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Armindo Monteiro amonteiro@anje.pt 29 de Janeiro de 2008 às 13:59

A hora do investimento privado

O novo ano arranca com o horizonte carregado de nuvens negras. Neste início de 2008 avolumam-se os sinais de mau tempo na economia mundial, não se esperando que Portugal escape incólume à intempérie. Uma economia aberta como a nossa é bastante vulnerável

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De facto, não são um bom augúrio para 2008 as previsões que apontam para uma possível recessão nos EUA, para o aumento do preço do dinheiro, para a contínua depreciação do dólar face ao euro, para o abrandamento do crescimento económico nos principais países europeus, para a escalada do preço do petróleo, para a instabilidade do mercado bolsista e para as restrições na concessão de crédito a privados.

Perante tudo isto, e em particular a potencial recessão norte-americana, o Banco de Portugal já anunciou poder vir a rever em baixa as previsões de crescimento da economia portuguesa. Relembro que o Boletim Económico de Inverno do Banco de Portugal, divulgado a 8 de Janeiro, previa que o nosso país crescesse 2% em 2008 e 2,3% em 2009. Ora, estes valores eram já à partida insuficientes para provocar o salto de que a economia portuguesa necessita para ganhar competitividade face ao exterior, impulsionar o investimento privado, criar postos de trabalho e aumentar o rendimento disponível dos particulares. Logo, se a fasquia dos 2% não for atingida, o cenário será certamente ainda mais sombrio?

Como lhe compete, o Governo procura desvalorizar as profecias das “cassandras” de serviço e passar a ideia de que a economia portuguesa apresenta hoje uma solidez que lhe permite resistir aos ventos fortes do exterior, sem sequer se constipar. Não se esperaria, aliás, outro tipo de discurso do Executivo, embora saibamos que a margem de manobra governamental é reduzida. O Governo não controla a política cambial e de controlo inflacionista, cuja responsabilidade é do Banco Central Europeu, e a sua actuação económica e financeira está bastante condicionada pela necessidade de sanear as contas públicas, nomeadamente o valor do défice. O Executivo de José Sócrates parece, por isso, justificar a sua confiança em matéria económica num hipotético crescimento de 4% do investimento privado, conforme está, aliás, plasmado no Orçamento do Estado para 2008. Até porque o mesmo documento prevê uma desaceleração do crescimento das exportações, 6,7%, enquanto o Banco de Portugal, no já referido Boletim de Inverno, chega a estimar que as vendas ao exterior cresçam este ano apenas 4,9%! O que se compreende, dada a valorização do euro face ao dólar e ao abrandamento económico dos nossos principais parceiros comerciais, como a Espanha, a França, a Alemanha e os EUA.

Temos, portanto, uma aposta governamental no investimento privado como factor de compensação da redução do investimento público (défice orçamental “oblige”) e do menor crescimento das exportações. Para sustentar esta aposta estratégica no investimento privado, o Governo teve já, a meu ver, uma atitude bastante louvável: as candidaturas ao Programa Operacional Factores de Competitividade (POFC) foram as primeiras a arrancar. Isto significa que as primeiras verbas disponíveis do novo quadro comunitário destinam-se, em boa parte, aos sistemas de incentivo ao investimento nas empresas. Ou seja, em breve será possível avançar com apoios ao investimento produtivo de inovação, ao empreendedorismo, à I&DT e à utilização de factores imateriais de competitividade. Algo que, naturalmente, é motivo de regozijo.

A César o que é de César. Se muitas vezes critiquei o potencialmente “remodelável” Manuel Pinho, é justo agora saudar a sua actuação nesta questão. Tratou-se de mais uma intervenção meritória do Ministro da Economia, depois do êxito que conheceu, em 2007, a sua acção de desbloqueio de importantes verbas que o Estado tinha em dívida para com as empresas portuguesas. Justifica-se também uma referência ao valoroso contributo do gestor do POFC, Nelson de Souza, que certamente se fez valer da experiência adquirida na gestão do Prime. O pragmatismo imperou, então, no POFC e permitiu que este programa avançasse expeditamente. Por conseguinte, os Factores de Competitividade lograram contrariar o atraso generalizado na aplicação do QREN e chegaram mesmo a antecipar-se ao programa operacional apontado como prioritário: o Potencial Humano, que por si só concentra 37% das verbas (5,8 mil milhões de euros) consignadas no novo quadro comunitário.
 
Resta agora esperar que as candidaturas ao POFC correspondam às exigências e objectivos estratégicos deste programa. E se tal não vier a acontecer, impõe-se uma reflexão profunda sobre o actual estado do tecido empresarial português e a adopção de medidas políticas em conformidade com a análise feita, não sendo de afastar a hipótese de uma eventual reformulação do QREN no que diz respeito aos Factores de Competitividade. O investimento privado é demasiado importante para que se porfie, se for esse o caso, em regras desfasadas da realidade empresarial portuguesa. A ver vamos, portanto, o que o futuro nos reserva.

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