Opinião
O futuro que atrai o presente
A condução codificada das economias pelos bancos centrais, usando a taxa de juro como regulador eficaz e que produzia mensagens que todos os agentes económicos sabiam interpretar, deixa de ter resultados satisfatórios porque a taxa de juro se torna rígida na vizinhança do zero.
A FRASE...
"Durante muitos anos, uma das mais duradouras regras dos bancos centrais definia-se nos seguintes termos: "Nunca nos comprometemos com decisões futuras, porque toda a informação que temos sobre o estado da economia já está contida nas acções que anunciamos". Agora, isto foi completamente abandonado. Com as mudanças anunciadas hoje pelo Banco Central Europeu e pelo Banco de Inglaterra, os bancos centrais estão a gritar dos telhados que "agora somos todos guias do futuro".
Gavyn Davies, "We are all forward guiders now"
in "Financial Times", 4 de Julho de 2013
A ANÁLISE...
As crises extremas têm uma característica que as singulariza: cortam a linha que liga o passado com o futuro, na medida em que este deixa de ser produzido pelo que se tornara habitual no passado e que o presente intermediava como ponto de passagem, tornando o presente o vazio da descontinuidade. Mas têm também uma outra característica que implica uma transformação do campo de acção: os instrumentos que habitualmente se usavam para corrigir os desequilíbrios perdem operacionalidade.
A condução codificada das economias pelos bancos centrais, usando a taxa de juro como regulador eficaz e que produzia mensagens que todos os agentes económicos sabiam interpretar, deixa de ter resultados satisfatórios porque a taxa de juro se torna rígida na vizinhança do zero e porque os movimentos internacionais de capitais criam ruído que distorce as mensagens dos governadores dos bancos centrais.
As posições de conforto e de condução remota da dinâmica das economias, a que se habituaram os bancos centrais, têm de ser abandonadas e substituídas por garantias prospectivas, por compromissos futuros sujeitos a condicionalidades voluntariamente aceites. É aqui que se encontra a característica paradoxal das crises extremas: o presente produzido pelo passado é inviável, o presente que pode existir é o que é atraído pelo futuro. Esta é a descontinuidade relevante.
Este artigo de opinião integra A Mão Visível - Observações sobre as consequências directas e indirectas das políticas para todos os sectores da sociedade e dos efeitos a médio e longo prazo por oposição às realizadas sobre os efeitos imediatos e dirigidas apenas para certos grupos da sociedade.
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