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[515.] VW, Banco Alimentar, Citroën, Konica Minolta, Fiat

A marca de impressoras Konica Minolta precisou de refrescar a ideia de que é "líder de mercado no segmento profissional de Produção de Documentos". As pessoas já não se deviam lembrar, e, se me permitem a psicanálise do anúncio, a publicidade não será suficiente.

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1.Bom slogan, o do Banco Alimentar: "Compre 2, leve 1". A publicidade adequa-se à organização não-governamental no estímulo a que se "ajude quem mais precisa". Essa adequação fez-se precisamente pela inversão do slogan publicitário habitual "compre 1, leve 2". A capacidade de a linguagem publicitária viver matando-se é sinal da sua criatividade. Ainda tem muitos anos de vida à frente.


2.Semanas atrás, comentei que uma publicidade do VW Polo R WRC com o slogan "A segunda infância chegou mais cedo" evidenciava "a infantilidade dos adultos, jovens ou não, como valor dos indivíduos na sociedade contemporânea". Os publicitários levaram ainda mais longe a associação dos adultos à idade da criancice ao colocarem nas redes sociais no dia 1 de Junho um novo anúncio mostrando aquele modelo acompanhado pelo slogan "Feliz dia da criança."

3. Gosto de anúncios que recorrem ao trompe l’oeil, enganando-nos a vista na condição de nos deixarem perceber como fomos enganados. Nem todos têm grande originalidade, mas é melhor do que nada. O novo Citroën C3 recorreu ao trompe l’oeil para ilustrar a informação de este modelo permitir economizar "23% menos consumo", embora não explique em relação a quê. Sendo a percentagem uma relação entre dois números, convinha que o reclame indicasse se o carro que gastava mais era o próprio modelo anterior da marca, como deduzo. Mas não está lá, para não zangar os proprietários desse modelo anterior. O novo permite "mais quilómetros de prazer", pelo que o texto termine desejando ao observador: "Que não lhe falte estrada!" O trompe l’oeil ilustra essa ideia. Como no rectângulo do anúncio falta espaço para mais estrada, a montagem fotográfica mostra-a enrolada à frente do automóvel.

4. Mas onde é que eu já vi isto? A marca de impressoras Konica Minolta precisou de refrescar a ideia de que é "líder de mercado no segmento profissional de Produção de Documentos". As pessoas já não se deviam lembrar, e, se me permitem a psicanálise do anúncio, a publicidade não será suficiente: é preciso pôr as pessoas a passarem a informação pelo passa-palavra, a mais antiga forma de comunicação humana. Como mostrá-la? Na fotografia, um homem diz um segredo a uma mulher, com a mão encostada à boca e à orelha dela. Ouvindo o segredo, que é uma coisa que a publicidade não é, ela faz uma cara de enorme admiração, porque não sabia ou já não se lembrava da liderança da Konica Minolta. Mas onde é que eu já vi o passa-palavra transformado em ilustração de anúncio? Foi lá para 2004, no Manto Diáfano n.º80. Nesse caso, era uma enfermeira que segredava a um homem as vantagens dos medicamentos genéricos, da marca Alter MG. Como os médicos andavam numa de não prescindirem de recomendar medicamentos não-genéricos, recorria-se ao passa-palavra, como sugestão de que a opinião pública subterrânea, que passa mensagens sem que se note nos media, favorecia a escolha dos genéricos. No reclame de Konica Minolta são anónimos empregados de escritório que, por falta de orçamento para mais publicidade, são convidados a transmitir uns aos outros a mensagem deste solitário anúncio.

5. O passa-palavra é uma forma de comunicação por contágio, e os sorrisos, ou talvez os "smiles", também. O anúncio do Fiat Punto "por €10.900 ou €139/mês" trata-me por tu, porque me acha miúdo, e pergunta-me em letras muito grandes: "Quantos sorrisos vais contagiar depois de ler esta oferta?" Fiquei com uma dúvida, mas apenas gramatical: não deveria ser "depois de leres"? Talvez seja uma forma de me tratar em simultâneo por tu e por você. Ou o filho por tu e por você o pai-que-paga-o-carro. Coisas da psicanálise dos anúncios. Pois na verdade, só por essa minha psicanálise vernácula é que eu chego a perceber a pergunta: o miúdo ou a miúda lêem a oferta do reclame e vão logo "contagiar" o papá com sorrisos, para ele abrir os cordões à bolsa.

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