, razões para ter ganho à Grécia, já que ela nos ultrapassou em alguns indicadores?, à tangente?, mas o suficiente para ganhar!
Azares do futebol ou desvios na tradução desportiva de realidades económicas, o certo é que, durante o campeonato, o país foi tomado por uma exaltação patriótica e o futebol e a organização do Euro convertido numa espécie de estratégia nacional.
A ideia mais genérica que se atribui a uma estratégia é que ela trata do que é essencial. Quando há desconhecimento ou dúvidas sobre o essencial, uma certeza podemos avançar: não há estratégia. Logo, se os responsáveis políticos se enganarem em relação ao que é essencial para o país, a nossa posição relativa perante os outros vai caracterizar-se por um cada vez maior atraso, como tem vindo a acontecer.
Ganhar o Euro 2004 seria, portanto, um orgulho relativo no campo futebolístico, sem dúvida, mas não no civilizacional que prestigiasse o país. Tendo-se dito que os jogadores portugueses auferiam 40 mil contos cada um, de prémio, se ganhassem a final e que, como se ficaram pelas meias finais só (?) ganharam 30 mil e que os jogadores suecos não auferiam importância alguma, independentemente das vitórias que conseguissem, temos que concordar que andamos a brincar com princípios essenciais, estruturantes da nossa comunidade. E, se pensarmos que os seleccionados futebolistas portugueses foram condecorados pelo Presidente da República, comovido até às lágrimas?, temos que concordar, como diria o General De Gaule, «c’est pas un pays serieux». O que comoveu o nosso Presidente não foram as caras dos rapazes da selecção, entre o divertido e o espantado, alguns, titulares de activos financeiros que os colocam na convivência de banqueiros. O Presidente comoveu-se pela sua própria ideia de que o feito futebolístico poderia estimular o nosso povo a fazer mais do que já faz para sairmos do nosso atraso. Puro engano. A lição está dada, pelos suecos!
A motivação por sentimentos que apelam ao patriotismo tem regras. Com o apoio nacional que foi dado à selecção, é forçoso partir do princípio de que a nossa selecção não jogaria menos bem se fosse remunerada «à sueca».
O próximo campeonato europeu será organizado pela Áustria e a Suíça, em conjunto. O anterior ao nosso foi pela Holanda e pela Bélgica. Acresce às nossas dificuldades, de dimensão estratégica, o facto de Portugal e Espanha não se entenderem para o mesmo efeito (e para outros) e, terem sido concorrentes. É uma pena que a individualidade nacional de Portugal na península seja ainda considerada como uma ‘amputação estratégica’ pelo país vizinho. Não deveríamos ter entrado nesta competição, mas, antes, proposto uma organização conjunta. Para ganhar à Espanha tivemos de passar a ser o país com mais lugares sentados em estádios de futebol «per capita».
Na actual situação económica do país, a estratégia definida de trazer o Euro a todo o custo – dez estádios – foi errada. Seria preferível iniciar os esforços que o futuro nos deixa antever, de forçar o centralismo madrileno a aprender a conviver com independências, separações, autonomias que a História fez ao longo do tempo. A situação de equilíbrio estratégico só se atinge com a adopção das opções de maior consenso político, no princípio de que todos os sentimentos de todos os povos, de respeito por si e pelos outros, são respeitáveis.
A característica de país grande, da Espanha, não tem o direito de forçar um país pequeno, como Portugal, a esforços desmedidos para vir a organizar um qualquer campeonato desportivo, europeu ou mundial.
Em nome daquele equilíbrio, caberia tanto à Espanha como a Portugal proporem e aceitarem parcerias nas áreas em que o factor dimensão deixa Portugal de fora. Ou, temos que perguntar porque é que as associações deste género acontecem na Europa saxónica, protestante, da manteiga, do norte e não acontecem na latina, católica, do azeite, do sul e menos desenvolvida?