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10 de Fevereiro de 2016 às 20:20

A condição de recursos

Sempre que se fala em determinadas prestações sociais não contributivas (sejam elas o complemento social para idosos, o rendimento social de inserção ou até as pensões atribuídas aos ex-titulares de cargos políticos...) renasce o debate sobre a chamada "condição de recursos".

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Desde o início do século, a despesa do sistema de Segurança Social mais do que duplicou, passando de cerca de 10 mil milhões de euros em 2000 para cerca de 24 mil milhões no final de 2014. De uma forma geral, o volume da despesa tem aumentado a um ritmo anual que varia entre os 500 e os 1.000 milhões, incluindo nos períodos mais difíceis como foi o caso nos anos mais recentes em que Portugal esteve sujeito a um exigente programa de assistência financeira internacional.

 

É, certamente, um bom sinal verificar que, não obstante as visíveis dificuldades que atravessámos - e continuamos a atravessar -, o Estado não apenas não se demitiu da sua importante função social, como soube encontrar os meios para a reforçar num contexto de forte restrição financeira. Já não é tão bom sinal verificar que, no mesmo período, a despesa da Segurança Social em percentagem do PIB passou de cerca de 10% para mais de 27%. Dito por outras palavras, a percentagem da riqueza gerada que é afetada ao pagamento das prestações sociais não tem parado de crescer...

 

Se olharmos para a evolução da despesa com prestações sociais verificamos que grande parte do aumento da respetiva fatura diz respeito à rubrica "pensões" (velhice, invalidez e sobrevivência) que subiu de cerca de 7 mil milhões para mais do dobro (quase 16 mil milhões) em 15 anos, em particular na componente "velhice" (as chamadas pensões de reforma) que constituem o grosso da despesa. Outras componentes da despesa (por exemplo, doença e maternidade, prestações familiares, rendimento social de inserção) não apresentam variações tão significativas. Mesmo as prestações relacionadas com o desemprego - apesar de alguns "picos" (1,8 mil milhões em 2005/2006, 2,1 mil milhões em 2009/2010; 2,6 mil milhões em 2012/2013) - tendem a regressar a valores de há dez anos (no final de 2015, a verba despendida com o subsídio de desemprego terá ficado ligeiramente abaixo dos níveis de 2005/2006).

 

Dos 24 mil milhões de despesas do sistema de Segurança Social, cerca de 7 mil correspondem a despesas no âmbito do chamado Sistema de Proteção Social de Cidadania - prestações sociais não contributivas e acordos de cooperação com IPSS - que se destinam a obviar situações de carência e pobreza. Desses 7 mil milhões, cerca de 4,5 mil milhões (!) não estão sujeitos a "condição de recursos", isto é, ao conjunto de condições que a pessoa ou agregado familiar deve reunir para poder ter acesso às prestações. Não é aceitável que a Segurança Social pague "complementos sociais" a pensionistas que deles não necessitam. Não é aceitável que, muitas vezes, a Segurança Social financie lares residenciais cujas vagas são ocupadas por utentes que dispõem de rendimentos elevados. Não é aceitável a concessão de benefícios sem a demonstração da sua necessidade.

 

Por muito que haja a fazer - e há - para melhorar o nosso sistema de Segurança Social é imperativo sujeitar a condição de recursos todos os benefícios que não resultam do esforço contributivo. A justiça social não é dar um bocadinho a cada um; é, acima de tudo, dar a quem não tem e merece uma vida com um mínimo de dignidade.

 

Advogado

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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