Opinião
As "costas quentes" de Tsipras
O impasse da situação na Grécia e a aproximação de Tsipras a Moscovo levam-nos a pensar qual será a estratégia do governo grego para ultrapassar a crise em que o país está mergulhado.
A pergunta legítima que se põe é se realmente há vontade de continuar na União Europeia ou, se pelo contrário, se procuram alternativas viáveis no leste, sabendo de antemão que qualquer aliança com Putin será o fim da Grécia na UE, ainda mais agora que foi aprovado o prolongamento das sanções à Rússia. As implicações da segunda opção são como um "tsunami" para a Europa, o que leva a crer que Bruxelas irá tentar tudo para evitar a saída dos gregos. Resta saber se essa é a vontade de Tsipras.
Vejamos os factos. O Banco de Desenvolvimento do BRICS, que inclui o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul, vai iniciar a sua atividade no próximo dia 7 de julho em Moscovo, com um fundo de 100 bilhões de dólares. Esta nova instituição financeira pretende gerir projetos estruturais e de desenvolvimento sustentável dos seus filiados. Em maio passado, Putin convidou a Grécia para se tornar um dos primeiros membros não fundadores do banco, o que pode ser considerado como uma alternativa ao FMI e ao Banco Mundial. A concretizar-se, a saída de Atenas da UE será certa, até porque colocará a Rússia quase dentro das suas fronteiras, numa altura em que Bruxelas a tenta afastar da Ucrânia, e quando procura desesperadamente outras alternativas à dependência energética de Moscovo. Por outro lado, um acordo grego com os BRICS seria também uma forma de a China estar mais próxima da Europa, até porque Pequim está a construir várias rotas para chegar ao Mediterrâneo e a Grécia tem uma excelente posição geoestratégica. Perante este cenário, será preferível manter Atenas na UE, e Tsipras joga com esta premissa.
Mas outros acontecimentos devem também ser tidos em conta. No passado mês de maio, a Comissão Europeia aprovou um conjunto de acordos para a criação de novas infraestruturas energéticas, sendo que coube à Grécia ficar com dois "hubs" e "hinterlands" para fornecer os mercados do sudeste europeu, investimentos de pelo menos 70 mil milhões de euros até 2020. O gasoduto que fornecerá o gás à Europa do sul e leste, parte do mar Cáspio, passa pela Geórgia, Turquia, Grécia e Itália, é reconhecido pela UE como "Projecto Interesse Comum", fundamental para a política europeia, garantindo a segurança, diversificação e independência energética da Rússia, já que o gás vem do Azerbeijão e Turquemistão. A concretizar-se, os trabalhos terão início até 16 de maio de 2016, e a operação da infraestrutura concluída até 31 de dezembro de 2020.
Mas este cerco energético à Rússia teve resposta de Moscovo que, na passada semana, fechou um acordo com a Grécia para o prolongamento do gasoduto que passa pela Turquia, o Turkish Stream, que irá fornecer o gás russo ao sudeste europeu, fazendo "bypass" à Ucrânia, um protocolo no valor de 2.000 milhões de euros, em vigor já a partir do próximo ano e que, obviamente, enfureceu Bruxelas que procurará todos os meios para o inviabilizar, tal como fez com a Bulgária e o anterior projeto South Stream.
Este jogo geopolítico de Tsipras é muito arriscado e perigoso, mas o primeiro-ministro grego está a valer-se da localização estratégica que o seu país tem na Europa, usando-a como moeda de troca para defender os seus interesses. Bruxelas está numa posição difícil, porque sabe que, se perder a Grécia, a Rússia ficará quase dentro das suas fronteiras e a China demasiado perto.
ISCTE-IUL
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