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26 de Outubro de 2020 às 19:30

Pedro e o carneiro, diabo... o lobo!

A discussão a que se assiste do Orçamento do Estado para 2021 parece um argumento adaptado de uma assembleia de condóminos, em que o essencial - i.e., a sustentabilidade - está por discutir.

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A FRASE...

 

"Pandemia retira dez anos de vida à almofada das pensões."

Sérgio Aníbal e Raquel Martins, Público, 25 de Outubro de 2020 

 

A ANÁLISE...

 

A frase que escolhi para motivação do artigo de hoje faz lembrar as assembleias de condóminos dos grandes prédios urbanos que, ano após ano, assistem à queda do fundo de reserva, abaixo do que é exigido por lei (art.º 4.º do DL 268/94 de 25 de outubro) e numa prática que o bom senso desaconselha. Quem como eu vive num apartamento recorda as intermináveis discussões sobre a falta de dinheiro para reforçar o fundo... por causa de faltosos relapsos, que se escusam de pagar (por manifesta impossibilidade, ou verdadeiro ato de culpa).

 

Em vez de se ajustar o orçamento às quebras esperadas - sim, porque elas são reais e, como tudo na vida, as perdas fazem parte da normalidade - opta-se pela via mais fácil: utilizar os recursos de segurança, empurrando para um futuro distante a resolução de um problema que hoje ainda é cedo para nos afligir. Faz parte da condição social e humana valorizar mais o certo e imediato que o incerto e longínquo. Então, lança-se mão do capital posto de parte para a conservação, e reforça-se o orçamento de despesa da limpeza. Paradoxalmente, todos votam favoravelmente. De tempos a tempos, condóminos exaltados - e não silenciados - mobilizam listas de abaixo-assinados, assegurando número suficiente de vizinhos dispostos a sanar o mal pela raiz, "correndo" com o administrador em funções. Rei morto, rei posto. Novo poder instalado e pasme-se... a prática regressa!

 

A discussão a que se assiste do Orçamento do Estado para 2021 parece um argumento adaptado de uma assembleia de condóminos, em que o essencial - i.e., a sustentabilidade - está por discutir, seja porque ninguém quer, seja porque quem quer não consegue eco das suas mensagens e das suas propostas. Fica apenas o ruído, a lembrar (ainda que em sentido inverso) a fábula de Pedro e o Lobo: por demasiadas vezes, mesmo quando não era verdade, acreditámos que a economia estava robusta e resiliente. Quando necessário, os fundos de reserva (célebres estabilizadores da política pública) estariam lá, para fazer face aos choques. Mas... que fazer se não deixamos de acreditar e eles já lá não estiverem? Daremos voz aos vizinhos exaltados, ou procuraremos consenso para cortar na limpeza?

 

Este artigo de opinião integra A Mão Visível - Observações sobre as consequências diretas e indiretas das políticas para todos os setores da sociedade e dos efeitos a médio e longo prazo por oposição às realizadas sobre os efeitos imediatos e dirigidas apenas para certos grupos da sociedade.

maovisivel@gmail.com

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