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O poder dos votos

Governo previa em Janeiro um crescimento do PIB de 2,1% para este ano. Semanas mais tarde reviu em baixa a estimativa para 1,8% e seis meses depois já admite que nem essa meta será alcançada.

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Todavia, mantém as políticas simpáticas que rendem votos, mas pressionam as contas públicas: a redução do IVA para a restauração e o corte das horas para a Função Pública.

 

Já não é a primeira vez que um Executivo troca votos por défice, com resultados políticos no curto prazo, mas com trágicos resultados económicos a médio prazo. Basta recordar o generoso aumento à Função Pública no ano eleitoral de 2009, quando o Governo de Sócrates já tinha conhecimento dos efeitos aterradores da crise financeira que tinha rebentado em Setembro de 2008. Mesmo sob a tempestade financeira, optou por agradar a centenas de milhares de eleitores. Com esse truque Sócrates garantiu a vitória, sem a maioria absoluta, mas toda a gente se lembra de como acabou essa tragicomédia: com um humilhante resgate.

 

Se o PIB deste ano registar uma evolução de 1%, ficará abaixo de metade das metas iniciais anunciadas. Se tivermos em conta que por cada décima percentual a menos no PIB, os cofres do Estado deixam de encaixar cerca de 60 milhões de euros é simples perceber que há um risco óbvio de derrapagem das finanças públicas que nem o brutal aumento dos impostos sobre os combustíveis e o tabaco consegue mitigar.

 

Faz parte da lógica da política e é da natureza humana que os detentores do poder façam tudo para o manter. Não é obrigatório ter lido Maquiavel para compreender esse facto.

 

E o poder democrático tem a virtude de depender dos votos dos cidadãos. Só que esses eleitores votam de acordo com os seus interesses. Neste país um partido ou coligação consegue uma maioria com pouco mais de dois milhões de votos. Costa é primeiro-ministro com 1,747 milhões.

 

Havendo 800 mil funcionários públicos é fácil perceber o seu peso eleitoral. São depois dos reformados o grupo mais importante. E são sociologicamente bases eleitorais dos partidos de esquerda, que suportam a geringonça que agora está poder.

 

Os donos de cafés e restaurantes são outro grupo com influência eleitoral. São milhares espalhados de norte e sul e são negócios dos quais depende a estabilidade financeira de muitas famílias. Não há nota de que a redução do IVA, em vigor desde sexta-feira, tenha contribuído para baixa do preço dos cafés ou das refeições. Também é duvidoso que leve a muita criação de emprego, mas alivia as margens do negócio e aumenta os lucros. Salvo os ganhos dos empresários destes negócios, o país pouco vai lucrar com a medida comemorada com pompa e circunstância em Almeirim, capital da sopa de pedra.

 

Com o truque da sopa da pedra, este Governo vai fazendo pela vida, tentando garantir os votos para as próximas eleições. Mas os condimentos desta sopa também vão depender da evolução da economia e da boa execução das contas públicas. O aviso do ministro das Finanças da Alemanha sobre os riscos de um novo resgate é um receio partilhado pelos credores do qual Portugal depende. Por agora a rica sopa é garantida pela compra de dívida realizada pelo BCE. Mas se o "rating" que nos liga à torneira do dinheiro fácil e barato sofrer uma baixa, só a pedra da sopa nos restará.

 

Director-adjunto do Correio da Manhã

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