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Marcelo deu ‘ok’ ao fim das acções ao portador
A legislação que termina com os títulos ao portador foi viabilizada pelo Presidente da República e deve ser publicada em breve. Todos os títulos terão de ser convertidos no prazo de seis meses, segundo regras ainda a definir.
A promulgação por parte do Presidente da República deu-se a 6 de Abril, apenas três dias depois de ter recebido o decreto da Assembleia da República, e faz-se acompanhar de um breve reparo. Na comunicação que publicou na sua página oficial, Marcelo classifica o propósito do diploma de "positivo", mas aproveita um entre-vírgulas para mencionar que este lhe desperta "dúvidas sobre a incidência na economia portuguesa e sobre os prazos previstos de regulamentação e de conversão". Apesar disso, a promulgação relâmpago é feita, "atendendo a que foi aprovado por unanimidade", com o acordo de todos os partidos eleitos.
O diploma estabelece prazos – as substituições dos títulos têm de estar completadas no prazo máximo de seis meses – mas não diz como é que tudo se operacionaliza, nem as sanções associadas ao seu incumprimento, deixando esses trabalhos para o Governo, que tem quatro meses para emitir regulamentação.
As acções ao portador são há vários anos apontadas como promotoras de actividades fraudulentas e Portugal é já dos poucos países que ainda as permite. A nova directiva do branqueamento de capitais, que já está no Parlamento para transposição vinha atacar o problema, obrigando pelo menos à identificação de todos os beneficiários efectivos das sociedades, como o Negócios já avançou, mas o Parlamento preferiu não esperar e avançar para a sua extinção quase imediata.
Apesar de esta extinção merecer a concordância da generalidade dos reguladores do mercado de capitais, há quem, como a CMVM, considere que seis meses é um prazo muito curto para a sua conversão, uma preocupação de que Marcelo parece partilhar.
Beneficiários efectivos da banca em paralelo com registo central
O mesmo destino teve um outro diploma, aprovado na mesma altura, que obriga os bancos a darem mais detalhe sobre os beneficiários efectivos que estão por detrás dos detentores de participações qualificadas (mais de 10% do capital ou influência significativa). Aqui, Marcelo parece não ter tido dúvidas, sublinhando o "alcance inequivocamente positivo" do diploma e que espera que esse alcance "não possa ser limitado pela definição e concretização dos "beneficiários efectivos".
Como já tivemos oportunidade de explicar, os bancos já estão obrigados a acrescidas medidas de transparência, mas há alguns, sobretudo os de menor dimensão e não cotados, em que o escrutínio público sobre os principais accionistas é mais difícil.
Esta legislação correrá em paralelo com uma outra, que será discutida no âmbito da transposição da directiva sobre branqueamento de capitais, e que prevê a criação de um registo central de beneficiários efectivos (RCBE) por parte de todas as empresas. Esta legislação obrigará a que, no futuro, todas as pessoas colectivas façam uma comunicação sobre quem são as pessoas que detêm o seu controlo, sendo parte dessa base de dados pública.
Contudo, a definição quantitativa de beneficiário efectivo é a da pessoa singular que quem detém directa ou indirectamente 25% de uma entidade, uma percentagem bem maior do que a usada para o mesmo efeito no diploma para a banca, onde são abrangidos os beneficiários efectivos de participações qualificadas (com mais de 10%). Poderão os dois conceitos colidir? Marcelo parece recear que sim.
Diplomas de braço dado com a lavagem de dinheiro
Os dois diplomas promulgados por Marcelo Rebelo de Sousa andam de braço dado com a transposição da quarta directiva do branqueamento de capitais, que já foi aprovada pelo Governo e começará a ser discutida pelos deputados na Assembleia da República. As duas matérias – seja a extinção das acções ao portador, seja a da divulgação dos beneficiários efectivos do sector financeiro – são objecto de enquadramento na transposição da directiva, através do chamado Registo Central do Beneficiário Efectivo, uma mega base de dados que obrigará todas as pessoas colectivas a divulgarem quem são as pessoas singulares que as controlam efectivamente.