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10 de Junho de 2018 às 21:42

Notas da semana de Marques Mendes

As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre a guerra entre o Governo e os professores, a tensão que se vive actualmente na geringonça, a proposta de matriz social-democrata apresentada por Rui Rio, entre outros temas.

  • ...

SELECÇÃO NO MUNDIAL

  1.       Somos um país de contrastes, também no futebol. Vejamos o exemplo desta semana:

a)      De um lado, o Sporting a viver, angustiado, a sua guerra civil; e o Benfica, envolvido em permanentes especulações sobre a transparência das suas intervenções;

b)      Do outro lado, a Selecção Nacional a trabalhar de forma discreta, sem qualquer ruído de fundo, e a partir para a Rússia num ambiente de tranquilidade.

  1.       Ser campeão europeu ajuda ou desajuda Portugal? Só no final poderemos ter uma resposta inequívoca. Em qualquer caso:

a)      Ser campeão europeu dá-nos mais visibilidade mas também nos dá mais responsabilidade. A margem de erro é muito menor, sob pena de perdermos na imagem e na credibilidade;

b)      Ser campeão europeu dá-nos mais prestígio mas também faz com que os adversários facilitem menos nos jogos que têm connosco. Os nossos adversários estarão mais focados e mais empenhados em derrotar o campeão europeu.

 

  1.       Em qualquer caso, esta é das poucas vezes em que os nossos argumentos não são apenas históricos e estatísticos. Temos argumentos fortes, actuais e verdadeiros: um seleccionador capaz e experiente; um atleta que é o melhor do mundo; vários jogadores que jogam nos melhores clubes do mundo; uma boa conciliação entre juventude e experiência; uma selecção melhor do que aquela que há dois anos venceu o Europeu.

 

A GUERRA COM OS PROFESSORES

 

  1.       Nunca se viu um dossier gerido de uma forma tão desastrosa como este. E a culpa é toda do Governo. Literalmente, o Governo é vítima de si próprio.

a)      Primeiro: vítima do seu discurso de facilidade. O discurso de que acabou a austeridade. O discurso das folgas. O discurso das reversões. Quando assim é, o resultado é previsível: semeiam-se facilidades e colhem-se dificuldades.

b)      Segundo: vítima de uma péssima gestão de expectativas. Em Novembro passado, o Governo fez um acordo com os Sindicatos. Criou-se na altura a expectativa de que todo o tempo de serviço seria recuperado. Que só faltava saber o ritmo da recuperação. Agora, criadas as expectativas, o Governo paga a factura.

c)      Terceiro: vítima do Ministro que tem na Educação. Este ministro é um erro de casting. Além de não ter qualquer peso político dentro do Governo, não acerta uma. No início deste processo, o ano passado, foi imprudente ao colocar-se totalmente ao lado dos professores. Agora, foi arrogante ao admitir retirar a proposta que o Governo fez. Um desastre.

 

  1.       O que vai suceder? Nenhuma solução é boa. É escolher entre o mal maior e o mal menor.

a)      Se o Governo cede na totalidade, está perdido – perde o respeito do país e perde o controle das contas públicas. A proposta dos Sindicatos é imoral;

b)      Se o Governo cede em parte, perde menos mas também perde – perde credibilidade e cria um precedente para outras classes profissionais. Abre uma caixa de Pandora.

c)      Se não cede, vai pagar um preço pesado nas eleições – este é daqueles assuntos que geram perda de votos. Chegar às eleições em conflito com os professores é desistir de qualquer ideia de maioria absoluta.

 

  1.       A carreira dos professores – Rever ou não?

a)      Está na moda criticar os professores, porque têm uma carreira altamente facilitista; também acho que é incorrecto o regime de progressões automáticas na carreira;

b)      Mas a culpa não é dos professores. É dos vários governos que criaram ou mantiveram este estatuto.

c)      Um dia este estatuto há-de mudar. E quanto mais tarde pior. Mas a solução mais correcta é aprovar um novo estatuto, já sem progressões automáticas na carreira, aplicando-o aos novos professores que entram na carreira pela primeira vez.

d)      Ter dois regimes pode não ser a solução ideal. Mas é a solução possível, até por razões constitucionais. E hoje já tem um precedente. Na função pública também há dois regimes laborais, o regime do contrato individual de trabalho e o regime da função pública.

 

 

A TENSÃO NA GERINGONÇA

 

  1.       Voltou em força a tensão ao seio da geringonça. Nunca as relações dentro da coligação foram tão tensas. Quatro razões explicam isto:

a)      Primeira: a proximidade das eleições. Com eleições à vista, o agravamento da tensão é inevitável. Sobretudo da parte do PCP que tem o receio de repetir nas legislativas de 2019 o pesadelo que teve nas autárquicas do ano passado.

b)      Segunda: a tentação do PS de obter uma maioria absoluta. A partir do momento em que o PCP e o BE perceberam que esta é a nova estratégia do PS, quebrou-se o verniz. Porque a ideia de maioria absoluta é uma ideia incendiária para os apoiantes do Governo.

c)      Terceira: a nova liderança do PSD. Eu sempre disse que Passos Coelho era o grande cimento da geringonça. E que, quando não houvesse Passos Coelho, a solidez da coligação não seria a mesma. Os resultados aí estão. A boa relação de Rio com Costa é um fantasma dentro da coligação.

d)      Quarta: a ideia de Bloco Central. Já se percebeu que, não tendo a maioria absoluta, a solução que Costa intimamente prefere é uma coligação com o PSD de Rui Rio. E que provavelmente Rio pretende o mesmo para se aguentar na liderança. Ora, estas tentações são fatais para a geringonça. PCP e BE sentem-se como "maridos enganados".

 

  1.       As presidenciais de 2026
  •          Por incrível que pareça, o que pode influenciar a escolha da próxima solução governativa são as eleições presidenciais de 2026.
  •          Nessas eleições, em 2026, já não haverá  Marcelo Rebelo de Sousa. Abre-se, pois, um novo ciclo.
  •          E aqui, de duas, uma: ou António Costa, depois de 2 mandatos como PM, quer ser candidato presidencial ou não quer. Se quiser ser candidato presidencial, vai provavelmente preferir manter uma solução preferencial com o PCP e o BE. Justamente porque será com o apoio destes partidos que poderá chegar a Belém. Se não quiser ser candidato presidencial em 2026, então António Costa pode preferir uma solução de Bloco Central. Sentir-se-á mais à vontade.

 

CRISE NO ORÇAMENTO?

 

  1.       Para além do problema dos professores, a geringonça vai ter nos próximos tempos, ainda antes do Orçamento, dois outros pontos de tensão política: as alterações às leis laborais (que o PCP contesta e o PSD deve viabilizar) e a aprovação da nova Lei de Base da Saúde, cujos projectos do Governo e do BE irão ser bastante diferentes.

 

  1.       Mesmo assim, e apesar deste ambiente de tensão, julgo que o Orçamento será aprovado pelo PCP e BE e que não haverá crise política. Por uma razão muito simples: o PCP quer um PS fraco, mas não quer um PS a fazer-se de vítima.
  •          Ninguém tem dúvidas de que, se pudesse, o PS antecipava as eleições. Dava-lhe jeito. Quanto mais cedo melhor.
  •          Mais jeito lhe dava se a responsabilidade de abrir uma crise e antecipar eleições viesse do PCP ou do BE. Fazia-se de vítima e aí, sim, provavelmente conseguiria uma maioria absoluta.
  •          O PCP e o BE são suficientemente inteligentes para não embarcarem nesse suicídio político. Ainda para mais num tempo em que a Europa está cheia de problemas. O país não lhes perdoaria.

 

  1.       Uma coisa, porém, é certa: com esta ambiente no seio da geringonça, só por milagre é que é possível repeti-la depois de 2019. Mesmo para quem é crente, dois milagres seguidos é muita coisa!

 

 

RIO E A NATALIDADE

 

  1.       Há uma semana critiquei aqui Rui Rio por não apresentar propostas diferentes e alternativas às do Governo. Hoje, em coerência, só posso elogiá-lo. Rio fez, finalmente, o que há muito sugiro e recomendo – apresentou algumas propostas viradas para o fomento da natalidade.

 

  1.       Por que é que Rio fez bem?

a)      Primeiro: porque teve iniciativa política. Marcou a agenda. Obrigou o PM a saudar as suas propostas e até levou a CDS à ingenuidade de exibir ciúmes na praça pública.

b)      Segundo: porque teve a iniciativa num tema que é essencial e estratégico – o do estímulo à natalidade. É um tema nuclear. Corremos o risco de ter em 2050 a mesma população de 1960. Menos 2 milhões de pessoas.

c)      Terceiro: porque as propostas que apresentou, ainda que incompletas e insuficientes, são boas propostas, sobretudo a ideia de creches gratuitas. É completar o Estado Social.

d)      Finalmente: porque, estas sim, são propostas de matriz social-democrata. Este é o ADN do PSD.

 

  1.       É caso para dizer: Até que enfim! Espera-se que continue por este caminho. Não precisa de apresentar propostas todos os dias. Mas deve manter esta tendência no futuro.

 

A CIMEIRA EUA/COREIA DO NORTE

 

  1.       Esta cimeira bem pode ser considerada a Surpresa Internacional do Ano. Há um ano, tudo isto era impensável. Um ano depois, os dois líderes podem estar a um passo de fazer história. E a China exerceu na retaguarda uma influência decisiva.

 

  1.       Apesar de ter sido uma cimeira convocada e preparada de forma completamente heterodoxa, a verdade é que pode ter um resultado positivo. Alguns especialistas internacionais consideram que os dois líderes estão genuinamente empenhados num acordo.

 

  1.       Independentemente do desfecho, podemos desde já considerar:

a)      O líder da Coreia do Norte será sempre um vencedor. Com acordo ou sem ele, é o líder de um pequeno país, que sempre desafiou os EUA e que consegue uma cimeira com os EUA, falando de igual para igual com o presidente americano.

b)      Trump, ao contrário, se não conseguir um acordo consistente de desnuclearização da Península, será um perdedor. Deu protagonismo a um ditador e não conseguiu amarrá-lo a um acordo.

 

  1.       Falando de Trump, vejamos o seu comportamento na Cimeira do G7:
  •          Primeiro, recusou encontrar-se a sós com a PM britânica (o que gerou a fúria de Theresa May);
  •          Depois, afirmou que gostaria de ver a Rússia no G7 (só para provocar os líderes europeus);
  •          Terceiro, garantiu que assinava o comunicado final da cimeira para, pouco tempo depois, recusar a sua assinatura.
  •          Em conclusão: um presidente errático e não confiável.
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