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Luís Marques Mendes 16 de Abril de 2023 às 21:25

"Há uma possibilidade séria de eleições antecipadas entre o fim de 2024 e princípio de 2025"

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre o PSD, eleições antecipadas, crescimento económico e a vinda de Lula da Silva a Portugal, entre outros temas.

ASSÉDIO SEXUAL EM COIMBRA

 

  1. Primeiro apontamento: tudo isto é surpreendente. E absolutamente chocante e inaceitável. Com a agravante de tudo isto acontecer numa instituição que faz doutrina e pedagogia em torno da igualdade de género e dos direitos das mulheres.
  1. Segundo apontamento: claro que Boaventura Sousa Santos, como qualquer padre, no quadro dos abusos sexuais na Igreja, ou como qualquer outro cidadão, tem direito à presunção da sua inocência. Mas, quando temos não uma, mas várias denúncias, as acusações ganham outra solidez, consistência e credibilidade.
  1. Terceiro apontamento: é surreal que Boaventura Sousa Santos invoque que tudo isto sucede por causa do neoliberalismo. Talvez seja útil recordar-lhe que combater os abusos sexuais, seja na Igreja, nas Universidades, ou na sociedade em geral, não é uma questão de dialética entre direita e esquerda. É uma questão de lutar contra os abusos. Abusos de poder e de comportamentos. E de promover uma cultura de valores e de princípios. 
  2. Quarto apontamento: num manifesto vindo a público, diz-se que este caso não é a exceção. É a norma. Não sei se é assim ou não, mas, com os exemplos que vêm de fora, com o caso que já foi público na Faculdade de Direito de Lisboa, com outros casos em escolas ligadas á Opus Dei, e com mais este exemplo em Coimbra, talvez seja tempo de as instituições académicas criarem comissões independentes que garantam, pelo menos, o direito das vítimas à denúncia livre, sem constrangimentos e sem represálias. 

IVA 0 NO CABAZ ALIMENTAR

  1. Entra terça-feira em vigor a medida de redução do IVA em vários alimentos. Acredito que, apesar de muitas dúvidas, a medida vai na boa direção e pode dar resultados positivos.
  2. Para boa análise, importa ver onde estamos e o que é que os outros países têm feito.
  • Primeiro, o cabaz alimentar com 63 alimentos essenciais, elaborado pela DECO Proteste. Nas últimas duas semanas houve uma estabilização dos preços. Mesmo assim, o aumento em relação a fevereiro de 2022 (início da guerra) é de 23%. Este dado é relevante para as comparações futuras.
  • Segundo, como têm gerido esta situação os demais países da UE? Só cinco países, além de Portugal, reduziram o IVA (Bulgária, Espanha, Itália, Roménia e Polónia). E três outros (Croácia, Grécia e Hungria) impuseram uma limitação administrativa de preços. Os demais limitaram-se a medidas de apoio ao rendimento. 
  1. Sobre a redução do IVA em Espanha, medida que foi tomada há vários meses, há já um balanço feito pelo Banco de Espanha, que não é irrelevante:
  • Primeiro: segundo o Banco de Espanha, 90% da redução do IVA foi refletida nos preços dos consumidores;
  • Segundo: a redução do IVA teve um efeito de 0,2pp na inflação de janeiro. Sem a redução do IVA, a inflação teria sido mais alta.
  • Terceiro: antes da redução do IVA, a subida dos preços da alimentação estava ao nível da mádia europeia. Depois da redução, a subida foi mais pequena.

 

 

MENOS PIB E MAIS CARGA FISCAL

 

  1. O FMI divulgou esta semana as suas previsões do PIB nacional este ano (1%). Esta soma-se às previsões já apresentadas por várias outras entidades, externas e internas. Não há novidades substanciais:
  • As entidades externas (FMI, OCDE e CE) estimam crescimentos baixos (1%).
  • As entidades nacionais (Governo, Conselho de Finanças Públicas e BP) vão um pouco além, sendo que o BP é o que vai mais longe (1,8%).
  1. Claro que é sempre melhor crescer 1,8% que 1%. Mas, no essencial, é a mesma coisa. Continuaremos com um crescimento económico medíocre. Uma espécie de estagnação. Desta forma não teremos aumentos de salários dignos, melhorias justas de pensões e reforço do Estado Social.
  1. Na mesma semana, o INE divulgou que em 2022 tivemos um novo record na carga fiscal cobre o PIB: 36,4%. Desde 2010, com pequenas oscilações, a nossa carga fiscal está quase sempre a aumentar. Claro que uma carga fiscal elevada não é apenas o reflexo de impostos altos. Carga fiscal engloba impostos e contribuições sociais. Mas uma coisa é certa:
  • Com baixos crescimentos económicos e impostos altos, sobretudo no IRS, corremos o risco de continuar a ser o país dos salários médios de mil euros e das pensões médias de 500€. Isto não é futuro.
  • Precisamos de uma agenda política e económica diferente: centrada no objetivo de um crescimento económico robusto e num alívio da carga fiscal, em especial sobre a classe media, cada vez mais proletarizada.

 

PSD "CORTA" COM O CHEGA

  1. Durante meses critiquei o PSD por uma estratégia de ambiguidade em relação ao Chega. Agora, finalmente, Luís Montenegro agiu bem: "cortou" com o Chega, clarificando que não fará entendimentos com políticos "xenófobos, racistas, populistas, imaturos e irresponsáveis". A mensagem é suficientemente clara.
  1. É pena que o PSD tivesse demorado tanto tempo a clarificar a sua posição. Mas é bom que o tivesse feito. É bom para a democracia. A democracia agradece este sentido de responsabilidade. E é bom para o PSD:
  • Primeiro, acaba com um ruído que era prejudicial ao partido e que dificultava a passagem da sua mensagem.
  • Depois, abre-lhe espaço ao centro, dando condições ao PSD para "conquistar" eleitores moderados que estão desiludidos com o Governo, mas que dificilmente "passavam" para o PSD com o fantasma do Chega.
  • Finalmente, o PSD pode aspirar no futuro, com maior facilidade, a concentrar voto útil à direita. Tudo isto ajuda á construção de uma alternativa.
  1. Esta foi a grande mensagem da entrevista do líder do PSD. Mas não foi a única. Houve mais duas.
  • Uma, para dentro do PSD. Montenegro garantiu que não se demite, mesmo que perca eleições europeias. Um aviso para potenciais candidatos à liderança.
  • Outra, em relação ao Presidente da República. Montenegro foi correto e elegante com o Presidente da República. Mas fez questão de exercer a sua própria autoridade de líder da oposição, demarcando-se de afirmações do Presidente da República. É normal que assim seja. Cada qual tem o seu papel e a sua função.

 

ELEIÇÕES ANTECIPADAS EM 2024?

  1. Como eu próprio imaginei há uma semana, o Presidente da República afastou, e bem, a ideia de dissolução do Parlamento. Seria uma solução aventureira nos tempos que vivemos. Mas daqui não se pode presumir que a legislatura vá até 2026. Embora eu, pessoalmente, não o deseje, acho que há uma possibilidade séria de eleições antecipadas entre o fim de 2024 e princípio de 2025.
  • Primeiro, pelo aviso feito por Marcelo quando disse que uma maioria absoluta não é seguro de vida para uma legislatura. É um aviso sério.
  • Segundo, pela degradação da situação política e governativa. Esta degradação já hoje é grande. E tem tendência para se agravar. Se isso acontecer, a probabilidade de eleições antecipadas aumenta.
  1. Goste-se ou não, este cenário é bastante provável. Só não sucederá se o PS conseguir ganhar as eleições europeias. Não é fácil, mas também não é impossível. Para isso, a escolha dos cabeças-de-lista não é irrelevante.
  • No PSD, o nome mais provável é o de Rui Moreira, Presidente da Câmara Municipal do Porto, uma figura popular e de prestígio. No PS, a surpresa pode ser Marta Temido. Tem-se falado da ex-Ministra para candidata nas autárquicas em Lisboa. Mas a novidade pode ser vê-la como número um nas europeias. Ainda não há decisão final. Mas é muito provável. O nome está a ser equacionado, face à popularidade que a ex-Ministra adquiriu na pandemia e ao modo desprendido como saiu do governo.

 

LULA DA SILVA EM PORTUGAL

 

Sobre Lula da Silva e a polémica da sua vinda a Portugal, há três coisas a considerar:

  1. A importância da vitória de Lula sobre Bolsonaro nas eleições brasileiras. Goste-se ou não se gosta de Lula da Silva, a sua vitória foi muito importante para a democracia e para o reforço da decência na vida política. Os democratas devem estar-lhe gratos por isso.
  2. O momento em que Lula será recebido na AR. Eu preferia que a recepção no Parlamento português ocorresse num dia que não fosse o dia 25 de Abril. Era preferível que fosse antes ou depois da data da Revolução. Mas não considero que essa seja a questão política essencial.
  1. Essencial mesmo é refutar as declarações inaceitáveis que Lula da Silva fez esta semana, na China, criticando o apoio que a União Europeia e os EUA têm dado à Ucrânia. Eu espero que o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República ou o primeiro-ministro digam ao Presidente brasileiro, algumas coisas fundamentais:
  • Primeiro, que na guerra da Ucrânia há um agressor e um agredido. A obrigação de um democrata é condenar o agressor, que violou o direito internacional, e apoiar o agredido, vítima dessa violação.
  • Segundo, que, se não fosse o apoio político e militar da UE e dos EUA, a Ucrânia, a esta hora, já não era um Estado livre e independente, já não vivia em democracia e já tinha perdido a sua soberania.
  • Finalmente, que todos desejamos a paz. Mas a primeira condição para fazer a paz é condenar quem começou a guerra. O que o Brasil, tal como a China, ainda não fez.
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