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OCDE desafia governo português a cotar empresas públicas em bolsa

A OCDE conclui um relatório onde deixa várias recomendações às autoridades para promover a dinamização do mercado de capitais em Portugal.

A ORES Portugal, detida pela Sonae Sierra e pelo Bankinter, tornou-se a primeira    SIGI a cotar em bolsa.
Pedro Catarino
02 de Outubro de 2020 às 10:00
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O mercado acionista português viu desaparecer cerca de dois terços das cotadas desde 1997, com a bolsa lisboeta a perder mais empresas do que aquelas que recebeu ano após ano desde 2008. Com vista a inverter esta situação, a OCDE preparou um relatório com um conjunto de recomendações para ajudar a dinamizar o mercado de capitais português, deixando um recado ao Governo: nenhuma das grandes empresas públicas está cotada.

"Ao contrário de muitos outros países europeus, nenhuma das grandes empresas públicas portuguesas está cotada", destaca o relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) sobre o mercado de capitais português, divulgado esta sexta-feira. Segundo a OCDE, a reduzida liquidez é apontada como um dos obstáculos à captação de novas empresas para o mercado, tendo aí o Governo uma possibilidade de fazer a diferença.

"Para estimular o desenvolvimento do mercado de capitais, o governo pode incentivar a cotação das empresas públicas que são consideradas mais adequadas de um ponto de vista macroeconómico e estrutural, o que, por sua vez, ajudaria a obter uma dimensão e uma visibilidade críticas do mercado acionista junto dos investidores institucionais internacionais", realça o relatório.

E a ausência de representatividade das empresas públicas no mercado não se fica pela bolsa, com a organização a recomendar um plano estratégico para promover colocações de dívida, com medidas que incluam a promoção da "emissão de obrigações de empresas públicas e a sua cotação no mercado nacional, o que contribuirá para reforçar o mercado e aumentar a liquidez".

Além da ausência de empresas públicas no mercado de dívida e de ações, a OCDE nota ainda que "Portugal tem também um número importante de grandes empresas não cotadas, incluindo empresas do setor financeiro – nomeadamente companhias de seguros – que não enfrentam quaisquer restrições de dimensão para a sua cotação".

Para contrariar esta situação, a organização aconselha a introdução de um sistema de crédito fiscal para os custos relacionados com as cotações iniciais, bem como ofertas secundárias de empresas já em bolsa. A modernização do quadro regulamentar, para assegurar um maior grau de flexibilidade é outra das recomendações para promover a captação de fundos no mercado acionista.

Impostos mais baixos para os investidores

As medidas propostas abrangem também estímulos ao investimento. "As autoridades portuguesas devem considerar o apoio, incluindo através de apoio estatal indireto, como os incentivos fiscais às instituições ou a determinados produtos, bem como a investidores, à criação e à expansão de instituições nacionais de intermediação e de consultoria do mercado de capitais".

Assim, "os incentivos fiscais, para além do sistema de crédito fiscal proposto para os custos de cotação e de consultoria, podem incluir isenções dos impostos sobre as mais-valias no caso de determinados veículos de investimento coletivo que investem predominantemente no mercado acionista nacional e visam os pequenos investidores".

No campo das obrigações, a OCDE ressalva o reduzido recurso à emissão de dívida, uma forma de financiamento que poderia prolongar prazos de vencimento, aumentar a resiliência e facilitar os investimentos de longo prazo das empresas lusas.

"O mercado deve considerar a elaboração de um plano estratégico para o desenvolvimento dos mercados de obrigações de empresas portuguesas", realça o relatório, propondo, por exemplo, a criação de um mercado de mini-obrigações, com um processo simplificado para empresas de menor dimensão, onde estas poderiam emitir obrigações apenas a investidores qualificados, através de vendas diretas ou veículos para fins especiais de titularização.

Mais investidores institucionais

Mas para dinamizar o mercado é preciso também estimular a participação dos investidores. E os institucionais tradicionais, como fundos de pensões, companhias de seguros e fundos de investimento devem ter aqui um papel fundamental, tal como acontece no estrangeiro.

"A medida destinada a aumentar a participação das famílias no mercado de capitais português através de fundos de investimento pode também incluir a introdução de um quadro especial para as contas poupança que, em determinadas condições, beneficiam de vantagens fiscais, tais como isenções do imposto sobre as mais-valias, se o investimento for detido durante um certo período de tempo", aponta o documento. E acrescenta: "o requisito de que estes fundos especializados aloquem um montante mínimo dos seus ativos a títulos de participação e de dívida cotados de empresas de menor dimensão poderia facilitar o financiamento de longo prazo das PME portuguesas".

Aumentar o recurso ao financiamento alternativo, como os fundos privados de participações e os fundos de capital de risco, é outra das recomendações apontadas pela OCDE para tornar o mercado de capitais em Portugal mais dinâmico.

"O governo deve também considerar a introdução de um quadro regulamentar para os veículos de aquisição de fins especiais que ofereçam um modelo de investimento híbrido de mercados privados e públicos aos investidores e que proporcione uma forma simples e eficiente para a cotação de empresas de menores dimensões sem seguir o processo tradicional de cotação", refere o documento.

O relatório agora tornado público parte de uma iniciativa da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que apresentou um pedido de apoio à Direção-Geral do Apoio às Reformas Estruturais (DG REFORM) da Comissão Europeia para proceder a uma avaliação exaustiva dos mercados de capitais em Portugal. A OCDE foi nomeada como parceiro para a execução do projeto.

"As recomendações de política apresentadas no presente relatório visam fornecer orientações aos decisores políticos e às autoridades nos seus esforços para criar um quadro regulamentar em que os mercados de capitais possam apoiar a dinâmica do setor empresarial", refere o documento, hoje apresentado no ministério das Finanças, com a presença do ministro, João Leão, o secretário-geral da OCDE, a comissária Elisa Ferreira, a presidente da CMVM, Gabriela Figueiredo Dias, e outros responsáveis do mercado e do Governo.

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