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29 de Agosto de 2014 às 00:01

O Novo Banco do Estado

Têm razão os que dizem que o BES não é comparável ao BPN. É pior: na dimensão relativa dos dois bancos e, logo, nos seus efeitos. Mas também no contexto.

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Não estamos agora, como estávamos em 2008, em plena crise financeira internacional, com bancos a falir e a serem nacionalizados ou intervencionados nos dois lados do atlântico. Não tínhamos os instrumentos entretanto criados na UE por impulso do G20. Não beneficiávamos dos resultados dos "stress tests" feitos aos principais bancos. Não beneficiávamos dos exercícios de supervisão reforçada feitos nos bancos depois da crise internacional com a presença de peritos estrangeiros.

 

Não terão sido os alegados factos novos ocorridos no segundo trimestre a determinar a solução, sob pena de ter sido construída de modo apressado. Tudo indica que a mesma estava a ser preparada há algum tempo, mas permitindo os danos da exposição internacional e ganhos e perdas especulativos assentes em vendas a descoberto ("short-selling") económica e socialmente danosas.

 

É também por isto que o arrastar da situação se torna incompreensível. Os instrumentos agora usados, em especial o Fundo de Resolução (FR), foram aprovados já em 2011. Estavam disponíveis em 2012 quando outros bancos foram capitalizados com a linha da troika. Optou-se, todavia, por deixar este de fora, prolongando depois a agonia com a demora na composição da equipa de gestão.

 

Temos efectivamente um problema sério na nossa supervisão financeira, num País e numa economia que não justifica financiar três supervisores distintos, com os problemas de conflitos de interesse, de coordenação e de transparência que persistem, como de novo se demonstrou. Daria outra discussão, mas não vou repetir o que disse, escrevi e propus no passado.

 

Não é só neste domínio da actuação passada que importa clarificar equívocos. Importa fazê-lo também quanto ao futuro.

 

Claro está que nada é definitivo. Nem o velho, nem o novo. Isto mesmo se aplica ao Novo Banco (NB) criado pelo Estado, que por lei não pode durar mais que dois anos. É o seu prazo de validade. O Novo Banco é, por isso, e também por lei, apenas um banco de transição, aguardando um novo dono, possivelmente espanhol, que substitua o actual – também de transição – i.e., o Estado. Independentemente da discussão formal sobre a existência ou não de nacionalização, materialmente ela está feita. O NB é público.

 

Por mais que se enfatize o isolamento aos riscos ("ring fencing"), a exposição aos mesmos está adquirida e os efeitos de contágio materializaram-se na esfera pública. No plano económico, e do crédito à economia em especial, no plano do sistema bancário e mercado de capitais, e no plano das finanças públicas.

 

O NB é detido pelo FR que, enquanto entidade pública, é detido pelo Estado e, por isso, gerido por uma administração nomeada pelo Governo e pelo Banco de Portugal, i.e., pelo Estado, que assim não fica imune às responsabilidades próprias do accionista único. Está, pois, assumido o risco de capital.

 

Mas está também assumido o risco de crédito. Além dos empréstimos do BdP e da CGD, o Estado endividou-se para emprestar e assume o risco de recuperação do que vai emprestar, sendo discutível a adequação entre risco público incorrido e remuneração obtida. Tanto na componente dos juros do empréstimo, como na componente dos dividendos do capital.

 

Tudo podia ter sido diferente, sobretudo tendo em conta a experiência de que passou a dispor-se no pós-crise 2008. Independentemente do que caiba à justiça tratar, desejavelmente de modo rápido.

 

Ex-Secretário de Estado. Docente da FDL

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