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Mudança do Infarmed para o Porto só agrada ao... Porto
A mudança do Infarmed para o Porto deixou os trabalhadores em pé de guerra, os partidos a fazer perguntas e a indústria farmacêutica incomodada. Mais do que criticar a mudança para o Porto, contesta-se a forma como a decisão foi tomada.
Do lado dos trabalhadores, a rejeição é praticamente unânime. Os partidos também têm exigido que o Governo clarifique a decisão – e o Bloco até quer saber se o Executivo admite recuar. E no sector da saúde, há quem critique a forma como o processo foi gerido.
Aliás, nem mesmo dentro do próprio Governo a transferência do Infarmed para o Porto é consensual, segundo apurou o Negócios.
A este propósito, fonte oficial do Ministério da Saúde garante que a decisão de desconcentrar entidades e serviços já vinha a ser ponderada "ao longo dos dois últimos anos", garante que há tempo para analisar o processo de forma detalhada e sublinha que a "deslocalização será parcial, faseada e contará com a disponibilidade de instalações já existentes".
Oficialmente, a indústria farmacêutica, uma das que mais interacção tem com o Infarmed – com quem precisa de se relacionar para colocar os medicamentos no mercado, preferiu adoptar uma postura cautelosa. O presidente da Apifarma, João Almeida Lopes, preferiu não tecer comentários ao Negócios, justificando com o facto de se tratar de uma "decisão do Governo". Postura semelhante à da Apormed, que representa a indústria dos dispositivos médicos, que é outra das principais indústrias regulada pelo Infarmed.
Ex-presidente do Infarmed
O presidente executivo da Bial, António Portela, também não quis fazer comentários sobre este tema, a exemplo de Salvador de Mello e Luís Portela, que estão à frente da plataforma Health Cluster Portugal.
Vasco Maria, que foi presidente do Infarmed entre 2003 e 2010, mostrou-se incrédulo com a decisão. Numa intervenção no Fórum da TSF desta quinta-feira, Vasco Maria disse que teve "alguma dificuldade em aceitar que fosse verdade" quando soube. O médico não consegue "identificar nenhuma razão válida que justifique isto" e qualifica-a mesmo de "parece uma decisão irreflectida e mesmo irresponsável".
As críticas em relação à forma como o processo foi anunciado também têm por fundamento o facto de os trabalhadores e a direcção do Infarmed terem sido apanhados de surpresa, quando a legislação estabelece que a transferência para uma distância superior a 60 quilómetros tem (em regra) de ter acordo do trabalhador, quando se sabe que 92% dos trabalhadores dizem estar indisponíveis para a mudança.
O presidente da Comissão de Trabalhadores do Infarmed voltou esta quinta-feira a sublinhar que o Instituto enfrenta o risco de perda de quadros. "Já começaram a surgir pedidos de entidades externas, quer privadas quer públicas", que aliciam os trabalhadores a aceitar outro emprego ou uma situação de mobilidade para outro órgão, afirmou Rui Spínola, sem quantificar o fenómeno. "Se isto levar meses vamos perder quadros".
Governo não recua na decisão
A decisão de mudar a sede do Infarmed para o Porto a 1 de Janeiro de 2019 está tomada e o Governo não se prepara para recuar. A transferência da agência que é responsável por autorizar a introdução de medicamentos no mercado nacional tem gerado críticas em vários quadrantes, inclusive dos parceiros Bloco e PCP, mas o Ministério da Saúde está convencido de que até à transferência há um prazo "suficientemente alargado para uma análise detalhada deste processo, o qual envolverá os profissionais com a garantia de que serão parte activa no processo de decisão" e "construção das soluções mais adequadas".
A mobilidade do trabalhador para outra cidade exige acordo?
Depois de ter percebido que a esmagadora maioria dos trabalhadores do Infarmed estão contra a mudança para o Porto, o Governo garantiu que vai respeitar os seus direitos. Lei admite excepções.
Em regra, o Acordo é necessário
É dispensado o acordo do trabalhador para uma situação de mobilidade quando o local de trabalho se situe até 60 quilómetros (ou 30 km em carreiras de baixo grau de complexidade funcional), esteja nas áreas metropolitanas de Lisboa ou Porto (e a pessoa lá viva), ou se o novo posto de trabalho estiver no concelho de residência do trabalhador ou num concelho confinante, explica a Lei do Trabalho em Funções Públicas.
A título "excepcional", o acordo pode ser dispensado mesmo quando a distância é superior a 60 quilómetros mas, nesse caso, é necessário que se cumpram uma série de condições cumulativas: a mobilidade tem de ser no mesmo órgão, as funções do trabalhador devem ser coerentes com a sua categoria, a mobilidade tenha uma duração máxima de um ano e sejam atribuídas ajudas de custo.
Nova lei define ajudas à mudança definitiva
A nova lei da valorização profissional, em vigor desde Maio, que foi criada para enquadrar as situações dos trabalhadores considerados excedentários em processos de reorganização e reestruturação, também regula a mobilidade. Prevê que quando o posto de trabalho fique a mais de 60 quilómetros da residência do trabalhador este possa, com o seu acordo, reiniciar funções por mobilidade recebendo ajudas de custo no primeiro ano. Findo o prazo de um ano, poderá ser integrado, por acordo, tendo direito a um subsídio de fixação até ao dobro da sua remuneração base (com limites máximos), um subsídio de deslocação para reembolsar as despesas da mudança e um subsídio de residência mensal destinado a compensar os custos com habitação, no valor de 25% da remuneração base, durante doze meses, e garantia de transferência escolar dos filhos. Os incentivos dependem da permanência durante três anos.