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As taxas de juro da dívida e o (des)governo de Portugal

Na passada quinta-feira, as "yields" das Obrigações do Tesouro a 10 anos no mercado secundário da dívida subiram acima dos 4%, tendo continuado a ser transacionadas a esse nível durante a sessão de sexta-feira.

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Os 4% são relevantes por várias razões. Primeiro, 4% foi o valor referência que a DBRS, a única agência que tem o "rating" da nossa dívida acima de "lixo," apresentou como limite para considerar uma potencial descida do nosso "rating". Como sabemos, um dia em que tal revisão venha a acontecer, Portugal fica imediatamente excluído dos programas de compra de dívida pública e de financiamento da banca nacional por parte do Banco Central Europeu (BCE), com consequências potencialmente catastróficas para o país. Segundo, os 4% representam também níveis que nos trazem de volta para o período durante o qual Portugal estava intervencionado. A saída de Portugal do programa de ajustamento, em Maio de 2014, empurrou este mesmo indicador para baixo dos 4% pela primeira vez desde 2009. Até esse momento, existiam ainda muitas dúvidas sobre a capacidade de nos financiarmos no mercado sem a ajuda da troika, o que ajudava a explicar os valores elevados do indicador. Neste momento, é mais difícil de entender o porquê de níveis de "yield" comparáveis a esses.

 

Com a saída "limpa," e uma evolução positiva da economia nacional e do défice desde então, poderíamos acreditar que este indicador, que traduz a (des)confiança dos mercados na capacidade de pagarmos a nossa dívida, deveria continuar a evoluir positivamente.  Na realidade, este indicador melhorou até ao início de 2015, facto para o qual contribuiu muito o BCE, mas tem vindo a subir desde então. Mas o início de 2015 marca também o final de um compromisso deliberado e significativo do país com a redução do seu défice e dívida. Esse processo iniciou-se ainda com o anterior governo, fruto das pressões eleitoralistas, mas acentuou-se com a "geringonça," que escolheu dar prioridade à devolução de rendimentos a alguns grupos, em particular os funcionários públicos e os pensionistas, atrasando de forma significativa o processo de redução de dívida e do défice.

 

Nos últimos dias não recebemos informação económica do país que possa explicar de forma plausível esta subida continuada deste "yield". Pelo contrário, com as notícias de aprovação do orçamento em Portugal e Bruxelas, e uma comunicação clara por parte do Governo de que o défice ficará claramente abaixo dos 3% do PIB, que coloca Portugal fora do procedimento por défice excessivo, as notícias são aparentemente boas. Naturalmente a decisão de subir o salário mínimo sem qualquer justificação económica e as conversas dos partidos mais à esquerda sobre renegociação da dívida são negativas para a perceção do risco do país, mas parece-me difícil que possam explicar esta evolução.

 

Pelo contrário, a perspetiva de subida de taxas de juro nos EUA e na Europa (face às notícias de inflação na Alemanha) e o início do fim do programa de compras de ativos do BCE, que irá afetar de forma particular Portugal, são explicações mais razoáveis para este movimento negativo. Mas estas tendências estão para ficar, e poderão mesmo agravar-se, com uma variedade de incertezas políticas e económicas que se esperam para a Europa e EUA em 2017. De facto, se olharmos para a evolução do indicador de "yield", reparamos que ele tem vindo a subir de uma forma relativamente mais significativa desde o final do verão de 2016, precisamente o período durante o qual as notícias económicas do país foram mais positivas, e durante o qual várias incertezas políticas importantes desapareceram. Assim, o recente comportamento do mercado vem trazer cada vez mais força à tese, que subscrevo, de que o custo de financiamento da dívida de Portugal tem estado artificialmente baixo devido a decisões e condições exógenas, em particular as iniciativas do BCE. O seu progressivo desaparecimento irá fazer ressurgir o real custo de nos financiarmos no mercado, que me parece irá ser bastante superior a 4%. As consequências disso são incertas, mas certamente bastante negativas para o país.

 

É natural que os políticos prefiram tomar decisões que agradam aos eleitores e não aos mercados. No entanto, quando estamos endividados ao nível de Portugal, e por isso dependemos em larga medida da disponibilidade do mercado para financiar a nossa atividade, existem fortes restrições ao que podemos considerar. Este Governo, tendo convencido Bruxelas da bondade e viabilidade do seu plano e estratégia, parece-me que está longe de ter tido igual sucesso com os mercados. Nos próximos meses vamos certamente ficar a conhecer de forma mais precisa o nível de (des)confiança que existe com o atual (des)governo da nação.

 

Diretor da Católica-Lisbon School of Business & Economics

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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