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15 de Fevereiro de 2017 às 20:25

[697.] Audi Q5

Já nos habituámos a primeiras páginas de jornais em que as notícias são substituídas por um anúncio. Nada contra. Está lá o nome e o logótipo do jornal. Está lá a indicação de publicidade.

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Se se aceitam, desde sempre, anúncios na primeira página, não há razão para não aceitar que um só a ocupe por inteiro.

 

Os noticiários televisivos também começam, antes de começarem, por um anúncio, em geral de hipermercados. Desde que a publicidade esteja claramente indicada, como está, todos beneficiam, incluindo os leitores ou espectadores, dado que a publicidade alimenta as empresas que produzem conteúdos jornalísticos.

 

Sábado passado, a primeira página do Expresso tinha apenas um anúncio e nenhuma notícia, à excepção da chamada de atenção para os extractos que o semanário publicava de um livro.

 

O anúncio distinguiu-se por dois motivos.

 

Primeiro, contrariou uma prática comum de o anúncio ocupar quatro páginas, fazendo dele uma espécie de capa do jornal. Este só ocupava a primeira e a segunda. Deste modo, não fazia de capa, mas de "meia capa".

 

Segundo, a marca anunciante prescindiu por completo de mostrar o seu produto e até o seu nome na primeira página do jornal. A quase página inteira foi ocupada por uma fotografia desfocada de uma paisagem que sugere uma zona desértica. A imagem parece nada significar, mas tal é impossível. Toda a comunicação transmite ou sugere significados.

 

Neste caso, a imagem pode significar que "falta qualquer coisa" na paisagem desfocada. O objectivo principal será despertar a curiosidade para "o que falta", tanto assim, que o anúncio "explica" essa sua função verbalmente. Na parte superior da foto inscreveu-se a frase de acesso que diz precisamente "A curiosidade está a chamar". Para que o leitor não duvide sobre quem anuncia, por baixo aparece o símbolo da marca, a Audi: quatro argolas alinhadas.

 

A curiosidade destina-se ao produto, mas a partir do próprio anúncio: o leitor sabe por experiência que ele terá continuidade. Os publicitários tomaram em conta que o Expresso vem dentro de um saco de plástico, pelo que se podiam dar ao luxo de usar o precioso espaço da primeira página sem nenhuma mensagem relevante, que só existe ao virar-se a página.

 

Vira-se. O leitor tem agora duas páginas à frente. Do lado esquerdo, continua o anúncio. Na página 3, porque é a página 3, visto que o anúncio com a "curiosidade" não é "capa", o semanário apresenta… uma segunda primeira página, como se a ocupada pelo anúncio não existisse. Esta natural defesa da natureza jornalística da publicação diminui o impacto do anúncio (no seu site, o Expresso chama-lhe página 1, mas na numeração do próprio jornal ela é a página 3).

 

Na página 2, o segundo episódio do anúncio "resolve" logo a curiosidade. Diz, em letras enormes, "Novo Audi Q5 O momento é agora" e mostra o carro em movimento no local exacto da foto do primeiro episódio. O novo modelo da marca ocupou o vazio na foto desfocada e saciou a curiosidade imposta na página anterior. É como se fosse a mesma foto, mas agora com o carro.

 

A frase "O momento é agora" pretende estimular um impulso do leitor no sentido de experimentar o carro ou até de o comprar. A ideia de impulso é repetida na primeira frase do texto: "Responda à chamada", que repete a ideia de "chamar" do primeiro episódio do anúncio. Só os "stands" de vendas poderão esclarecer se receberam - ou fizeram? - muitas "chamadas" no sábado. Na verdade, esta forma de estimular o leitor assemelha-se à dos canais de TV quando convidam os espectadores a telefonar "já, já" para um número 690: "O momento é agora."

 

O resto do texto do anúncio parece assumir que os leitores já estariam familiarizados com características do automóvel, mas estranhei que todas as indicadas sejam "equipamentos opcionais". De facto, as quatro referidas têm um asterisco que remete para essa informação no fundo da página. Estranho que um anúncio apenas refira equipamentos adicionais e nenhum incorporado em todas as variantes do modelo. Quem sabe se a frase final do texto, tão bonita e aspiracional - "A sua liberdade está a chamar" -, não se refere à liberdade de escolher equipamentos opcionais. 

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