Opinião
Adeus a C.K. Prahalad
No passado dia 16 de Abril faleceu Coimbatore Krishnarao Prahalad. A notícia não deu origem a mais que uma ou outra nota de rodapé na imprensa económica. O que é manifestamente injusto e revela que a espuma dos dias se sobrepõe àquilo que importa...
No passado dia 16 de Abril faleceu Coimbatore Krishnarao Prahalad. A notícia não deu origem a mais que uma ou outra nota de rodapé na imprensa económica. O que é manifestamente injusto e revela que a espuma dos dias se sobrepõe àquilo que importa, nomeadamente a notícia da partida de uma importante figura do mundo das ideias. Permito-me sublinhar esta palavra: ideias. Prahalad era mais que um pensador da gestão e da empresa - o que, salvo melhor opinião, já não seria pouco. Ele foi, na verdade, um homem com ideias para um mundo melhor.
C.K. nasceu a 8 de Agosto de 1941, no estado de Tamil Nadu, Índia. Estudou física na Universidade de Madras e doutorou-se em Harvard. Estabeleceu-se como professor da Universidade de Michigan. Começou a ser notado graças ao trabalho que publicou sobre a importância para uma empresa de identificar, cultivar e utilizar as suas "core competences", aquilo em que ela se notabiliza e distingue dos concorrentes. O livro que o celebrizou foi "Competing for the future", escrito conjuntamente com Gary Hamel e publicado em 1996. Não ficou agarrado à teoria das competências nucleares, antes tendo partido para a exploração de outras ideias. Por exemplo, a noção de co-criação, que se refere à necessidade de proximidade entre as empresas que produzem e os consumidores que utilizam os seus produtos.
A importância de parcerias generativas encontra-se também no seu trabalho sobre a necessidade de aproximar empresas e ONG, tema no qual ecoa aquele que porventura constitui o seu maior legado para a humanidade: a ideia da base da pirâmide. Com a publicação, em 2005, do livro "Fortune at the Bottom of the Pyramid", Prahalad trouxe para o cerne do debate gestionário as populações pobres, apresentadas como um mercado potencialmente interessante desde que abordado da forma correcta - "se o empreendedorismo for praticado correctamente, o empreendedorismo social não importará assim tanto", defendeu. As empresas mais atentas a este mercado começaram a explorá-lo, por vezes em parceria com ONG com forte conhecimento das especificidades locais. A re-imaginação de produtos, mercados e negócios é uma possibilidade trazida pela ideia de que é possível melhorar a condição humana com a economia de mercado. Esta ideia, profundamente humanista, foi inicialmente acolhida com desconfiança.
Tratava-se, afinal, de algo heterodoxo para uma disciplina habituada a entender os consumidores como aqueles que têm poder de compra suficiente para adquirir aquilo que as empresas produzem. Prahalad colocou a questão ao contrário: como podem as empresas ajudar a resolver os problemas das pessoas que têm muito pouco dinheiro? Em vez de simplesmente as ignorar, o desafio consiste em identificar formas de desenhar organizações e negócios que permitam corresponder às necessidades dos mais pobres de uma forma compensadora quer para eles, quer para as empresas que os decidiram servir. O resultado desta lógica, observada de perto, encontra expressão em exemplos conhecidos, como o do Banco Grameen, de Muhammed Yunus, da Aravind Eye Clinic, uma organização que usa os lucros para resolver problemas sociais, e muitos outros, incluindo o de multinacionais poderosas como a HP ou a Unilever.
A dificuldade que teve para publicar sobre um tema que hoje é sexy mostra como podemos colectivamente ignorar o óbvio. A sensibilidade de um indiano para o problema da pobreza endémica, e a sua capacidade para o formular com uma escrita fulgurante, mostram como o pensamento de gestão pode ser uma arma para criar um mundo melhor. A partir de agora vai deixar de haver mais livros e artigos de C.K. Prahalad. Sentiremos a sua falta.
C.K. Prahalad. Uma biblioteca básica:
Prahalad, C.K. & Hamel, G. (1996). "Competing for the future". Boston, MA: Harvard Business School Press.
Prahalad, C.K. & Ramaswamy, V. (2004). "The future of competition: Co-creating unique value with customers". Boston, MA: Harvard Business School Press.
Prahalad, C.K. (2005). "The fortune at the end of the pyramid. Eradicating poverty through profits". Philadelphia, PA: Wharton School Publishing.
Prahalad, C.K & Krishnan, M.S. (2008). "The new age of innovation". New Delhi: Tata/McGraw-Hill.
Professor catedrático, Faculdade de Economia, Universidade Nova de Lisboa
Assina esta coluna mensalmente, à sexta-feira
C.K. nasceu a 8 de Agosto de 1941, no estado de Tamil Nadu, Índia. Estudou física na Universidade de Madras e doutorou-se em Harvard. Estabeleceu-se como professor da Universidade de Michigan. Começou a ser notado graças ao trabalho que publicou sobre a importância para uma empresa de identificar, cultivar e utilizar as suas "core competences", aquilo em que ela se notabiliza e distingue dos concorrentes. O livro que o celebrizou foi "Competing for the future", escrito conjuntamente com Gary Hamel e publicado em 1996. Não ficou agarrado à teoria das competências nucleares, antes tendo partido para a exploração de outras ideias. Por exemplo, a noção de co-criação, que se refere à necessidade de proximidade entre as empresas que produzem e os consumidores que utilizam os seus produtos.
Tratava-se, afinal, de algo heterodoxo para uma disciplina habituada a entender os consumidores como aqueles que têm poder de compra suficiente para adquirir aquilo que as empresas produzem. Prahalad colocou a questão ao contrário: como podem as empresas ajudar a resolver os problemas das pessoas que têm muito pouco dinheiro? Em vez de simplesmente as ignorar, o desafio consiste em identificar formas de desenhar organizações e negócios que permitam corresponder às necessidades dos mais pobres de uma forma compensadora quer para eles, quer para as empresas que os decidiram servir. O resultado desta lógica, observada de perto, encontra expressão em exemplos conhecidos, como o do Banco Grameen, de Muhammed Yunus, da Aravind Eye Clinic, uma organização que usa os lucros para resolver problemas sociais, e muitos outros, incluindo o de multinacionais poderosas como a HP ou a Unilever.
A dificuldade que teve para publicar sobre um tema que hoje é sexy mostra como podemos colectivamente ignorar o óbvio. A sensibilidade de um indiano para o problema da pobreza endémica, e a sua capacidade para o formular com uma escrita fulgurante, mostram como o pensamento de gestão pode ser uma arma para criar um mundo melhor. A partir de agora vai deixar de haver mais livros e artigos de C.K. Prahalad. Sentiremos a sua falta.
C.K. Prahalad. Uma biblioteca básica:
Prahalad, C.K. & Hamel, G. (1996). "Competing for the future". Boston, MA: Harvard Business School Press.
Prahalad, C.K. & Ramaswamy, V. (2004). "The future of competition: Co-creating unique value with customers". Boston, MA: Harvard Business School Press.
Prahalad, C.K. (2005). "The fortune at the end of the pyramid. Eradicating poverty through profits". Philadelphia, PA: Wharton School Publishing.
Prahalad, C.K & Krishnan, M.S. (2008). "The new age of innovation". New Delhi: Tata/McGraw-Hill.
Professor catedrático, Faculdade de Economia, Universidade Nova de Lisboa
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