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14 de Janeiro de 2018 às 21:16

Notas da semana de Marques Mendes

As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O O ex-ministro e antigo líder do PSD comenta as eleições no PSD, que deram a vitória a Rui Rio. O "erro colossal" da ministra da Justiça sobre o final do mandato de Joana Marques Vidal à frente da PGR e dos conflitos entre a EDP e o Governo.

  • ...

A VITÓRIA DE RIO

 

  1.       Três razões para a vitória:

a)      Primeira: a vontade dos militantes de iniciarem um novo ciclo. Com a saída de Passos Coelho era óbvio que o partido queria mudar. E a mudança era protagonizada por Rui Rio. Santana Lopes representava uma certa continuidade, até pelos apoios herdados de Passos que tinha no aparelho. Ganhou a mudança.

b)      Segunda: Rui Rio tinha outra vantagem – aos olhos do PSD, de militantes e eleitores, era ele o que apresentava melhores condições para em 2019 defrontar António Costa. E o PSD é muito pragmático. Gosta de ganhar e vota naquele que lhe dá mais perspectivas de poder ganhar. Desta vez foi Rio.

c)      Terceira: Rio teve uma terceira vantagem. Tinha a seu favor aquela que era a maior desvantagem de Santana Lopes – o facto de este já ter sido PM e a ideia que existe de que as coisas então não correram bem.

Em conclusão: uns votaram em Rio porque queriam mudar de ciclo; outros votaram em Rio por considerarem que era o melhor para enfrentar Costa; outros ainda votaram em Rio para evitarem Santana Lopes.

 

  1.       O efeito da campanha – Houve três fases:

a)      A primeira fase é até aos debates. Nessa fase Rio consolidou forte vantagem. Havia uma sondagem interna (nunca divulgada) que lhe dava no início deste ano quase 20 pontos de vantagem;

b)      A segunda fase é a semana entre o 1º e o 2º debate. Aí Rio perdeu. E perdeu quase 12 pontos, de acordo com a mesma sondagem. Foi o efeito do primeiro debate, que PSL ganhou, criando uma dinâmica favorável;

c)      A terceira fase corresponde aos últimos dias da campanha. Rio melhorou e estabilizou a sua vantagem em 10 pontos de diferença. Ganhou o segundo debate e as entrevistas finais correram-lhe bem.

Conclusão: Rio tem uma vitória clara. Alguns dizem: "Mas devia ser maior para ter maior autoridade". Eu diria que isso é indiferente. Como ontem afirmava Ricardo Costa, a afirmação do líder depende da actuação que tiver no futuro e não do número de votos que obteve no presente.

 

  1.       Os discursos finais

a)      Santana LopesA sua candidatura, disse-o na altura, era um acto de coragem. PSL tinha muito a perder. Porque nos últimos anos tinha tido três derrotas consecutivas. Esta, a suceder, seria a quarta. Pela coragem de avançar merece um cumprimento especial. E no discurso final esteve bem – foi humilde, foi afectivo e até estava emocionado.

b)      Rui RioTeve um bom discurso de vitória: foi justo ao saudar Passos Coelho e Santana Lopes; foi assertivo ao invocar Sá Carneiro, para sinalizar que quer voltar à matriz original do PSD; e foi ambicioso ao falar da alternativa que quer construir para Portugal.

  

 

 

OS DESAFIOS DO NOVO LÍDER

 

  1.       O novo líder do PSD tem quatro desafios essenciais pela frente:

a)      Primeiro: unir o partido. Um líder forte é um líder magnânimo e com espírito integrador. Cavaco Silva e António Guterres ganharam a liderança do partido e logo a seguir integraram nas suas equipas pessoas das listas adversárias. E nos últimos anos Passos Coelho ganhou o PSD e convidou para nº 1 do Conselho Nacional o seu adversário Rui Rangel.

Rui Rio tem vantagem em seguir esses exemplos. Doutra forma, não evita a balcanização do partido e a sua vida será um calvário.

b)      Segundo: renovar os protagonistas. Rui Rio precisa de caras novas, de novos protagonistas, de novos quadros dirigentes. Os portugueses estão fartos de ver o PSD sempre com as mesmas pessoas. Se ele não faz essa ruptura, desperdiça uma oportunidade. Até agora Rio trabalhou numa empresa de caça-talentos. Agora tem de aproveitar essa sua experiência para caçar novos talentos políticos para o PSD.

c)      Terceiro: liderança parlamentar. Rio não é deputado. Eu julgo que isso até é uma vantagem – não se desgasta no Parlamento. Mas, não estando lá, precisa de ter um líder parlamentar da sua confiança. É das regras. E embora a escolha seja dos deputados, o sinal do líder é sempre decisivo. Neste quadro, acho que Hugo Soares, que até apoiou Santana Lopes, deve colocar de imediato o seu lugar à disposição. É o que se exige nestas circunstâncias.

d)      Quarto: construir um projecto alternativo. Este é o maior desafio de Rui Rio. E o mais difícil porque hoje os ventos sopram de feição a António Costa. Tradicionalmente, o discurso social era do PS e o discurso económico e financeiro era do PSD. Hoje, o PS tem quase o monopólio dos 3 discursos (porque a economia está a crescer; o défice a baixar; e o desemprego a cair). Isto é uma dificuldade para o PSD. Mesmo assim, com um caminho estreito, Rio tem algo a evitar e algo que pode propor:

  •          Tem de evitar o discurso do diabo, o discurso obsessivo pela negativa e a ideia de esperar que o governo caia ou a economia abrande;
  •          Tem de construir um projecto diferente, com duas marcas fundamentais: ambição e espírito reformista. Primeiro, porque o Governo não faz reformas e o PSD deve ser diferente; depois, porque a economia cresce mas há 23, 24 economias da União Europeia a crescerem mais do que nós.

 

  1.       Calendário da oposiçãoRio tem uma dificuldade adicional: é que tem de recuperar o PSD nas sondagens já este ano. Não pode esperar por 2019. Se o PSD chegar ao início do próximo ano sensivelmente com a mesma desvantagem que hoje tem para o PS, então corre dois riscos:
  •          O risco de perder inexoravelmente as eleições;
  •          O risco de os eleitores moderados do PSD se passarem para o PS e de o PS ter uma maioria absoluta. O eleitorado central que vota habitualmente PSD, se vir, no início de 2019, que o partido não pode chegar à vitória, pode preferir a vitória do PS sozinho com maioria absoluta, só para evitar a geringonça com BE e PCP.

  

A POLÉMICA DA PGR

 

O que a Ministra da Justiça, mais do que uma trapalhada, foi um erro colossal.

 

  1.       Primeiro: um erro jurídico. Todos os constitucionalistas desmentem a Ministra e reconhecem que o mandato da PGR pode ser renovado. Da MJ esperava-se mais rigor e menos ligeireza.

 

  1.       Segundo: um erro institucional. A escolha da PGR é da competência partilhada do PR e do Governo. Ao dizer o que disse, a MJ tirou o tapete ao PR, condicionou-o e retirou-lhe metade do poder de decisão, o que vai ser difícil de recuperar.

 

  1.       Terceiro: um erro político. Primeiro, porque esta declaração é um excesso de hipocrisia – o Governo quer substituir Joana Marques Vidal mas não tem coragem de o assumir. Depois, porque sendo a primeira vez que um PGR chega ao fim do mandato com um balanço claramente positivo, o normal seria reconduzir a pessoa e não substituí-la. Finalmente, porque ou o Governo tem uma explicação sólida para a saída ou vai ficar a suspeita de que está incomodado com o processo de Sócrates, com o processo de Ricardo Salgado, com Angola, com Tancos, ou com tudo ao mesmo tempo.

 

  1.       Quarto: um erro de oportunidade. Falar da saída da PGR a dez meses do fim do mandato é uma irresponsabilidade. Mata a autoridade da actual PGR. Se sai em Outubro, até lá ninguém a respeita.

 

  1.       Finalmente: tudo isto vai estigmatizar o novo PGR. Como diz hoje António Barreto no DN, se Joana Marques Vidal for mesmo substituída, o novo PGR ficará logo marcado por uma suspeita: foi escolhido porquê? Por causa de Sócrates? Por causa de Ricardo Salgado? Por causa do BES? Por que é que se mudou de Procurador quando se podia manter uma Procuradora que quase todos elogiam? Este é o disparate que a MJ criou e que o PM corroborou. 

 

 

 

O CASO DE ANGOLA

 

O Presidente de Angola fez esta semana uma Conferência de Imprensa marcante.

 

  1.       Primeiro: pela própria Conferência para assinalar 100 dias de mandato. É uma iniciativa invulgar e inédita em Angola. Nunca o anterior presidente fez nada do género. Mostra um estilo diferente de governação. Um estilo mais positivo e mais transparente. Angola está mesmo a mudar.

 

  1.       Segundo: pelo recado a José Eduardo dos Santos. O novo presidente, com inteligência e com coragem, diz ao seu antecessor: "Espero que cumpra o compromisso de sair este ano da presidência do MPLA". Isto é como quem diz:
  •          José Eduardo dos Santos é passado. Eu sou o presente e o futuro.
  •          É uma vez mais o exercício do poder. Muito bem.

 

  1.        Terceiro: as palavras sobre Portugal, a respeito do processo de Manuel Vicente. O Presidente de Angola fez o que qualquer Estado, nas mesmas circunstâncias, também faria – expôs as suas razões e fez a sua pressão normal. Agora, há aqui uma falha:
  •          Portugal conhece as razões de Angola. Mas falta conhecer as razões das autoridades judiciárias portuguesas. Os especialistas podem conhecer, mas a opinião pública não conhece. E devia conhecer.
  •          Com a mesma convicção com que digo que a PGR devia ser reconduzida, também digo duas coisas: a manchete do Expresso de ontem (a dizer que o MP desconfia da justiça angolana) devia ter levado a um esclarecimento da PGR. Não creio que possa ser verdade que um Estado soberano desconfie doutro Estado soberano com quem tem acordos judiciários.
  •          Finalmente, acho que a PGR devia esclarecer qual a razão pela qual a justiça portuguesa entende que o processo deve ser julgado em Portugal. Esclarecer é esclarecer. Não é ser subserviente, submisso, obediente ou seja o que for. 

 

O CONFLITO GOVERNO/EDP

 

Há decisões capitais que estão a suceder em torno da EDP e que são decisivas para o futuro de uma das empresas mais estruturantes do país.

 

  1.       Primeira: António Mexia ganhou esta semana um braço de ferro com António Costa. Há meses que há um conflito entre o Governo e a EDP. Até o Primeiro-Ministro o assumiu publicamente. E ficou a sensação de que o Governo queria influenciar os accionistas da EDP para não reconduzirem António exia. Só que esta semana ficou a saber-se: que António Mexia vai ser reconduzido; que ele obteve o apoio da generalidade dos accionistas (e não apenas os chineses); e que ele impôs a antecipação de uma decisão que só devia ser tomada mais tarde. Ou seja: Mexia ganhou esta batalha a António Costa.

 

  1.       Segunda: O que vai ser a EDP no futuro? Estamos cada vez mais próximos de uma clarificação. Não é provável que a EDP seja fundida numa empresa espanhola ou de outra nacionalidade. O cenário cada vez mais provável é a EDP ser uma plataforma para os investimentos internacionais do seu accionista chinês, designadamente na Europa, no Brasil ou na América Latina. A concretizar-se, pode ser uma mudança estratégica de grande valia para Portugal.

 

  1.       Terceira: no entretanto, sai o chairman Eduardo Catroga (por força da regra da limitação de mandatos). Mas não me surpreendia que, daqui a 2, 3 meses assuma um alto cargo internacional num grande grupo económico. É um caso especial. Apesar dos seus 75 anos, está cheio de energia, cheio de convites e sempre disposto a novas aventuras.

 

 

NOVO GOVERNO ALEMÃO

 

O acordo a que chegaram CDU e SPD, para um governo de Bloco Central, é uma excelente notícia para a Europa, para a Zona Euro e para Portugal.

 

  1.       Boa notícia para a Europa, em primeiro lugar. Sem governo na Alemanha, a Europa marca passo. Com o novo governo, a Europa vai avançar.

 

  1.       Boa notícia para a Zona Euro, em segundo lugar. O acordo realizado é uma aproximação às propostas do Presidente francês no sentido da reforma e do aprofundamento da Zona Euro. Macron está a marcar a agenda europeia.

 

  1.       Boa notícia para Portugal, por dois motivos:
  •          A Alemanha vai apostar mais no mercado interno. Vai abrir mais os cordões à bolsa. isto reforça o poder de compra dos alemães. É bom para as exportações de Portugal.
  •          A Zona Euro vai passar a ter fundos específicos para a estabilização económica dos países do Euro, para a convergência social e para o financiamento das reformas estruturais. Algo que vai ao encontro das posições de Portugal e em particular do PM António Costa.
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