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12 de Agosto de 2020 às 10:40

Entre a espada e a parede, quererá a direita salvar-se?

O desafio dos actuais líderes da direita democrática portuguesa não é o de terem mais este ou menos aquele deputado. É a sobrevivência do seu espaço político, com a sua vocação histórica, e com ele a sobrevivência dos equilíbrios de que depende o próprio regime. Veremos se aceitam esse desafio.

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Cinco anos depois do seu último governo, a direita está sem poder, sem projecto, sem propósito e sem perspectivas. Recusar ver a realidade só piora a situação. Porque esta não é só uma daquelas crises naturais e passageiras típicas dos ciclos políticos e da alternância democrática. É, mais do que isso, uma crise de vocação.

A vocação da direita portuguesa, no actual regime, é essencialmente cumprir duas missões. Em primeiro lugar, oferecer em permanência um projecto político baseado nos seus valores, alternativo ao da esquerda, coerente e facilmente compreensível, pronto para ser levado à prática a qualquer momento, no qual uma maioria de eleitores possa sentir que estão representados os seus interesses e aspirações. Em segundo lugar, cabe-lhe a missão de ajudar a centrar a polarização política no campo dos valores liberais e democráticos, erguendo-se como barreira contra os extremismos que põem em causa o regime.

Hoje a direita não cumpre nenhuma dessas missões. Com a sua incapacidade de gerar um movimento comum, abrangente e mobilizador, está encurralada entre a hegemonia da esquerda e a ameaça da extrema-direita.

Pior: perante a parede à esquerda, que lhe impede o crescimento para o centro, está disponível para cair sobre a espada, admitindo a possibilidade de entendimentos pré ou pós-eleitorais com o Chega – um pequeno partido radical, de um só deputado, sem história nem enraizamento, que é uma mistura de oportunistas, racistas e autoritários, que quer a destruição do regime e até se deixa relaxadamente infiltrar por neonazis.

O CDS tem sido ambíguo nesta matéria. Francisco Rodrigues dos Santos recusou há dias entendimentos com Ventura, e bem, mas depois de há semanas os ter admitido. Já o PSD é mais claro. Rui Rio e Miguel Albuquerque não os afastam, ponto.

De resto, o PSD, que parece já só ter como único valor o poder, ilustra na perfeição a armadilha mortal para a qual a direita se atirou. Por um lado, aceitando a sua subserviência à tutela do PS, entra numa negociata de bastidores sobre a distribuição do poder regional das CCDR. Por outro, aceitando como inevitável o crescimento do Chega, prepara o ambiente para uma futura coligação.

Desistir da sua vocação e vender a alma ao diabo seria a forma mais triste e indigna de a direita democrática portuguesa se suicidar.

Caso ainda deseje salvar-se só há um caminho: o PSD, o CDS e a IL têm de começar rapidamente a construir uma proposta política única, que seja uma válvula de escape para quem quer um contraponto programaticamente alternativo, mas ideologicamente moderado, à hegemonia da esquerda.

Já o estariam a fazer se percebessem as duas principais variáveis de qualquer vitória. Primeira, o sistema eleitoral e o método de Hondt, que beneficiam as coligações pré-eleitorais (principalmente na direita, que tem mais votos em que se elegem mais deputados). Segunda, o eleitorado, que se está nas tintas para a obsessão de posicionamento dos partidos da direita. Os eleitores querem uma perspectiva clara sobre o que é que estaria a ser feito se no Governo, em vez do PS, estivesse a direita. Não a têm.

Nas democracias mais consolidadas, o eleitorado do espaço equivalente ao PSD, CDS e IL está todo num só grande partido. Cá, só pode ficar perplexo com a sofisticação analítica, bastante bizantina e artificial, com que três partidos o cortam às fatias.

O entendimento devia começar com um acordo-quadro que permitisse o maior número possível de coligações nas autárquicas e que, com vitórias em câmaras simbólicas, criasse um movimento favorável para as legislativas. Por exemplo, para mim seria surpreendente que em Lisboa, onde já se tirou a maioria absoluta ao PS, a direita não se unisse agora em torno de um candidato forte, em nome de uma vitória que parece à mão de semear.

Os grandes líderes políticos não escolhem os seus momentos históricos. São os momentos que desafiam os líderes. O desafio dos actuais líderes da direita democrática portuguesa não é o de terem mais este ou menos aquele deputado. É a sobrevivência do seu espaço político, com a sua vocação histórica, e com ele a sobrevivência dos equilíbrios de que depende o próprio regime. Veremos se aceitam esse desafio.

 

Cinco anos depois do seu último governo, a direita está sem poder, sem projecto, sem propósito e sem perspectivas.
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