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22 de Outubro de 2017 às 21:00

Estamos a exagerar?

Todos gostaríamos de saber o que vai acontecer à economia e ao país nos próximos anos. Gostaríamos de perceber se estamos a ir depressa de mais, cedo demais, confiantes de mais. Se o Orçamento do Estado de 2018 abre demasiado as velas, contando sempre com vento favorável, mar azeite e noites estreladas, desvalorizando os riscos eventuais, sejam eles nacionais ou internacionais.

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Terá razão o ceticismo frontal e incandescente de Miguel Sousa Tavares? Ou, pelo contrário, devemos comprar casa agora, investir agora, porque os preços vão continuar a subir, porque não haverá arrefecimento nenhum a curto prazo, nem sequer talvez num horizonte médio, muito menos uma hecatombe geral como a que sofremos a partir de 2008, e que, portanto, faz bem Mário Centeno em aumentar mais depressa do que o previsto as pensões, também descongelar as carreiras na função pública, reduzir a factura de IRS até aos 40 mil euros, devolver a sobretaxa a todos, etc, etc.

O peso da nossa dívida pública, apesar de ter entrado em curva descendente - isto se o governo cumprir a promessa neste e no próximo ano: 123,5% do PIB em 2018 -, é uma limitação-chave que nos expõe infinitamente mais aos elementos do que acontece aos nossos parceiros do euro. Excluindo a Grécia, um caso terminal, um faz de conta bem europeu, é verdade que Itália (132%) e em menor grau a Bélgica (106%) também estão em situações financeiras delicadas, tendo Portugal um excedente orçamental primário (2,6 % do PIB) que favorece a prazo uma redução sustentada desta montanha de dívida.

O ponto de partida português revela, portanto, uma estranha força - a disciplina orçamental, senão no método usado, pelo menos no resultado final -, mas em parte neutralizada pela terrível fraqueza de só poderemos verdadeiramente deixar de olhar por cima do ombro quando a dívida, em percentagem do produto, estiver bem abaixo dos 100%. Ora, isto vai levar uns bons anos. Mais de cinco, certamente, período durante o qual estaremos sempre a pisar gelo fino em época de intenso aquecimento global.

A questão que se coloca, portanto, é a seguinte: faria sentido acelerar o metabolismo durante estes cinco anos, reduzindo mais depressa o défice público e acelerando o pagamento da dívida? A resposta não pode ser dada intuitivamente. Não podemos dar resposta usando o exemplo da economia doméstica, como se as dinâmicas financeiras e económicas de uma família de quatro fossem extrapoláveis para uma realidade de milhões de pessoas.

Dito isso, cito um estudo apresentado em maio deste ano por Olivier Blanchard, ex-economista chefe do FMI, e Pedro Portugal, ambos insuspeitos de esquerdismo, onde é dito preto no branco que seria inútil e até indesejável acelerarmos mais do que o previsto a consolidação orçamental, já que poderia ter efeitos contraproducentes no crescimento do PIB, o que afetaria a desejável redução da dívida pública em termos percentuais. Ou seja, paradoxalmente acelerar mais não nos levaria mais longe, pelo contrário, poderíamos ficar aquém.

É no entanto conveniente lembrar que o que se faz com a, digamos assim, folga orçamental, também importa. Descongelar carreiras no Estado e aumentar pensões ajuda mais a economia do que reduzir os impostos sobre as empresas ou aumentar o investimento público? Ou aumenta mais ainda a rigidez da despesa pública? A questão é debatível, sendo que a redução das desigualdades parece-me uma escolha com méritos políticos, apesar do evidente isco eleitoral que lhe está implícita.

Finalmente, o ponto talvez seja este: desde 2008, início da grande recessão, a dívida global em percentagem do PIB subiu 40% - sim, 40%! Estamos hoje mais endividados e, ainda por cima, viciados em dinheiro ultra barato. Se surgir algures um foco de desconfiança - um novo subprime, mas diferente -, o rastilho levará tudo o que encontrar pelo caminho. Perante isto, batatas.

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