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Isabel dos Santos: “Vou apresentar uma queixa-crime”

Carlos Saturnino “lançou-se num ataque directo ao antigo conselho de administração à Sonangol e à minha pessoa em particular. Vou apresentar uma queixa-crime” revela Isabel dos Santos na entrevista ao Negócios.

04 de Março de 2018 às 23:45
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A empresária angolana garante que não tem qualquer ligação à Matter Business Solution, a empresa que coordenava a equipa de consultoria externa da Sonangol. Sublinha os elogios feitos à sua gestão por executivos de petrolíferas internacionais e diz que, no final do ano de 2016, conseguiu na Sonangol poupanças de 1,4 mil milhões dólares.

Há alguma relação entre o afastamento de Carlos Saturnino nessa altura e as tomadas de posição dele agora, enquanto presidente do conselho de administração da Sonangol.
Pelas afirmações que constatei parece-me haver um certo grau de envolvimento pessoal nas decisões que toma. Ou seja, não posso interpretar as afirmações que ouvi na conferência de imprensa como sendo profissionais. Para mim não foram profissionais nem éticas. Por isso acredito que deve haver um envolvimento pessoal nas afirmações que fez, que são falsas e várias vezes até insultuosas.

Está a pensar tomar medidas em resposta a essas afirmações, além de procurar os esclarecimentos do Procuradoria angolana?
Fiquei muito decepcionada com a conferência de imprensa. Estava à espera que se falasse do futuro da Sonangol e dos resultados que se tinha conseguido atingir para, no fundo, perceber as soluções, mas em vez disso lançou-se num ataque directo ao antigo conselho de administração e à minha pessoa em particular. Vou apresentar uma queixa-crime. Estou neste momento a trabalhar com advogados nesse sentido e apresentarei essa queixa em função das afirmações e alegações que foram feitas. São difamatórias. Sem dúvida.

Há uma teoria conspirativa segundo a qual a atacam a si porque não podem atacar o seu pai, José Eduardo dos Santos.
Acho que é inevitável que, tentando atacar a performance da antiga administração da Sonangol, se tente atacar o Executivo e a sua decisão de nos ter nomeado para aquele lugar. Acho que as duas coisas não estão de todo dissociadas. Efectivamente, muitos dos ataques que são feitos ao trabalho e aos resultados da antiga administração são, sem dúvida, ataques políticos e estão fundamentados em outros factores que não a performance e os resultados da empresa. Porque os resultados da empresa claramente falam por si. Os custos foram cortados, a empresa passou a gerar lucro, foi melhor gerida e passou a ter um modelo mais robusto.

Mas ouve também, durante o seu mandato, queixas de petrolíferas internacionais devido a processos de gestão burocratizados e ineficientes. Estas queixas constavam de um relatório e terão sido um dos motivos que levou o presidente João Lourenço a optar pela sua exoneração. Como as comenta?
A nossa administração não alterou nenhum processo existente na empresa. Ou seja, os processos a que se refere existiam na empresa há 10, 15 anos. Os processos de contratação, de aceitação de propostas por parte das empresas petrolíferas, o processo em que elas podem contratar serviços, etc, são os que existiam antes de nós chegarmos. Portanto, se eles são burocráticos agora, também o foram no passado.

O sector do petróleo surpreendeu-a?
Não. Nós tivemos uma experiência muito positiva e ao contrário do que foi alegado na imprensa em relação ao relatório, o relatório que nós estudámos e sobre o qual nos debruçámos não tinha a ver com a burocratização dos processos. Pelo contrário, os processos eram efectivamente longos. Um dos trabalhos que estávamos a fazer na Sonangol era a revisão desses processos que datam já de décadas. Na época do engenheiro Manuel Vicente os processos eram exactamente os mesmos. Na época do doutor Francisco Lemos, os tais processos burocráticos eram exactamente os mesmos. E a primeira administração que começou a olhar para fazer a revisão desses processos e os tornar mais céleres e menos complexos foi a nossa. O relatório que nós conhecemos visou falar de cinco temas, relacionados com o gás e questões fiscais, entre outros. Este é o relatório de trabalho da comissão de trabalho interministerial que foi criada. Mas acredito que na imprensa, o que foi apresentado e dito foi relativamente diferente do que foi efectivamente tratado nessa comissão. A relação da nossa administração com as companhias petrolíferas foi boa. Encontrámos um espírito de colaboração, um espírito de investidores com interesses comuns e fizemos vários negócios com as diferentes empresas internacionais, desde a Total à Chevron passando pela Esso, etc, que defenderam os interesses de ambas as partes. Houve vários momentos de trabalho entre nós marcados por grandes sucessos. Aliás, quando se ouve os testemunhos dos CEO da BP e Total ou do vice-presidente da Chevron que falam sobre a antiga administração, todos eles são extremamente positivos. Porque a antiga administração tinha um grande sentido de negócio e percebia que era importante desburocratizar e ter processos céleres com investidores porque nós também somos investidores. A nossa postura foi sempre de negócio. Nós queremos investir, investimos convosco para diminuir os custos e queremos maximizar as receitas. Este diálogo correu muito bem.

Há também o relatório do seu antecessor, Francisco de Lemos.
Nesse relatório feito em Maio de 2015 e nas suas próprias palavras, conclui que o modelo operacional da Sonangol fracassou e está falido. Diz ele: deixámos de aprender a saber fazer e aprendemos a contratar e subcontratar. Funções críticas são desempenhadas por terceiros, eventualmente em todas as subsidiárias da empresa. Ou seja, a questão de subcontratar em muitos serviços e valências da empresa era algo que já havia disso detectado pelo doutor Francisco Lemos. Quando chegámos em 2016 tentámos corrigir essas situações, reduzindo o número de subcontratos e os custos dos contratos existentes. E essa foi uma negociação dura porque para algumas empresas foi inesperado a Sonangol, de repente, começar a querer validar os custos e querer saber se os trabalhos tinham sido efectivamente realizados. Ou seja, introduzimos maior rigor. Mas acho que este maior rigor trouxe sobretudo um grande benefício. No final de 2016 poupámos para a empresa quase 1,4 mil milhões de dólares, o que é imenso.

Voltando às denúncias do actual presidente da Sonangol, na referida conferência de imprensa Carlos Saturnino deu a entender que havia uma relação entre si e as empresas que prestavam consultoria à Sonangol. A Matter Business Solutions, a Wise Consulting, ou a Ironsea, ou seja, que teria participações nestas empresas. É verdade?
Acho que as afirmações de Carlos Saturnino foram falaciosas. Tentou criar um jogo na opinião pública para descredibilizar o trabalho que foi feito. O Governo de Angola assinou um contrato com uma empresa coordenadora de vários consultores para realizar o trabalho de reestruturação do sector petrolífero. Isto foi em 2016. A Matter é a entidade coordenadora de consultores, como a PwC, a Boston Consulting, a McKinsey, a VdA, enfim, um número alargado de consultores, porque o trabalho de reestruturar uma empresa com a Sonangol é bastante complexo e em várias áreas. Fizemos trabalho ao nível dos recursos humanos, onde foi preciso avaliar que talento a empresa tinha, se as pessoas certas estavam no lugar certo, se podíamos promover pessoas, aproveitar quadros para melhor fazer funcionar algumas áreas da empresa. Ora, esse trabalho passou pela avaliação e reavaliação de 6.500 pessoas. Fazer esse trabalho e depois planos de carreira e optimizar o talento a favor da empresa é um trabalho complexo. E este trabalho foi feito com o apoio de consultoria externa. Outro trabalho feito com o apoio de consultoria externa foi o SAP [software de gestão]. A Sonangol tinha investido mais de 400 milhões de dólares em SAP mas muitas das transacções ainda eram feitas nas folhas excel, muitas facturas guardadas em gavetas e as ordens ainda processadas manualmente. Uma das coisas que foi necessário fazer foi ter um consultor que nos pusesse o SAP a funcionar em pleno, para que o registo e pagamento das facturas passasse a ser automático para evitar a fraude. Porque havia fraude. E também recorremos à consultoria externa para a área financeira. Toda esta produção complexa de várias consultorias  tinha um coordenador que era a empresa Matter. E graças a essa empresa os custos com os consultores foram, no fundo, reduzidos.

Há alguma relação accionista entre si e a Matter?
Não.

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