Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre a Investigação e-toupeira, a polémica com a Ponte 25 de Abril, o Congresso do CDS e a reacção do PSD, 2 anos de Marcelo e as mudanças na Banca.
INVESTIGAÇÃO E-TOUPEIRA
- Comecemos pelo lado positivo – o lado das investigações judiciais. Este é mais um caso que prova que a Justiça mudou muito nos últimos anos. Está mais livre, mais independente e mais eficaz a investigar. É com a área da política; é com o sector empresarial; é com o futebol; e é dentro da sua própria casa.
- Agora, o lado negativo:
a) Primeiro, o lado negativo do Benfica – Em pouco tempo já são muitos casos a chamuscar o nome o Benfica. É o caso dos emails; é o caso Rui Rangel; e é este caso envolvendo Paulo Gonçalves.
- Claro que o Benfica não foi condenado por nada. Mas são suspeitas a mais para uma instituição que se desejava acima de toda a suspeita.
- E, em vez de se queixar de perseguição, bom será que o Benfica e os seus responsáveis tenham boas explicações a dar à Justiça e à opinião pública sobre todas estas situações.
b) Depois, o lado negativo da Justiça – este caso suscita algumas interrogações preocupantes:
- Como é possível um funcionário entrar num circuito reservadíssimo, onde só têm acesso magistrados, investigadores e pouco mais?
- Que segurança têm as redes informáticas da Justiça?
- Agora foi possível detectar o crime e o alegado criminoso. Mas que garantias há de que estas situações não se repetem e não se descobrem os seus responsáveis?
- O Ministério da Justiça devia dar explicações.
POLÉMICA COM A PONTE 25 DE ABRIL
- A polémica acerca do desbloqueamento das verbas para obras urgentes na Ponte 25 de Abril parece uma polemica menor. Mas não é. É muito sintomática do que não deve acontecer.
a) Primeiro: o Governo diz que conhecia o problema e que havia verbas no Orçamento para as reparações da Ponte. O problema não é esse. O problema é o tempo que o MF demorou a desbloquear as verbas. Fica a sensação de que o MF só agiu quando foi interpelado pela revista Visão.
b) Segundo: é bom que o Governo tenha rigor na gestão das verbas públicas. O problema, porém, não é esse. O problema é a questão das prioridades. E a segurança de bens não pode deixar de ser a prioridade das prioridades na gestão da coisa pública. Com a segurança de pessoas e bens não se brinca.
c) Terceiro: julgava-se que os responsáveis já tinham aprendido com as lições do passado. Do passado mais recente e do passado mais remoto. Infelizmente, continuamos a ter notícias de negligências e ligeirezas.
- Finalmente, se a moda pega, está encontrada a solução para os vários ministros resolverem os seus problemas orçamentais com o Ministro das Finanças. Arranjam um dossier, facultam-no à imprensa, sai a reportagem respectiva, o MF assusta-se e despacha as verbas que estão em atraso. Pode ser original mas, como se vê, é eficaz.
CONGRESSO DO CDS
- Balanço do Congresso – Todos os objectivos estratégicos foram alcançados.
a) Entronização da líder – Cristas é hoje incontestada.
b) Exibição do partido unido e motivado – Praticamente não há vozes críticas.
c) Afirmação de um partido autónomo do PSD – Vê-se na estratégia eleitoral.
d) Afirmação de um partido menos ideológico e mais pragmático.
e) Mas a conclusão essencial do Congresso é esta: o CDS está em competição com o PSD, para tentar ultrapassar o PSD, ser o líder da oposição e alternativa à governação.
- Problemas desta estratégia
a) Primeiro problema – Esta ideia de o CDS ser em 2019 maior que o PSD não parece ser só ambição. Parece ser um exagero. E tudo o que é exagero não é credível. Corre mesmo o risco de ser ridículo. A última sondagem conhecida é desta semana e dava 5,4% ao CDS. Logo, parece ser um salto maior que a perna! Uma megalomania.
b) Segundo problema – O maior ou menor sucesso desta estratégia depende do PSD. Um PSD fraco e em crise favorece o CDS. Um PSD forte e recuperado funciona como tampão ao crescimento do CDS.
c) Terceiro problema – Há nesta estratégia táctica partidária a mais e visão nacional a menos. A ideia de CDS e PSD concorrerem separados é só táctica partidária. E só para o CDS tentar crescer à custa do PSD. Do ponto de vista nacional, isto significa fazer o jogo do PS e entregar o poder ao PS. De resto, António Costa é o grande beneficiário desta estratégia.
- Assunção Cristas diz que o importante é PSD e CDS atingirem 116 deputados. O que não diz é que, concorrendo em separado, esse objectivo é mais difícil de alcançar.
- Dois factos políticos deste Congresso
- Cristas fez esquecer Portas – O antigo líder não só não esteve fisicamente presente como quase não se falou dele. Há 2 anos isto seria inimaginável. É mérito de Assunção Cristas. E é inédito em Portugal. Nunca se viu o sucessor de um líder histórico conseguir afirmar-se como Cristas se tem afirmado.
- Dois nomes que emergem como potenciais líderes no futuro: Adolfo Mesquita Nunes e Francisco Rodrigues dos Santos, líder da Juventude Popular.
- Finalmente, Nuno Melo nas eleições europeias.
- Não é uma surpresa. Como não será Paulo Rangel como provável nº 1 do PSD. Ambos boas escolhas.
- A surpresa pode vir do PS. Não será Ana Catarina Mendes, como se fala. Mas é provável que seja Carlos César.
A REACÇÃO DO PSD
- O PSD face ao CDS – O PSD tende a desvalorizar Assunção Cristas e o CDS. Claro que o grande adversário do PSD é o PS. Mas desvalorizar a líder do CDS é uma imprudência.
- Cristas não tem o talento político de Paulo Portas. Mas não tem os anticorpos que Portas tinha. Os eleitores do PSD torciam o nariz a votar em Portas. Já o mesmo não sucede com Cristas.
- Cristas não vai repetir no país o resultado de Lisboa. Mas vai crescer. E o crescimento será sempre à custa do PSD. Isso é inevitável.
- O PSD continua a dar tiros nos pés. O maior de todos, esta semana, veio no Expresso de ontem, veiculado por um vice-presidente do Partido. Segundo esse vice-presidente, não há drama se o PSD perder 2019, porque o objectivo é ganhar as autárquicas de 2021 e a seguir as legislativas de 2023.
- Através de um vice-presidente ficámos a saber que o PSD já deitou a toalha ao chão. Implicitamente está a admitir a derrota em 2019. Dizer isto é suicídio.
- Com apoiantes assim, Rui Rio nem precisa de adversários.
- Decididamente, o PSD não está a perceber o filme político actual:
a) Estão já todos em campanha eleitoral. Menos o PSD que continua virado para dentro, a tratar de mercearia;
b) Falta 1 ano e 2 meses para as eleições europeias, o PSD está 12 pontos atrás do PS nas sondagens e mesmo assim está a demorar a fazer oposição;
c) Há um risco de o PSD perder ao centro para o PS e à direita para o CDS. Mesmo assim anda a discutir o sexo dos anjos.
d) Percebe-se que Rio quer começar a tomar a iniciativa – e faz bem. A prioridade devem ser os temas sociais, a Saúde, a Educação, a coesão social e territorial. É isso que faz sentido. Liderar a oposição.
2 ANOS DE MARCELO
- Próximos desafios do Presidente – São, sobretudo, cinco:
- A Europa – A próxima negociação dos fundos estruturais é vital para Portugal;
- O crescimento económico – Que vai ficar seguramente acima do projectado pelo Governo;
- Os incêndios florestais – Se o próximo Verão correr bem ao Governo, o Presidente marcará pontos ao ter sido exigente; se correr mal vai ter de agir de forma mais drástica;
- O Orçamento para 2019 – Seguramente que será aprovado. Mas as negociações não vão ser fáceis. E o Presidente vai ter de ajudar para assegurar a estabilidade governativa.
- A escolha do novo PGR – O Governo quer substituir Joana Marques Vidal. Falta saber o que faz o Presidente. Segura a actual PGR? Opõe-se ao Governo? Ou vai sancionar o nome alternativo do Governo que, em princípio, é João Silva Miguel? É o desafio mais difícil do PR.
- E, quanto à magna questão da recandidatura, Marcelo recandidata-se ou não? A minha convicção é que sim, em qualquer dos cenários políticos mais prováveis:
- Se houver maioria absoluta do PS – Não é a situação que um Presidente da República mais aprecie. É verdade. Mesmo assim, se tal suceder, não tenho dúvidas de que Marcelo se recandidatará. Porque tem uma tarefa essencial a cumprir: fazer o reequilíbrio político. Os portugueses não gostam de ver os ovos todos no mesmo cesto. E, face à fragilidade do PSD, o papel do Presidente não só não fica esvaziado como é decisivo.
- Se não houver maioria absoluta – Então, nesse cenário, repete-se a exigência actual: a reeleição do Presidente é necessária, como hoje, enquanto factor de estabilidade e de normalidade do país.
- Conclusão: o mais provável é ter Marcelo durante dois mandatos. E parece bem. Está no lugar certo no tempo certo.
MUDANÇAS NA BANCA
- Quanto ao Montepio, uma boa notícia e uma má notícia.
a) Boa notícia – A escolha de Carlos Tavares para Chairman e Presidente da Comissão Executiva do Banco. Carlos Tavares é um excelente profissional. A sua escolha dá muita credibilidade ao Montepio.
b) Má notícia – A má notícia tem três vertentes:
- Primeiro, a mudança de gestão no Banco arrasta-se há demasiado tempo. Não é bom. Só gera instabilidade.
- Segundo, Nuno Mota Pinto estava para ser Presidente e acaba por não ser. Outra notícia que não favorece a imagem do Banco.
- Terceiro, Carlos Tavares será Presidente da Comissão Executiva de forma temporária. Em princípio, durante 6 meses. Depois, virá outro gestor. Novo sinal gerador de instabilidade.
- No BCP, ao contrário, boas decisões e bons sinais.
a) Primeiro, uma boa articulação entre os dois principais accionistas – a Sonangol e a Fosun –, o que demonstra empenhamento no Banco.
b) Segundo, boas escolhas:
- Nuno Amado, que fez um belo trabalho de recuperação do Banco, passa para Chairman, mas um Chairman diferente do tradicional. Uma espécie de Chairman Executivo, com mais poderes do que é habitual num Chairman. Boa decisão.
- Miguel Maya, até agora nº 2 do Banco, e que é um excelente profissional, vai passar a Presidente da Comissão Executiva. Uma escolha natural e de grande competência.
- António Monteiro, até agora Chairman e que é outra figura de prestígio, passa a ser o Presidente da Fundação Millennium BCP, substituindo Fernando Nogueira, que já tinha pedido para sair.
- E uma novidade. Norberto Rosa, um bom quadro da banca e do Banco de Portugal, será o Presidente da Comissão de Auditoria.
COREIA DO NORTE
- Porquê esta reviravolta?
a) Há quem diga que é um recuo do líder da Coreia do Norte. Por receio da ameaça americana e por problemas económicos internos, resultantes das sanções. É uma visão virtuosa e benigna, mas pouco consistente.
b) O mais provável é que seja uma manobra viciada. O líder da Coreia do Norte aproveitou o charme dos Jogos Olímpicos de Inverno, acompanhado da pressão da China e da Coreia do Sul, para ganhar o estatuto de dialogar com os EUA de igual para igual e marcar alguns pontos na cena mundial.
- Riscos para os EUA?
a) Primeiro: o risco de muitos ditadores do mundo seguirem o mesmo exemplo da Coreia. Investirem na bomba atómica para chantagearem os EUA.
b) Segundo: se houver encontro entre os 2 líderes e dele nada resultar, é uma prova de fraqueza dos EUA e os seus aliados na Ásia sofrerão.
c) Terceiro: se os EUA recuarem ou abandonarem negociações, a Coreia vai capitalizar com capital de queixa.
d) Quarto: não se vê como é que a Coreia do Norte vai abandonar as armas nucleares. Essa é a solução da sobrevivência do regime.
- Para já, há uma atmosfera de desarmamento. Só falta saber: até quando? É que nada disto é consistente. Tudo isto cheira a manobra, a armadilha, a jogo viciado.
- Ainda sobre Política Externa. Três breves notas:
- Primeira: adiado para a Cimeira Europeia de Junho o plano Macron/Merkel sobre a Reforma da Zona Euro.
- Segunda: impasse em Itália para formar governo. Importante é saber o que vai fazer o Partido Democrático. Oposição, como quer Renzi? Ou apoiar um governo, como querem outros dirigentes contra Renzi?
- Terceira: atenção ao discurso de António Costa no Parlamento Europeu na próxima quarta-feira.