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A irrelevância empírica da Teoria dos Jogos

Actualmente, mesmo nos programas e livros texto destinados aos estudantes do primeiro ano, a esmagadora maioria dos autores inclui na parte destinada à exposição da concorrência imperfeita, em particular no capítulo que trata do oligopólio, algumas página

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A reincidência este ano em atribuir o prémio Nobel da Economia a este ramo do conhecimento, aparentemente legitima esta opção. No meu caso, sede há 20 anos que eliminei este tópico dos meus programas de Microeconomia.

A teoria dos jogos é um ramo da matemática, desenvolvido a partir da década de 40 do século XX. Esta teoria tem vindo a ganhar importância no meio académico, com aplicações a diversas áreas do conhecimento, como a Biologia, a Filosofia ou Ciência Política, entre outras. Mas a sua maior popularidade é, talvez, entre os cultores da Ciência Económica. Este facto é devido, em grande parte, ao papel desempenhado, não por um matemático, mas por um verdadeiro economista - Oskar Morgenstern - no lançamento, em 1944, dos fundamentos deste ramo do conhecimento.

Por esta razão, e por outras menos evidentes, entre as quais a inexistência de um prémio Nobel da Matemática - por razões assaz curiosas e algo picantes - o Banco da Suécia, instituição responsável pela atribuição do prémio Nobel da Economia, parece ter criado o hábito de premiar os cultores da Matemática, atribuindo-lhes, de vez em quando, este prémio.

A série de prémios destinados a consagrar a teoria dos jogos não foi inaugurada, como seria natural, começando por premiar os seus fundadores, com contribuições no longínquo ano de 1944, como já se fez noutras ocasiões em casos semelhantes. A série foi inaugurada em 1994 premiando uma equipa liderada pelo matemáticos John Nash.

Mas, por exemplo, no caso das contribuições para o estudo dos custos de transacção e dos direitos de propriedade, não houve dúvidas - e bem - em premiar Ronald Coase, em 1991, por um trabalho - The Nature of the Firm - por este elaborado 60 anos antes, quando tinha apenas 20 anos.

A popularidade da Teoria dos Jogos, na sua formulação recente, tem os seus fundamentos profundos. A sua natureza de teoria matemática possibilitou que fosse abraçada por uma enorme multidão de cientistas sociais de todas as tendências ideológicas, merecendo um amplo - embora não completo nem definitivo - consenso, permitido pelo seu aparente aspecto de teoria asséptica.

prémio deste ano contempla duas personalidades diferentes. Robert Aumann é um matemático, enquanto Thomas Scheelling é um verdadeiro economista, cujos trabalhos não oferecem dúvidas, enquadrando-se no campo próprio á ciência económica. Este aspecto foi, implicitamente, muito sublinhado nos artigos laudatórios que proliferaram na imprensa nacional e internacional, os quais procuraram mostrar a relevância, para a economia real, da Teoria dos Jogos. Alguns começam a deixar de ter esta percepção.

 O próprio Thomas Scheelling publicou um artigo, na passada segunda feira, dia 24 de Outubro, no The Wall Street Journal, intitulado «Podem os terroristas ser detidos ?», onde em vez da linguagem impenetrável para os não iniciados na teoria dos jogos, procurou reflectir sobre um problema dos nossos dias à luz da teoria que lhe valeu o Nobel. Esta não é uma preocupação nova em Scheelling.

É bem conhecido no meio o papel importante deste Nobel - contanto com generosa disponibilidade de meios - na formulação da estratégia militar americana, nomeadamente na condução da Guerra do Vietnam. Este facto contribuiu em grande parte - devido aos conhecidos e trágicos resultados daquela guerra - para o avolumar das dúvidas sobre a qualidade das previsões empíricas possibilitados pela Teoria dos Jogos.

 O novo investimento nesta teoria, que Scheelling parece querer voltar a fazer - embora agora apenas no papel de articulista de jornal - mostra que os defensores da teoria dos jogos estão inquietos com as dúvidas que alguns, porém ainda poucos, começam a ter. Essas dúvidas avolumam-se, quando se nos recordamos das razões pelas quais o Banco da Suécia - dessa vez sabiamente - justificou em 2002 o prémio Nobel da Economia, então atribuído a Kahneman:

- «Mostrou que as pessoas são incapazes de analisar situações complexas quando as consequências futuras são incertas.»;

- «Frequentemente, os decisores na vida real não avaliam os acontecimentos incertos de acordo com as leis das probabilidades; nem tomam decisões de acordo com a teoria da maximização da utilidade esperada».

Estas palavras, que justificaram a atribuição do prémio Nobel da Economia aos laureados em 2002, poderiam servir para mostrar a racionalidade de uma hipotética recusa em premiar os vencedores do prémio Nobel da Economia em 1994 e em 2005.

A Teoria dos Jogos, que se tem vindo a sofisticar desde os anos 40 do século XX, não ganhou relevância para análise dos problemas reais da economia e da sociedade. As suas previsões não têm sido empiricamente sustentáveis. Os seus modelos geram equilíbrios múltiplos, logo predições empíricas difusas.

Não posso apoiar a inclusão desta abordagem nos programas e nos manuais de Microeconomia, sobretudo quando visam estudantes do primeiro ano, ávidos para entender a relevância da teoria económica. É certo que a escolha dos conteúdos para o capítulo que a borda as estruturas dos mercados oligopolísticos será sempre muito polémica. Mas, nas muitas alternativas aceitáveis não cabe, no meu critério, a teoria que agora o Banco da Suécia reincidiu em nobelizar.

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