Opinião
Um novo ciclo do capitalismo
Quem investiu no mercado de capitais e confiou nas informações existentes; quem não cometeu fraudes nem foi conivente com atos ilícitos; quem acreditou no que era dito sobre o Banco, tem de "assumir as suas responsabilidades"?
1. O presidente do Bundesbank, Jens Weidmann, afirmou esta quarta-feira que com o colapso do Banco Espírito Santo (BES) a Zona Euro demonstrou ter capacidade para tratar "rapidamente este tipo de problema, obrigando os investidores a assumirem as suas responsabilidades".
Estas declarações foram feitas a 13 de agosto de 2014. Não sei quantas semanas, quantos meses, quantos anos demorará até o autor destas declarações compreender o erro que está a cometer.
Os investidores foram obrigados a assumir as suas responsabilidades? Sem dúvida! Mas todos teriam responsabilidades? Os grandes, os médios e os pequenos investidores tinham todos a mesma responsabilidade? Quem investiu no mercado de capitais e confiou nas informações existentes; quem não cometeu fraudes nem foi conivente com atos ilícitos; quem acreditou no que era dito sobre o Banco, tem de "assumir as suas responsabilidades"? Mas havia alguma indicação nos balanços, nos prospetos, nos sites, nas declarações de responsáveis, que aconselhasse a não investir? Então quais são as responsabilidades dos investidores que nunca tiveram acesso à gestão, que não tiveram qualquer informação fidedigna que os levasse a vender? E mesmo que o tivessem tentado, certamente já não teriam conseguido fazê-lo tais as ordens de venda dos que estão sempre "mais bem colocados"?
2. De ora em diante, estou de acordo que só arrisca quem quer. O modelo de resgate constante desta diretiva europeia foi, como escrevi antes do anúncio da decisão, "estreado" em Portugal. E as eventuais consequências para quem investe em ações de instituições financeiras estão à vista e secamente traduzidas nas palavras do presidente do Bundesbank.
Enquanto as regras não forem mudadas, enquanto as auditorias não forem independentes dos auditados, enquanto as supervisões não tiverem mais poderes, é difícil para quem não tem acesso à gestão e aos seus instrumentos, estar seguro quanto ao seu investimento.
É evidente que nada na vida é absolutamente seguro e que, infelizmente, é com frequência que tempestades, tufões, incêndios, ciclones, em diferentes regiões do Mundo, destroem casas e haveres. Mas aí são forças da Natureza que a ação humana não pode controlar. Quando uma família fica sem as suas poupanças porque "uma lei" assim o determina em consequência de erros ou fraudes que desconhecia, é ainda mais difícil de aceitar. E quando, ainda por cima, se noticia que houve quem ganhasse muitos milhões ao mesmo tempo que outros perdiam o pouco que tinham, já não é só ser difícil de compreender, há mesmo um sentimento de revolta que se forma.
3. Esta orientação da diretiva traduz um caminho que, a manter-se, mudará o funcionamento da sociedade capitalista e das economias de mercado. Os mercados de capitais proporcionam formas de capitalização das empresas que são essenciais para o seu crescimento e, muitas vezes, para respetiva subsistência. Quando agora se pensa e se diz que aqueles que investem em empresas cotadas em bolsa têm de saber que podem perder tudo por um acontecimento imprevisto, sem que seja decretada falência, é uma página nova que se abre.
Na prática, estamos perante uma semi-insolvência ou uma insolvência parcial. Uns abrem falência, outros continuam. Quem paga impostos é protegido, quem investe é penalizado.
O presidente do Bundesbank estará já a trabalhar na edificação desta ordem nova? Que trabalhos e orientações já terá o BIS produzido sobre esta era nova?
As autoridades nacionais, com maiores ou menores dificuldades, aplicaram o que está em vigor. Por isso, o seu trabalho deve ser respeitado. Mas todos temos a obrigação de avaliar, em profundidade, as consequências deste novo ciclo da filosofia, da ideologia, dos princípios e valores do liberalismo e da economia social de mercado.
Advogado
Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.