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Sigilo bancário ou combate à evasão fiscal? Marcelo decide

Acusado pelo CDS de estar a perseguir os cidadãos que pouparam 50 mil euros, o secretário de Estado do Fisco lembra a "enormíssima compressão da privacidade" que o e-fatura também constitui. E diz que é preciso escolher um lado. A bola está do lado de Marcelo.

Miguel Baltazar/Negócios
Elisabete Miranda elisabetemiranda@negocios.pt 14 de Setembro de 2016 às 20:48

Numa altura em que Marcelo Rebelo de Sousa se prepara para apreciar o diploma que obriga os bancos a comunicarem anualmente ao Fisco o saldo das poupanças dos seus clientes, Fernando Rocha Andrade diz que é preciso escolher o lado em que se está: se do lado das melhores práticas internacionais em matéria de troca de informação, se no grupo cada vez menor de países que resistem ao levantamento do sigilo bancário para efeitos fiscais.

Durante uma deslocação ao Parlamento, o Governo foi acusado pelo CDS de estar a lançar um anátema sobre quem tem reuniu mais de 50 mil euros ao longo da sua vida – argumento semelhante ao invocado por Marques Mendes, que, aliás, tem a certeza de que Marcelo Rebelo de Sousa não deixará passar o diploma. Na resposta, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais acabou por elencar uma bateria de argumentos em defesa da medida.

 

Compressões da privacidade há muitas

Rocha Andrade concede que a medida constituiu uma compressão do direito à privacidade dos cidadãos, mas argumenta que ela é necessária ao fim a que se destina: combater a fraude e evasão fiscal.

A este respeito, lembrou ao CDS o caso do e-fatura, um sistema que avançou com o aval político do anterior Governo, que o secretário de Estado até elogia, e que constitui uma "enormíssima compressão da privacidade" dos cidadãos. Através deste sistema, o Fisco consegue saber quanto consome de água, quantas vezes janta fora ou quantas vezes vai ao médico. E nem por isso houve celeuma – "é um custo que temos de aceitar para combate a evasão".

 

O sigilo bancário já não é o que era

A crise financeira e os sucessivos escândalos fiscais envolvendo grandes bancos e consultores conduziram a uma alteração radical na mentalidade dos líderes políticos mundiais. O sigilo bancário, até aí consentido, passou a ser um alvo a desmantelar. Foi nesse sentido que caminharam os Estados Unidos, que impuseram ao mundo um acordo de troca de informações, e a OCDE e a União Europeia, através dos chamados Common Reporting Standards (CRS). O pressuposto destes instrumentos é o de que a "troca automática de informações financeiras é um pilar fundamental de qualquer estratégia de combate à fraude e evasão", lembra Rocha Andrade, que "não pensava estar a dizer algo que fosse polémico".

Os acordos assinados pelo Estado não impõem que os bancos também transmitam a informação sobre os residentes, mas aquilo que é um bom instrumento para combater a fraude e evasão internacional, também o é à escala nacional, considera.

A este respeito, Rocha Andrade nota a contradição que é defender-se que o reporte de dados sobre residentes é uma intolerável violação da sua privacidade, mas que o reporte de dados sobre não residentes (que é imposto pelos acordos internacionais) já não é: "Claro que podemos assentar o nosso raciocínio na lógica de que há cidadãos de primeira e de segunda", mas os direitos são iguais, sustentou.

Os ricos que não pagam impostos

O secretário de Estado lembrou ainda a discussão recente que o Parlamento convocou perante as afirmações do antigo director-geral dos impostos de que os ricos não pagam os impostos que deviam. Este controlo dos saldos é uma medida que pretende, precisamente, garantir que quem tem mais património o está a declarar.

"O problema não é o que pagam os que sabemos que são ricos, é o que não pagam aqueles que sabemos que são ricos", sustenta o secretário de Estado, para quem o limite de 50 mil euros é um indicador de que não se pretende um acesso indiscriminado aos saldos.

Rocha Andrade aduz ainda a seu favor o facto de este limite ser muito mais restritivo do que o negociado pelo anterior Governo para as comunicações internacionais.

Tratando-se de não residentes com contas em instituições financeiras nacionais (emigrantes ou estrangeiros), os bancos são obrigados a comunicar todas as contas com saldos acima de 1.000 euros (se abertas até ao final de 2015) ou sem qualquer limite mínimo (para contas posteriores).

Em suma, para o Governo, "entre os dois interesses em conflito, é preciso saber de que lado caímos – se para o lado dos consensos da OCDE, da UE, dos EUA, se caímos para o lado onde já somos acompanhados por muito poucos". A bola está do lado de Marcelo Rebelo de Sousa. 

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