Opinião
A Gestão do Trabalho Temporário
Desde o final do ano de 2005, no rescaldo do 1º Congresso da Associação Portuguesa das Empresas de Trabalho Temporário e ainda com as palavras, na oportunidade, proferidas pelo ministro Vieira da Silva, ...
Desde o final do ano de 2005, no rescaldo do 1º Congresso da Associação Portuguesa das Empresas de Trabalho Temporário e ainda com as palavras, na oportunidade, proferidas pelo ministro Vieira da Silva, na memória, aguardava-se com expectativa o sentido das prometidas alterações à legislação respeitante ao trabalho temporário.
A Lei nº 19/2007, de 22 de Maio que aprovou o novo regime jurídico entrou em vigor a 21 de Junho de 2007 e revogou o Decreto-Lei nº 358/89, de 17 de Outubro, alterado pelas Leis nºs 39/96, de 31 de Agosto, 146/99, de 1 de Setembro e 99/2003, de 27 de Agosto.
Sem prejuízo de se proceder a uma detalhada análise sobre todas as alterações produzidas, que aqui e agora não cabe fazer, importa desde já referir que numa perspectiva de gestão a nova legislação defraudou a previsível evolução do correspondente entendimento e respectiva transposição legislativa.
Ou seja, o novo texto legislativo não acompanha a concepção do trabalho temporário e seu enquadramento, sem complexos, como instrumento de gestão.
E a questão é a de se saber se perdeu uma oportunidade de verter para a lei o entendimento do trabalho temporário como uma relação de trabalho flexível, mas não corrompida, ajustada às necessidades do mercado e capaz de potenciar crescimento de emprego nesta nossa economia competitiva e global.
Continua-se a tolerar o trabalho temporário (até porque não se esquece que em números estimados se diz que o sector vale entre 600 e 800 milhões de euros), reforça-se e bem o controlo e fiscalização da actividade das empresas de trabalho temporário, pugna-se, muito justamente, pela harmonização do regime do trabalho temporário com o do Código do Trabalho, com dignificação do trabalho temporário, mas em vez de se criar espaço legal para o seu desenvolvimento, mantém-se o condicionamento no que respeita às admissibilidades/prazos de contratação.
É importante prever e permitir, em acréscimo ao anteriormente regulamentado, a celebração de contrato de utilização (contrato de prestação de serviço a termo resolutivo entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga mediante retribuição, a ceder um ou mais trabalhadores temporários) em caso de “substituição directa ou indirecta de trabalhador em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude de despedimento”- alínea b) do nº1 do artº 18º da Lei nº 19/2007, de 22 de Maio.
Mas seguramente não é suficiente, bem como se regista receio e preconceito quanto à estipulação da duração, quando comparada com a do contrato a termo previsto no Código de Trabalho, dos contratos de utilização versus contrato de trabalho temporário (contrato de trabalho a termo certo celebrado entre uma empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a prestar temporariamente a sua actividade a utilizadores, mantendo o vínculo jurídico-laboral à empresa de trabalho temporário), na medida da excessiva cautela imposta: na moldura mais envolvente, até ao limite máximo de dois anos, mantendo-se a causa justificativa e com renovações incluídas - artºs 21º e 27º da Lei, sob apreciação.
E, tal ousadia de pensar, com enfoque na gestão das empresas, o actual e emergente fenómeno do trabalho temporário, enquanto modo de estruturar a organização, para além da constituição do núcleo central da mesma e como recurso para satisfação de necessidades de produção excedentárias não comportáveis na já permitida flexibilização funcional e temporal, é evidentemente compatível com os objectivos de seriedade e exigência exigíveis aos agentes deste específico mercado, nomeadamente as empresas de trabalho temporário.
O exercício da actividade da empresa de trabalho temporário (pessoa singular ou colectiva cuja actividade consiste na cedência temporária a utilizadores da actividade de trabalhadores que para esse efeito admite e retribui) passa a estar sujeito a emissão de licença que é concedida com base no preenchimento de requisitos de idoneidade, estrutura organizativa adequada, situação contributiva regularizada perante a administração tributária e segurança social, constituição de caução e denominação com designação “trabalho temporário”.
Relativamente ao texto legislativo fixado pela Lei nº 146/99, de 1 de Setembro, verifica-se a exigência, agora, de uma “ estrutura organizativa adequada” em vez de apenas “capacidade técnica para o exercício da actividade”, com caracterização do que tal significa:
- Existência de um director técnico contratado, com perfil e experiência, concretamente, definidos;
- Existência de instalações adequadas e devidamente equipadas ao exercício da actividade.
São, certamente por todos, aplaudidas estas medidas de eliminação de empresas de “vão de escada” que prejudicam o sector e comprometem o debate o sério sobre esta problemática do trabalho temporário; a presente legislação concede às empresas que já exercem actividade um prazo, até 19 de Setembro de 2007, para se adaptarem às novas disposições legais.
Do mesmo modo, defendem-se, justamente, os direitos dos trabalhadores temporários consagrando, em termos de execução de caução que, no caso da empresa de trabalho temporário faltar ao pagamento pontual das prestações pecuniárias devidas ao trabalhador, por período superior a quinze dias, devem as prestações em mora ser cumpridas através da referida caução - nº 1 do artº 7º, da Lei nº 19/2007.
E, justificadamente, no plano da garantia dos direitos do trabalhador temporário, não tanto se isso quiser significar menor comprometimento das entidades competentes no controlo e fiscalização da actividade das empresas de trabalho temporário, a celebração de contrato de utilização de trabalho temporário com empresa de trabalho temporário não licenciada responsabiliza solidariamente esta e o utilizador pelos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, bem como pelos encargos sociais correspondentes, relativos aos últimos três anos - nº 1 do artº 17º, da Lei nº 19/2007.
Bem como, também, é o utilizador subsidiariamente responsável pelo incumprimento por parte da empresa de trabalho temporário de créditos de trabalho temporário e ainda dos encargos sociais correspondentes ao ano subsequente ao início da prestação - nº 2 do artº 17º, da Lei nº 19/2007.
É, neste contexto de responsabilização, que se considera muito positivo e de louvar a recente notícia sobre a criação da figura do Provedor para o Trabalho Temporário pela Associação Portuguesa das Empresas do Sector Privado e Emprego (APESPE).
O “ombudsman” da tradição sueca, órgão independente, vai ter, nomeadamente, funções de análise de queixas de alegadas violações dos direitos dos trabalhadores temporários, com elaboração de recomendações e propostas de alteração de procedimentos dirigidas às empresas de trabalho temporário.
Merece, finalmente, destaque pelo alcance estratégico que encerra a competência que foi atribuída a este Provedor e que é: desenvolver um Observatório do Trabalho Temporário, com vista a melhorar o conhecimento público do sector e seu contributo para a criação de emprego e para a economia nacional.
A informação que este Observatório passará a disponibilizar será, de certeza, decisiva para o progressivo derrube da suspeição existente sobre o trabalho temporário e a melhor forma de afirmar este como verdadeira ferramenta de gestão.