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Rui Cruz 20 de Agosto de 2007 às 13:59

As comunicações em Países em Desenvolvimento

No mercado Europeu estamos habituados a um nível elevado de sofisticação nas comunicações móveis, o que dificulta a compreensão de realidades diárias, onde isso não se verifica.

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Por motivos profissionais viajo bastante por países em desenvolvimento. Países onde as condições sociais e económicas são muito inferiores ao que estamos habituados. Arrisco mesmo dizer que pessoas que afirmam que Portugal é um país do terceiro mundo não sabem, efectivamente, o que é um país do terceiro mundo.

A dimensão do país é um factor importante no potencial de mercado das comunicações móveis. No entanto, outros factores são igualmente importantes, como por exemplo, o facto de um mercado ser muito pouco explorado, o que quer dizer que o mercado tem muito potencial de expansão, e em contrapartida, o nível de sofisticação é muito reduzido. São mercados com muita população, mas com taxas de penetração de comunicações móveis relativamente baixas. Certamente, muito abaixo ao que estamos habituados na Europa, bem como o orçamento familiar para telecomunicações ser também muito reduzido.

Questões como fraude, garantia de receita ou qualidade de serviço assolam todos os operadores nessas regiões, independentemente do nível de apoio internacional que gozem, na forma de grupos de telecomunicações. Dadas as dificuldades geográficas e os níveis de desenvolvimento, há questões que não se colocarão na Europa, como a capacidade de terem roaming interno.

Se as taxas de penetração são ainda reduzidas, se bem que com bons níveis de expansão, e se os orçamentos para comunicações são muito baixos, que expectativas haverá para aplicações móveis, tal como software de produtividade, ou integrações wireless?

Viajar nestes países é um pouco como voltar atrás no tempo, em termos de comunicações. Em termos de aparelhos, o nível de sofisticação é praticamente idêntico à Europa, se não mais sofisticado, porque o aparelho é visto como um acessório de status. No entanto, em termos de serviços, opções como o 3G, por exemplo, são ainda relativamente recentes, ou mesmo inexistentes.

Esta dualidade provoca um efeito interessante. Se é verdade que estão um pouco mais atrasados em termos de desenvolvimento, é verdade também que os serviços são implementados numa altura de maturação completamente diferente. As soluções já foram testadas em mercados mais sofisticados, já foram limadas todas as arestas. Os operadores partem de uma vantagem em termos tecnológicos, e mesmo de negócio, bastante grande em termos dos seus congéneres europeus, em princípio, mais sofisticados.

Outro facto interessante é que, em países onde era difícil arranjar um telefone fixo e uma linha telefónica (podia efectivamente demorar anos), há agora uma proliferação viral de telefones celulares. O negócio de distribuição dos telefones móveis, aliado às menores restrições técnicas das redes celulares, permite um melhor acesso a populações que, anteriormente, não teriam possibilidade física de aceder a telecomunicações de última geração.

Dado que não há necessidade de colocar fisicamente linhas telefónicas até à casa das pessoas, as comunicações móveis são um importante factor de desenvolvimento em áreas geográficas, que até há bem pouco tempo, estariam completamente cortadas do resto do mundo. Precisamente por essa razão, o acesso à Internet móvel pode ser um dos factores que leve à proliferação de serviços.

No entanto, nem tudo são boas notícias. A maioria do tráfego, e dos clientes, nesses países, são pré pagos. Factores como a total incapacidade de fazer boa cobrança das facturas e pouca, ou nenhuma, protecção legal dos operadores, leva a que muito poucos clientes tenham a opção de ter um plano tarifário com assinatura, estando este acessível apenas a pessoas muito bem colocadas em organizações governamentais, ou pessoas de muitas posses. Como exemplo, nalguns países do Norte de África, o cliente tem de ter vários cartões de crédito para ser elegível para um plano tarifário pós pago.

A questão dos preços das comunicações é muito sensível nesses mercados. O preço das comunicações é um dos factores mais substanciais na decisão de mudança de operador, pelo que aplicações que envolvam transmissão de dados - mais onerosas do que as chamadas de voz, ou SMS – são relegadas mais por uma questão de custos, do que por outra razão mais tecnológica.

Soluções como o SMS, de longe o meio de comunicação mais utilizado, quer por uma questão de simplicidade, quer por uma questão de preço, são as mais divulgadas. Qualquer taxista tem um telefone móvel, cujo número dispensa com facilidade, para potenciar mais negócio. Este modelo do telefone móvel até permite algumas inovações, como ter uma conta corrente aberta num taxi que acabámos de apanhar, pela primeira vez, com facturação diária, em oposição a pagar de cada vez que se viaja.

É um mercado com umas dualidades interessantes, mas que não representam, necessariamente, limitações. Os problemas são resolvidos à luz de paradigmas diferentes, mas são mercados extremamente interessantes e dinâmicos, onde a penetração das soluções tecnológicas mais avançadas são representativas de um mercado mesmo à beira de explodir.

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